Documentário sobre assassino de Yitzhak Rabin gera polêmica em Israel

23 jun 2015 - 19h20

A exibição de um documentário sobre o homem que matou o primeiro-ministro de Israel Yitzhak Rabin, figura lendária da política israelense e considerado um importante mediador da paz com os palestinos, vem gerando um polêmico debate sobre liberdade de expressão no país.

Filme retrata a vida dentro da prisão de Yigal Amir, condenado à prisão perpétua pelo assassinato do premiê, em 1995.
Filme retrata a vida dentro da prisão de Yigal Amir, condenado à prisão perpétua pelo assassinato do premiê, em 1995.
Foto: (AP)

('Além do Medo', em tradução livre) retrata a vida dentro da prisão de Yigal Amir, condenado à prisão perpétua pelo assassinato do premiê, em 1995.

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É a última obra em vida do prestigiado documentarista Herz Frank, judeu nascido na Letônia e que morreu durante as filmagens.

No entanto, o documentário, cuja exibição estava prevista para acontecer durante o Festival de Cinema de Jerusalém, virou alvo de pesadas críticas de parte da sociedade israelense.

Na opinião dos críticos, o filme 'humaniza' o assassino de Rabin.

O documentário inclui entrevistas com a mulher de Amir, Larisa Trimbovler, que se casou com ele na prisão, e registros dele lendo histórias de ninar para seu filho pequeno pelo telefone.

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As críticas também partiram do meio político. O ex-presidente Shimon Peres, colega e amigo de Rabin, descreveu a obra como uma "tentativa de legitimar um criminoso hediondo". Já a ministra de Esportes e Cultura do país, Miri Regev, pediu a abertura de uma investigação sobre o documentário.

A neta de Rabin, Noa Rothman, acusou os realizadores de "um uso cínico da liberdade de expressão com a intenção de prejudicá-la".

Polêmica

Inicialmente, a comissão de seleção do festival defendeu a decisão de exibir o documentário ao público, mas voltou atrás após pressões políticas, segundo a imprensa israelense.

De acordo com o site de notícias , Regev teria ameaçado suspender o financiamento público ao festival se o filme não fosse retirado da programação do evento.

Em nota pública, a direção do evento e o Ministério de Esportes e Cultura israelense informaram que o documentário será retirado da programação oficial do festival e exibido em um cinema privado.

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Apesar disso, o filme também será avaliado pelos jurados e continuará concorrendo ao prêmio de Melhor Documentário israelense.

"É inconcebível que um festival apoiado pelo Estado exiba um filme sobre um assassino vil de um primeiro-ministro", afirmou Regev, por meio de um comunicado.

"As balas do revólver de Amir esmagaram um símbolo do Estado, da democracia e da liberdade de expressão. Esses são valores sagrados que foram violados por um assassino desprezível", acrescentou.

Regev pediu ainda que o público não veja o documentário.

"Peço ao povo de Israel que fique longe desse filme".

No entanto, a diretora do festival, Noa Regev, reagiu, acusando os críticos do documentário de não se importarem em descobrir sobre do que se trata o filme.

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"Aqueles que se opuseram à exibição do documentário condenaram o trabalho sem mesmo tê-lo visto", afirmou ela.

"Fazemos objeção a que uma obra de arte seja condenada puramente com base no assunto que pretende retratar. Muitas obras de arte cinematográficas envolvem assuntos sensíveis."

"Contrariamente ao que foi informado pela imprensa, o filme não apoia o assassinato de Rabin. Ele mostra que esse homem matou por ideologia e não loucura, e nesse sentido ecoa as ideias de Hannah Arendt (influente filósofa alemã de origem judia responsável por cunhar o termo 'banalidade do mal' ao analisar o julgamento do nazista Adolf Eichmann em 1961. Muito criticada à época, Arendt defendia a ideia de que Eichmann era um burocrata nazista que se limitara a cumprir ordens sem avaliá-las acerca do bem e do mal)".

A diretora do festival também negou que a iniciativa de retirar o filme da programação oficial se deveu a "ameaças" da ministra da Cultura, acrescentando que "a decisão de mudar a data de exibição foi tomada por respeito aos sentimentos do público".

Yitzhak Rabin

Primeiro-ministro de Israel por duas vezes, entre 1974 a 1977 e entre 1992 a 1995, ano em que foi assassinado, Yitzhak Rabin é uma das figuras políticas mais cultuadas no país e internacionalmente, especialmente pelas negociações de paz com os palestinos, como os Acordos de Oslo.

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Em outubro de 1994, ele assinou um acordo de paz com a vizinha Jordânia. No mesmo ano, recebeu o Nobel da Paz juntamente com o então presidente de Israel, Shimon Peres, e com o líder da recém-criada Autoridade Nacional Palestina (ANP), Yasser Arafat.

No dia 4 de novembro de 1995, Rabin foi assassinado pelo estudante judeu ortodoxo Yigal Amir, militante de extrema-direita que se opunha às negociações com os palestinos, quando participava num comício pela paz na Praça dos Reis (hoje Praça Yitzhak Rabin) em Tel Aviv.

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