Ao redor do mundo, o número de homens excede em 62 milhões o de mulheres, já que nascem mais bebês do sexo masculino do que do feminino, segundo as Nações Unidas.
Mas quando se trata de inserção no mercado de trabalho, há pelo menos 3,3 bilhões de mulheres à sombra dos homens. Seus direitos continuam sendo suprimidos ou negligenciados em diversas regiões do globo.
Não há dúvida de que houve progresso nas últimas décadas, em parte pela luta incansável das ativistas. Leis específicas foram criadas para proteger as mulheres. Elas ganharam maior acesso à educação. E o índice de mortalidade ao dar à luz caiu.
No entanto, alguns dos problemas que têm perseguido as mulheres por séculos permanecem.
Como atingir a igualdade de gêneros? Em quais áreas?
No Dia Internacional das Mulheres, a BBC enumerou junto a especialistas uma lista de alguns dos direitos das mulheres que estão sob risco – e as estatísticas surpreendentes por trás deles.
Política
O mundo da política continua sendo predominantemente masculino.
Em 2015, a União Interparlamentar (UIP), ligada à ONU, revelou que apenas 17% de todos os ministérios em todo o mundo são chefiados por mulheres. E elas são apenas 22% de todos os parlamentares.
O cenário também é desalentador quando se analisam as posições de liderança: 11 mulheres atuam como chefes de Estado e 13 como chefes de Governo, segundo um último levantamento da ONU Mulheres, em agosto do ano passado.
"Nesse estágio do desenvolvimento humano, não há justificativa para tamanha desigualdade. Infelizmente, contudo, a vontade política para mudar isso é inexistente na maior parte dos casos", afirmou Anders B. Johnsson, especialista em direito internacional e ex-secretário-geral da UIP.
De certa forma, os dados melhoraram. Os números mais que dobraram ao longo da última década, especialmente em países que implementaram cotas para aumentar a participação política das mulheres: em 2015, 41 Parlamentos unicamerais ou câmeras de deputados são compostas por mais de 30% de mulheres - entre elas 11 na África e nove na América Latina.
Até mesmo o mais básico dos direitos políticos para as mulheres, o voto, ainda enfrenta empecilhos: na Arábia Saudita, por exemplo, as mulheres votaram pela primeira vez na história apenas nas eleições municipais de dezembro passado.
O desafio do mercado de trabalho
Outro debate acalorado está relacionado ao mercado de trabalho: o quanto as mulheres conseguem entrar e como são pagas uma vez que conquistam as vagas.
O relatório mais recente lançado pela ONU sobre o assunto, "The World's Women 2015" ("O Mundo das Mulheres 2015, em tradução literal), aponta que, como grupo, as mulheres trabalham tanto quanto os homens, senão mais.
"Quando se leva em conta o trabalho pago e não pago, como as tarefas domésticas e o cuidado com as crianças, as mulheres trabalham mais horas que os homens - uma média de 30 minutos a mais por dia em países desenvolvidos e 50 minutos naqueles em desenvolvimento", apesar que as horas gastas em trabalhos domésticos diminuiu com o passar do tempo.
Isso não se reflete no salário que recebem - pelo contrário, se olharmos a diferença entre os valores.
É fato conhecido que, em média, as mulheres recebem menos que os homens pelos mesmos trabalhos. E equilibrar isso teria um impacto de U$ 28 trilhões (R$ 105 trilhões) no PIB global até 2025.
Esse cálculo foi feito pela consultoria McKinsey Global Institute, liderada pelo cientista político Jonathan Woetzel.
"A desigualdade de gêneros não é somente uma pressão moral e social, mas também um desafio econômico crítico. Se as mulheres não alcançarem todo o potencial econômico delas, a economia global vai sofrer", disse ele.
Especialistas apontam que tão preocupante quanto a diferença salarial é o desequilíbrio na participação na força de trabalho, que permanece grande especialmente no norte da África, no oeste e sul da Ásia. Dados da Organização Internacional do Trabalho mostram que somente 47% das mulheres em idade ativa estão no mercado, contra 72% dos homens.
Um estudo recente feito pelo Banco Mundial em 173 países mostra que em 155 deles há pelo menos uma diferença legal que restringe as oportunidades econômicas às mulheres.
Como resultado, elas são mais suscetíveis ao mercado informal de trabalho do que os homens. De acordo com a agência da ONU para Mulheres, em 2015, mais de 80% das mulheres em trabalhos não-agrícolas no sul da Ásia estavam na informalidade; na África Subsaariana, são 74% e na América Latina e no Caribe, 54%.
Sozinha e segura
Em alguns países, os níveis de violência de gênero devem ser tratados com urgência - e não somente nos mais pobres ou naqueles com conflitos.
