Coreia do Sul: o passado autoritário da potência asiática

Presidente do país decretou lei marcial, mas voltou atrás após decisão ter sido derrubada pelo Parlamento

3 dez 2024 - 16h45
(atualizado às 21h17)
População protesta na frente do Parlamento na Coreia do Sul
População protesta na frente do Parlamento na Coreia do Sul
Foto: Reuters / BBC News Brasil

A tensão recente na política sul-coreana atingiu seu auge quando, nesta terça-feira (horário de Brasília), o presidente Yoon Suk Yeol decretou lei marcial no país.

A declaração de um estado de exceção chamou a atenção do mundo por se tratar de um país considerado estável e desenvolvido.

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Yoon voltou atrás na decisão e revogou a lei marcial, mas durante algumas horas o país se viu à sombra de, novamente, mergulhar em um regime autoritário.

Para muitos, a Coreia do Sul é vista como um exemplo de nação que conseguiu superar a pobreza e se desenvolver - mas o país foi uma ditadura por bastante tempo.

Foram cerca de 35 anos de regime autoritário desde a sangrenta guerra que provocou a separação do território que hoje é a Coreia do Norte.

Nesse tempo os sul-coreanos mantiveram uma grande parceria militar com Estados Unidos, que também envolveu ajuda para recuperar a economia no pós-guerra.

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A partir dos anos 1980, movimentos estudantis intensificaram a pressão e tiveram grande influência na queda do governo autoritário.

Já como uma democracia, na década seguinte a Coreia do Sul se tornou um dos maiores exportadores de carros, celulares e outros aparelhos eletrônicos do mundo, além de ganhar destaque na indústria da música e do cinema.

O relacionamento com a Coreia do Norte continua um grande foco de tensão, com a população sul-coreana convivendo com a ameaça de ataques com mísseis ou armas nucleares e episódios de instabilidade política que, como vimos, ainda são frequentes no país.

A BBC listou alguns fatos históricos que ajudam a explicar os conflitos existentes no país asiático e como a Coreia do Sul é vista mundialmente.

Histórico e autoritarismo

Park Chung Hee foi ditador na Coreia do Sul até seu assassinato, em 1979
Foto: EPA / BBC News Brasil

A Península Coreana foi ocupada pelo Japão entre 1910 e 1945, período em que forças japonesas foram acusadas de cometer atrocidades contra a população local.

O encerramento da Segunda Guerra Mundial, no Pacífico, ocorreu após o lançamento de duas bombas atômicas pelos Estados Unidos sobre cidades japonesas. Isso levou à redenção do Japão e ao fim da ocupação nipônica da península.

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A península, entretanto, acabou dividida, devido à presença de tropas soviéticas no norte e dos Estados Unidos no sul.

A república do sul foi proclamada em 1948 e recebeu apoio militar dos Estados Unidos e da ONU quando foi invadida pela Coreia do Norte, dois anos mais tarde.

A Guerra da Coreia terminou em 1953, sem um acordo formal de paz, deixando a Coreia tecnicamente em guerra por mais de 50 anos.

A Coreia do Sul, capitalista, desenvolveu-se até se tornar um dos países mais afluentes da Ásia. A metade norte, comunista, seguiu um caminho oposto, marcado pelo totalitarismo e pela pobreza.

Por muito tempo, no entanto, a parte sul não desfrutou de liberdade política e democracia.

As quatro décadas seguintes à divisão da península foram marcadas por um regime autoritário, durante o qual esquemas patrocinados pelo governo incentivaram o crescimento de conglomerados industriais familiares, incluindo os grupos Hyundai e Samsung.

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O presidente Park Chung-Hee assumiu o poder em um golpe militar em 1961. Durante seu mandato de 18 anos, comandou um grande programa de desenvolvimento industrial, que alçou a economia sul-coreana a seu patamar atual.

Ele foi também uma figura controversa e autoritária, que implementou a lei marcial no país e mudou a Constituição para aumentar seus próprios poderes.

Park usou seu poder para forçar coreanos ricos que ele considerava corruptos a investir na indústria do próprio país, criar um setor de construção naval etc.

A ditadura de Park acabou com seu assassinato, em 1979.

Pela lei da época, Park foi sucedido imediatamente pelo general Choi Kyu-hah, então primeiro-ministro. Mas seu governo durou pouco.

Em um novo golpe de Estado, o general Chun Doo-hwan tomou o controle do país, estabeleceu uma nova junta de governo e conduziu a Coreia do Sul até 1987, quando o país realizaou as primeiras eleições presidenciais diretas.

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População foi às ruas contra decreto de lei marcial
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Quem é o presidente Yoon Suk-yeol

Filho de refugiados vindos da Coreia do Norte, Yoon assumiu numa época em que as tensões entre os dois vizinhos estavam altas
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

O presidente Yoon Suk-yeol assumiu o cargo em maio de 2022, após vencer as eleições. Ele sucedeu a Moon Jae-in que governava o país desde 2017. Suk-yeol se filiou ao Partido do Povo no Poder em 2021 depois de ter ocupado o cargo de Procurador Geral do país por quase 2 anos.

