Preencha "seu nome, data de nascimento, nomes do pai e avô". Depois, escreva: "Que idiomas você fala? Qual seu nível educacional?". Essas primeiras perguntas são comuns em qualquer formulário de emprego. Mas, em um formulário específico, logo as questões começam a se diferenciar.
"Qual a data de sua iniciação na jihad?"; "Você já foi condenado ou preso?"; "Você deseja executar uma operação suicida?"; "Quais objetivos você almeja em seu caminho pela jihad?"; "Quem devemos contactar caso você se torne um mártir?".
As questões listadas acima, das mais banais às mais esdrúxulas, estão presentes no formulário de aplicação preenchido pelos interessados em integrar a rede extremista Al-Qaeda.
Segundo autoridades americanas, o formulário foi encontrado em meio aos documentos de Osama Bin Laden, que estavam no complexo de Abbottabad (Paquistão), onde ele foi morto em 2 de maio de 2011 por forças americanas.
O formulário mostra que, como organização internacional, até mesmo a Al-Qaeda tinha trâmites burocráticos a serem cumpridos.
Documentos liberados
Os documentos e livros que pertenceriam ao extremista e encontrados em Abbottabad perderam o status de "secreto" nesta quarta-feira (20). O Escritório do Diretor de Inteligência Nacional (ODNI, na sigla em inglês) afirmou que foi feita uma "rigorosa" revisão antes da liberação dos papéis.
São 103 documentos ou vídeos liberados por autoridades americanas, incluindo cartas e recados (traduzidos ao inglês) e detalhes de operações da Al-Qaeda.
Entre os papéis que se destacam estão o formulário de inscrição da Al-Qaeda, correspondências de Bin Laden com seus aliados e até uma carta de amor a uma de suas esposas.
Em uma das cartas, Bin Laden instrui um de seus vices a dizer a "nossos irmãos" que eles deveriam focar seus esforços na luta contra os EUA.
Livros econômicos e militares
O complexo de Abbottabad também tinha livros - em inglês e em formato digital - sobre economia, tática militar e até mesmo sobre conspirações relacionadas ao 11 de Setembro.
Entre os livros estão Obama's Wars (As guerras de Obama), do conhecido repórter americano Bob Woodward, Confissões de um Assassino Econômico, de John Perkins (que traz alegações da exploração praticada por empresas americanas no mundo em desenvolvimento), e Hegemonia ou Sobrevivência: O sonho americano de domínio global, do pensador de esquerda e crítico da política americana Noam Chomsky.
Há também livros que abordam o Islã, o poderio nuclear do Irã, armas antiaéreas, lei internacional, terrorismo, poder americano e a presença militar americana no mundo, entre outros temas.
Os livros mostram o interesse de Bin Laden em conhecer as fraquezas e vulnerabilidades americanas, explica Gordon Corera, analista de segurança da BBC.
Entre os títulos mais prosaicos estão um guia de nutrição esportiva, o Livro Guinness dos Recordes de 2008 e um guia de prevenção ao suicídio (o governo dos EUA acha que esses títulos "eram provavelmente usados pelos demais residentes do complexo").
Polêmica em torno da morte
Bin Laden foi morto pelas forças especiais americanas há quatro anos, em uma ofensiva em Abbottabad. O episódio virou recentemente tema de controvérsia. Contrariando a versão do governo americano, o premiado jornalista Seymour Hersh alegou, em artigo publicado no periódico London Review of Books, que a morte de Bin Laden não foi alvo de uma operação arriscada e secreta, mas sim da cooperação entre militares americanos e paquistaneses.
O ataque teria sido autorizado por oficiais paquistaneses de alto escalão depois que os Estados Unidos descobriram onde Bin Laden estava por meio de uma fonte na Inteligência do Paquistão.
O governo dos EUA rejeita a versão de Hersh, chamando-a de "falsa" e repleta de "imprecisões e afirmações sem fundamentos".