Escândalo de espionagem dos EUA domina cúpula europeia

24 out 2013 - 19h46
(atualizado às 19h50)

A cúpula dos líderes da União Europeia começou nesta quinta-feira à tarde, em Bruxelas, em um contexto de tensão com as revelações da rede de espionagem dos Estados Unidos que abalaram a confiança de seus parceiros europeus.

A chanceler alemã, Angela Merkel, que teve o celular grampeado pela Agência Nacional de Segurança americana (NSA, na sigla em inglês), afirmou, ao chegar à cúpula de chefes de Estado e governo, que amigos não se espionam. "Não se trata de mim, trata-se de todos os cidadãos. Precisamos de confiança entre os parceiros, e essa confiança precisa ser reconstruída", ressaltou.

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Em um breve encontro bilateral logo antes do início da cúpula, Merkel e o presidente francês, François Hollande, reafirmaram "o caráter inaceitável" das escutas americanas - revelou uma fonte da delegação francesa. Ambos os presidentes concordaram em manter consultas regulares franco-alemãs sobre o tema, já que acreditam estar na "linha de frente".

Prevista inicialmente para ser uma cúpula de rotina - dedicada, sobretudo, à economia digital -, a reunião de chefes de Estado e de Governo foi dominada pelo crescente escândalo de espionagem do governo americano que teve como alvo seus aliados na Europa.

Denúncias na França e na Itália

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Na segunda-feira, o jornal Le Monde revelou detalhes da espionagem telefônica de cidadãos franceses por parte da NSA, com base nos documentos confidenciais vazados pelo ex-consultor de inteligência americano Edward Snowden. Na terça, o periódico divulgou novas informações sobre as escutas em embaixadas, incluindo a representação da França na sede da ONU, em Nova York. De acordo com o Monde, a NSA fez 70,3 milhões de gravações de dados telefônicos de franceses entre 10 de dezembro de 2012 e 8 de janeiro de 2013.

A questão é particularmente sensível na Alemanha, onde a Stasi, a polícia secreta da República Democrática Alemã, era onipresente. Em referência a essa época, o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, advertiu nesta quinta que um país pode se dirigir para o "totalitarismo", quando um "Estado utiliza seu poder de maneira intrusiva na vida das pessoas".

"Queremos a verdade", declarou o presidente do Conselho italiano, Enrico Letta, ao chegar para a cúpula. Políticos, empresários e militares da Itália foram espionados pelos Estados Unidos e pela Grã-Bretanha por meio de um rastreamento em massa de chamadas telefônicas e comunicações, segundo o jornalista Glenn Greenwald em entrevista à revista italiana L'Espresso.

De acordo com Greenwald, os serviços secretos ingleses compartilharam informações com a NSA e contavam com a colaboração de agentes italianos, que tinham um acordo de "terceiro nível" com a empresa inglesa encarregada de espionar o sistema de comunicações.

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Para monitorar as chamadas telefônicas e as comunicações eram utilizados três cabos de fibra óptica submarinos com terminais na Itália, segundo o jornalista. "A espionagem não é aceitável. Não podemos tolerar a existência de zonas sombrias, ou duvidosas", afirmou Letta.

"Fatos são fatos. Nós não podemos aceitar, venha de quem vier, uma espionagem sistemática. Medidas são necessárias, e não se pode imaginá-las vindas de um único país. É necessária uma ação europeia (...) para acabar com essa atitude", declarou o primeiro-ministro belga, Elio Di Rupo, cujo país também registrou casos de espionagem.

"Nós temos de pensar nisto: de que tipos de acordos precisamos, que tipo de transparência é necessária", ressaltou Merkel.

"Temos de agir e não apenas fazer declarações"

Um dos pontos a serem discutidos na cúpula é a proteção dos dados pessoais. A Comissão Europeia promove uma reforma da legislação que rege a questão, elaborada quando a Internet ainda não alcançava todos os âmbitos da vida privada.

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"Agora, temos de agir e não apenas fazer declarações", declarou nesta quinta-feira a comissária europeia de Justiça, Viviane Reding, que pediu aos líderes da UE para garantir que a reforma da proteção de dados seja adotada "até a primavera de 2014" (hemisfério norte). Bruxelas quer que os grandes grupos da Internet obtenham o consentimento prévio das pessoas para o uso de seus dados pessoais, sob pena de multas.

No entanto, até o momento, os europeus mantêm divergências em torno do projeto de lei sobre a proteção de dados apresentado há vários meses pela Comissão. Além disso, alguns países-membros, como a Grã-Bretanha, consideram, de acordo com uma fonte europeia, que a espionagem é uma questão de "segurança nacional" e que, portanto, não tem nada a ver com a proteção de dados em nível europeu.

"Ninguém gosta de ser espionado, legal ou ilegalmente. Se isso aconteceu, não há legislação europeia que possa ajudar", disse o primeiro-ministro finlandês, Jyrki Katainen, acrescentando que não sabe "o que pode ser feito em nível europeu".

O Parlamento Europeu pediu à Comissão Europeia para suspender o acordo UE-EUA sobre a transferência de dados bancários, assinado no âmbito da luta contra o financiamento do terrorismo. O chefe do Partido Social-Democrata alemão, Sigmar Gabriel, que negocia com Merkel uma grande coalizão de governo, chegou a por em xeque a continuidade das negociações de livre-comércio com os EUA.

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