A candidatura do conservador Suk-yeol se impôs após o escândalo envolvendo o famoso político Cho Kuk e sua filha, a estudante de medicina Cho Min.

Pai e filha foram acusados de falsificar documentos acadêmicos incluindo estudos científicos que segundo alegavam teriam sido revisados por cientistas sul-coreanos. Cho Kuk ocupou por dois anos (2017-2019) o cargo de ministro da Casa Civil durante o mandato do então presidente Moon Jae-in.

Moon Jae-in substituiu a primeira presidente mulher do país, Park Geun-hye, que sofreu impeachment devido a seu envolvimento num escândalo de corrupção.

Moon, um advogado de direitos humanos que propôs uma postura mais leve em relação à Coreia do Norte, disse que trabalharia pela paz na península. Ele afirmou que estaria disposto a visitar Pyongyang, a capital norte-coreana, caso as condições fossem propícias.

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Filho de refugiados vindos da Coreia do Norte, Moon assumiu numa época em que as tensões entre os dois vizinhos estavam altas, com os Estados Unidos e o regime norte-coreano trocando ataques verbais, em meio a grande especulação sobre um novo teste nuclear de Pyongyang.

O clima internacional mudou dramaticamente depois que negociações com a Coreia do Norte levaram a nação comunista a participar dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2018, realizados no sul, em PyeongChang.

Numa cúpula em abril de 2018, o presidente Moon e o líder norte-coreano, Kim Jon-um, concordaram em encerrar as ações hostis e trabalhar na direção da redução da corrida nuclear na península.

Comparado ao presidente americano Donald Trump, Yoon Suk-yeol prometeu durante a campanha acabar com o Ministério da Família e Igualdade e Gênero.

Parlamentares derrubaram decreto de lei marcial após anúncio do presidente
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Mídia

A Coreia do Sul é pioneira em internet de alta velocidade e sem fio. Mais de 45 milhões de sul-coreanos estão presentes online, praticamente toda residência é conectada à internet. O uso de aplicativos de mensagens instantâneas e de jogos são extremamente populares.

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A leitura de jornais é alta, e há mais de cem diários nacionais e locais no país. A imprensa é frequentemente crítica do governo. Muitos jornais são controlados por conglomerados.

As novelas de TV sul-coreanas são populares em toda a região, incluindo na China. Elas são parte da Onda Coreana — a exportação de cultura popular sul-coreana pela Ásia.

Relações com o Brasil

As relações entre Brasil e Coreia do Sul nasceram no período após a Segunda Guerra Mundial, tanto nos contatos formais entre governos como na chegada de imigrantes coreanos ao Brasil.

As relações diplomáticas foram estabelecidas em 1959, e os sul-coreanos abriram sua embaixada no Rio de Janeiro em 1962. A embaixada brasileira em Seul foi inaugurada três anos depois.

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A imigração de sul-coreanos ao Brasil foi iniciada oficialmente em 1963, apesar de haver registros de chegada de coreanos na década anterior. Também em 1963 foi assinado um acordo comercial.

A década de 2010 viu um aumento nos investimentos sul-coreanos no Brasil e no comércio entre os dois países - segundo o Itamaraty, o fluxo alcançou US$ 8,8 bilhões em 2018.

A comunidade sul-coreana no Brasil é estimada em cerca de 50 mil pessoas, concentradas majoritariamente na cidade de São Paulo.

Linha do tempo da Coreia do Sul

A BBC listou algumas datas relevantes que ajudam a explicar os conflitos na Coreia do Sul:

1910-45 - Ocupação da Península Coreana pelo Japão.

1945 - Depois da Segunda Guerra Mundial, a ocupação japonesa termina com tropas soviéticas ocupando a área ao norte do paralelo 38, enquanto forças dos Estados Unidos ocupam o sul.

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1948 - A República da Coreia (conhecida como Coreia do Sul) é proclamada.

1950 - O sul declara-se independente, provocando a invasão pela Coreia do Norte.

1953 - Armistício encerra a Guerra da Coreia, que custou 2 milhões de vidas.

Anos 1950 - O sul é mantido com crucial apoio militar, econômico e político dos Estados Unidos.

Anos 1960 - Grande programa de desenvolvimento industrial.

1988 - Primeiras eleições parlamentares livres.

2002 - Batalha entre navios da Coreia do Sul e da Coreia do Norte, ao longo de uma fronteira naval sob disputa, numa época de contínua tensão entre entre os dois países.

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2018 - Num encontro em abril de 2018, o presidente Moon Jae-in e o líder norte-coreano, Kim Jong-un, concordam em terminar as hostilidades e trabalhar pela redução das armas nucleares na península.

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