"Continuarei buscando a paz até o último minuto do meu mandato", disse o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, no último domingo, quando os eleitores rejeitaram nas urnas o histórico acordo firmado com as Farc poucos dias antes numa emotiva cerimônia em que ele trocou um aperto de mãos com o líder rebelde, Rodrigo Londoño Echeverri, o Timochenko.
O acordo de paz tinha como objetivo pôr fim a um conflito que deixou cerca de 260 mil pessoas mortas e deslocou milhões no país sul-americano nas últimas cinco décadas. Mas que, para os críticos e 50,2% dos colombianos que foram às urnas, fazia concessões demais aos guerrilheiros.
Os esforços de Santos, porém, lhe renderam o Prêmio Nobel da Paz de 2016.
E o curioso disso tudo é que o presidente nem sempre foi conhecido pelo tom otimista e conciliatório que o levaram até a honraria.
Guerra e paz
Há menos de uma década, quando ocupava o cargo de ministro da Defesa, Santos autorizou o controverso bombardeio a um reduto das Farc no Equador. Sem avisar ao país vizinho.
E, ironicamente, a ascensão dele ao poder está ligada à sua associação com o predecessor, Alvaro Uribe, que comandou a campanha vitoriosa de rejeição ao acordo com a guerrilha no referendo.
Santos foi nomeado para a pasta da Defesa em 2006 por Uribe, que tinha acabado de ser reeleito com uma plataforma de tolerância zero com as Farc - um posto estratégico, dado o histórico de décadas de guerra no país.
Sob seu comando, a Colômbia realizou uma série de operações militares contra o grupo.
A mais famosa delas foi o a invasão do cativeiro da ex-senadora e candidata a presidente Ingrid Betancourt, em julho de 2008, após ela ficar seis anos em poder da guerrilha - três cidadãos americanos também foram libertados.
Quatro meses antes, o ataque às Farc no Equador havia resultado na morte do então líder do grupo, Raul Reyes.
Guinada
O bombardeio, porém, teve como efeito colateral uma crise diplomática: o governo equatoriano acusou Bogotá formalmente de violar sua soberania.
A administração de Uribe enfrentou ainda um escândalo: as denúncias de que forças militares estariam executando civis e os contabilizando como guerrilheiros como forma de "engrossar" as estatísticas do combate às Farc.
Mas se causou danos à popularidade do então presidente, essas crises não afetaram Santos, que em 2009 desligou-se do ministério para concorrer ao cargo máximo.
Acabou eleito em março do ano seguinte, recebendo uma das maiores votações da história colombiana. E com uma plataforma que tinha muito em comum com a que elegera Uribe, em especial quando o assunto era a área de segurança.
Mas Santos promoveu uma guinada logo nos primeiros meses do mandato.
Começou normalizando as relações diplomáticas com o regime de Hugo Chávez na Venezuela, acusado por Uribe de compactuar com as Farc. O então novo presidente também levou à Justiça integrantes do governo de seu antecessor, alvos de denúncias de abusos de poder.
E em 2012 Santos confirmou os rumores de que seu governo estava realizando negociações secretas de paz com as Farc em Cuba, com a intermediação de Raúl Castro.
O anúncio foi o suficiente para pôr uma pá de cal nas relações com Uribe, que se transformou no principal líder de oposição ao governo.
Ao ponto dele apoiar o rival de Santos nas eleições de 2014 - o presidente acabou reeleito no segundo turno, com 50,95% dos votos, fiando-se justamente no acordo com o grupo paramilitar.
Tal acordo foi assinado em setembro deste ano, com a promessa de uma consulta popular que, no fim, terminou por rejeitá-lo.
Um resultado que, pelo menos até o anúncio do Nobel, era visto com uma vitória indiscutível de Uribe.