O "índice de insegurança", criado por pesquisadores americanos para posicionar países de acordo com o nível de segurança percebido para as mulheres, revela que a ameaça ao bem-estar físico e psicológico em nível global é de 3.04 (em um ranking em que quatro é o pior e zero, o melhor nível de segurança).
"O mundo todo flutua ao redor do nível 3, então o cenário geral não é bom. Vemos a insegurança física das mulheres como um dos dilemas de segurança global", afirma Valerie Hudson, autora deSex and World Peace (Sexo e Paz Mundial, em tradução livre).
Hudson lidera o time que está por trás do "índice de insegurança" e é membro fundadora do WomanStats Project, a base de dados mais ampla sobre direitos da mulher.
"A forma da violência pode mudar de país para país. Taxas de homicídio na América Latina são excepcionalmente altas. A violência doméstica é absolutamente penetrante na África Subsaariana, enquanto Índia, China, Vietnã e outros têm riscos muito altos de seleção de gênero por aborto", disse Hudson.
'Sim' consentido
Observadores também pressionam para uma mudança na legislação que vai diminuir o número de casamentos de menores de idade ao redor do mundo.
"Se me perguntassem que mudanças específicas eu faria para melhorar a situação da mulher, eu diria (banir) casamentos infantis. Meninas com oito anos se casam. Essa prática condena não só as meninas, mas também seus filhos a um vida de pobreza, desnutrição e níveis mais baixos de educação", diz Hudson.
A Unicef estima que mais de 700 milhões de mulheres que estão vivas hoje se casaram antes de fazer 18 anos e, dessas, 250 milhões o fizeram aos 15 anos.
A ONU chamou casamentos de menores – às vezes arranjados pelas famílias, frequentemente sem consentimento – de "violação fundamental dos direitos humanos" que expõe meninas ao "risco de violência doméstica e isolação social".
Apesar de os números terem declinado fortemente desde os anos 1970, ainda quase a metade das mulheres de 20 a 24 anos no sul da Ásia e 20% na África Subsaariana se casaram antes dos 18 anos, de acordo com o documento "The World's Women 2015".
As descobertas sugerem que o casamento adolescente, com permissão dos pais facilmente concedida quando necessária, é ainda uma prática generalizada.
O mesmo pode ser dito da poligamia, uma prática social que muitos acreditam atrasar o desenvolvimento da mulher.
De acordo com a última pesquisa da ONU, a poligamia ainda era predominante em 2009: legal ou geralmente aceita em 33 países (25 deles na África); aceita em parte pela população ou legal para algum grupo em 31 países, 18 dos quais na África e 21 na Ásia.
Nos olhos da lei
Há outras restrições legais sendo combatidas: do impedimento a que mulheres dirijam, na Arábia Saudita, a restrições ao livre movimento a mulheres que não estejam acompanhadas de seu marido ou pai.
O problema oculto, dizem especialistas, é o acesso desigual às leis familiares, que dão tratamentos diferentes para mulheres e homens não apenas em relação ao casamento, mas em vários aspectos da vida cotidiana.
A transmissão de bens de geração a geração é também uma das áreas em que as mulheres têm menos direitos.
A Mauritânia é o país em que leis de herança parecem ser mais desiguais, de acordo com análises do Banco Mundial. Mas outros países, como Lesoto, também impedem as mulheres de ter posse de bens - elas são obrigadas a assinar a propriedade em conjunto com homens.
O fato de elas não serem consideradas beneficiárias ou proprietárias de terra no mesmo patamar que os homens, dizem especialistas, tira das mulheres a possibilidade de independência financeira.
Diferença de gênero
Então, quão ruim é o quadro geral? Uma das formas de medir o estado atual das coisas, dizem especialistas, é o índice de disparidade entre sexos que o Fórum Econômico Mundial vem atualizando pelos últimos dez anos.
Apesar de essa medida não contemplar todos os aspectos da desigualdade de gênero, tem sido usada como uma forma de chamar atenção ao problema.
O Banco Mundial calculou o quanto a disparidade diminuiu desde 2006 (quando começou a coletar informações), e a resposta é: não muito.
Mesmo nas regiões que apresentam melhora nos índices, como a América do Norte e a Europa, a distância diminuiu apenas alguns pontos percentuais.
Olhando por países, o top 5 é dominado por nações nórdicas, com a Islândia em primeiro lugar, seguida por Finlândia, Noruega, Suécia e Dinamarca.
No lado oposto do ranking estão Mali, Síria, Paquistão e Iêmen, países com as maiores porcentagens de desigualdade entre homens e mulheres.
Além disso, seis países viram a disparidade entre sexos aumentar desde 2006, indo contra a tendência geral: Sri Lanka, Mali, Croácia, Macedônia e Tunísia.
"É uma via de mão dupla: o que acontece com as mulheres afeta a nação como um todo. E há muito o que fazer para ajudar as mulheres e tornar os países um lugar melhor para viver", diz Valerie Hudson.