Dono de uma loja de artigos militares, o imigrante peruano Diogo Lascano mantém esse negócio há três anos em uma feira livre em Pineville, na Carolina do Sul, nos Estados Unidos. Esse tempo foi o suficiente para perceber uma mudança drástica no comportamento de seus clientes. “Todo mundo vem aqui pechinchar, é normal. Mas ultimamente tentam negociar tudo, pagar o preço que eles querem, e não entendem que para eu conseguir essa mercadoria, também tenho que pagar um preço. E eu tenho que ter lucro, não importa o quê. Se não, não é um negócio”, desabafa em conversa com o Terra.
A situação de Diogo e seus clientes é um retrato da economia americana, principalmente da inflação, que caiu em outubro após dois meses de alta, mas ainda assim segue em 3,2% no ano pelo Índice de Preços ao Consumidor (CPI, em inglês), segundo a Secretaria de Estatísticas Trabalhistas dos Estados Unidos.
“Acho que a economia vem piorando pouco a pouco. As pessoas esperam pagar o que costumavam pagar há dois, três anos atrás, mas não é assim”, seguiu o comerciante. “Os clientes estão reclamando muito dos preços, mas eu apenas aumentei uns cinco dólares do que eu paguei em cima de cada item que eu vendo aqui. Então, a minha margem de lucro é de 15% a 20%. Só que eu estou vendendo menos, eu diria que uns 45% menos, é um impacto grande para mim”.
Diogo conta que até a circulação na feira mudou. Antes mais pessoas andavam por lá e gastavam mais. “Agora estão com medo de gastar seu dinheiro. É isso que eu sinto”. O comerciante estima que os preços chegaram a aumentar 25% comparando com dois anos atrás. E isso também a impacta a vida pessoal e da família desses lojistas.
“Eu não tenho só esse negócio, tenho outros, embora essa seja a minha principal fonte. Eu sei que estou enfrentando dificuldades, mas eu vejo pessoas que estão próximas a mim e elas estão em uma situação bem pior, porque os preços nas lojas aumentam, mas os salários não. Então, eles recebem a mesma quantidade de dinheiro e estão gastando mais. E, às vezes, se as pessoas trabalham para alguém, é difícil dizer: ‘Ei, eu preciso aumentar meu salário’ porque o patrão também está pagando mais caro pelas coisas”.
O comerciante que deixou o Peru para tentar uma vida melhor nos Estados Unidos acredita que o governo do democrata Joe Biden foi uma “bagunça” para a economia americana, e acredita que tudo vai melhorar agora que o republicano Donald Trump foi eleito nas eleições do dia 5. “Minhas esperanças são pelo Sr. Trump. Eu o conheço pessoalmente e votei nele e tenho toda a minha fé nele. Definitivamente ele vai fazer algo pela economia. Se você se lembrar do primeiro governo dele, nós pagávamos 1,75 dólares por galão de diesel. Agora estou pagando 3,50 dólares, então você vê, é uma diferença de 2 dólares”, explica. “Muitas pessoas votam nele por causa da economia, até democratas fizeram isso. Trump é um empresário, sabe mexer com dinheiro, e vai dar uma virada por aqui”.
Em uma loja próxima, o americano Donald também acredita que as coisas podem melhorar. Em meio às ferramentas que vende, ele conversou com o Terra sobre sua percepção dos preços, que “podem ser um pouco exagerados” em sua visão. “Eu diria que toda semana os preços geralmente sobem. No momento acho que está uns 10% mais caro tudo”, conta.
Assim como Diogo, Donald também percebe uma mudança nos seus clientes. “Eles entram [na loja], olham, encontram a ferramenta que querem, mas quando sabem do preço, mudam de ideia e vão pesquisar na internet e acham mais barato”, lamenta. “Estou esperando que os preços baixem porque isso vai trazer meus clientes de volta, assim eles não precisam ficar comprando online porque, aqui na loja física, eles podem pegar, tocar nas ferramentas, e não só comprar vendo as fotos em sites”.
O americano reclama que, além dos valores em seu negócio, o preço da comida subiu muito. “Leite, ovos... o que você costumava comprar por cem dólares, agora você paga duzentos, trezentos. Eu fui às compras outro dia e gastei quase trezentos dólares. Normalmente eu gastaria talvez 120 ou talvez 150, é mais do que o dobro”.
Por causa disso, o mercado hoje em dia é só o essencial. Um ‘agradinho’, como um doce, por exemplo, fica fora do carrinho. “Se você quer uma barra de doce, antes você pagava 97 centavos de dólar, agora é tipo três dólares, então você não leva”, diz.
Já a mexicana Maria, que mantém há 10 anos uma loja de joias, relata ser afetada pelo momento econômico dos Estados Unidos mesmo trabalhando com um produto que tem uma volatilidade própria. “Este ano, meu produto está mais caro de qualquer forma. Uma onça de prata, que era 14 dólares, agora está 40 dólares. Mas prata e ouro são um mercado de comércio mundial, é diferente da economia local, sabe? O preço da prata e do ouro subiu em todo o mundo. Não é só aqui. Então essa é a diferença no meu produto, no meu negócio. Mas, meu lucro agora é menor do que costumava ser. Porque eu tento não manter os preços muito altos, pois este é um mercado livre, as pessoas não querem gastar muito. Se eu estivesse em um shopping, por exemplo, ai é possível gerenciar preços mais altos”, detalha.
O produto de Maria vende pode até ter o seu mercado específico, mas as necessidades de sua casa e de sua família fazem parte da economia local – e não há como fugir disso. “Quando você faz as compras para a sua casa, está mais caro. É difícil comprar tudo que você costumava comprar. Antes, com 50 dólares, talvez você conseguisse comprar tudo, coisas boas, e suficiente talvez para três, quatro dias. Mas agora, você não consegue fazer isso. Você faz um mercado para a semana, e gasta uns 200 a 300 dólares. Para uma família pequena, eu digo”.
Maria também atribui ao governo Biden essa dificuldade financeira. “Eu não sou fã nem do Biden e nem do Trump, mas no governo Trump você tinha um aumento de uns 7% no preço das coisas, agora com o Biden, é uns 20% mais caro”, afirma. “Temos alguma esperança de que as coisas melhorem um pouco. O Trump é uma pessoa difícil, mas ele tenta fazer as coisas. Ele foi bem na economia quando foi presidente, então por isso que ele ganhou novamente; ele gerenciou a economia e também a imigração. Para mim isso é ruim, claro, porque eu sou do México. Vejo tantas pessoas honestas e trabalhadoras aqui, mas que são ilegais. Só que este país é grande porque o nosso povo faz este país grande. Porque eles estão construindo tudo. Eles estão construindo estradas. Eles constroem este país. Essa é a verdade. Não acho que ele fará algo contra nós porque, se ele quer que a economia melhore, precisa da gente. [Nos tirar daqui] destruiria a economia, ao invés de salvá-la, e acho que ninguém quer isso, certo?”