Líderes de 27 países da União Europeia se reúnem nesta sexta-feira em busca de uma ampla reforma para garantir sua sobrevivência.
A cúpula, em Bratislava (Eslováquia), se dá em meio ao temor de ruptura generalizada, impulsionada pela ascensão dos partidos nacionalistas e após o plebiscito que aprovou da saída do Reino Unido do bloco.
O "Brexit" não estará na pauta do dia. A primeira-ministra britânica, Theresa May, não participará do encontro.
A agenda estará centrada no reforço das fronteiras externas da UE e novas promessas de estímulos a investimentos.
É cada vez mais palpável a desilusão dos europeus com a incapacidade do bloco de superar uma crise econômica que se arrasta desde 2008, de controlar o maior fluxo migratório desde a 2ª Guerra Mundial e de evitar atentados terroristas.
"As pessoas estão preocupadas com o que percebem como falta de controle e medos relacionados a imigração, terrorismo e globalização", observou recentemente o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk.
Riscos de implosão
A palavra de ordem é "retomar o controle político do futuro comum", insistiu Tusk durante as duas últimas semanas, quando percorreu as capitais europeias explicando as linhas gerais da reforma que planeja para o projeto europeu.
"Toda a Europa espera que a UE, depois (da cúpula) de Bratislava, seja outra vez uma garantia de estabilidade, segurança e proteção no sentido mais amplo, incluindo tanto a proteção social como econômica", disse Tusk na semana passada, em Estocolmo (Suécia).
O momento é crítico para os países mais importantes do bloco.
Em vários países, o ceticismo em relação à UE foi reforçado após a aprovação em plebiscito, em junho deste ano, da saída do Reino Unido do bloco comum. As negociações da separação só devem começar no ano que vem, se depender de Theresa May, e levará anos para se concretizar.
Mas políticos eurocéticos em todo o continente já estão de olho para descobrir o quão amigável será a separação e que vantagens - se é que haverá alguma - May conseguirá obter na saída. O raciocínio é que uma resposta branda demais da UE seria um incentivo para outros países se separarem.
Além disso, Alemanha, França e Holanda realizam eleições gerais em 2017 com partidos eurocéticos e acusados de xenofobia bem avaliados nas pesquisas de opinião.
O partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD) já conseguiu neste ano seus melhores resultados históricos nas últimas eleições regionais no país.
Na Áustria, o FPÖ, também de extrema direita, é o favorito nas eleições presidenciais do próximo 2 de outubro.
Já na Itália, onde o partido de extrema esquerda Movimento 5 Stelle (M5S) conquistou recentemente a prefeitura de Roma, o governo de centro esquerda de Matteo Renzi será posto à prova em um plesbiscito sobre uma reforma constitucional que diminui os poderes do Senado.
"Os cidadãos sentem que estão sendo ignorados pelos políticos e que seus verdadeiros problemas não estão sendo levados em conta", explicou à BBC Brasil Fabian Zuleeg, presidente executivo do centro de estudos European Police Center, sediado em Bruxelas, na Bélgica.
Imigração divisiva
Tusk pretende concluir a cúpula de Bratislava com uma declaração comum esclarecendo o caminho que o bloco pretende seguir e reiterando a união dos 27 países que vão permanecer na UE depois da saída britânica.
Mas as discussões poderão revelar mais um abismo entre dois novos blocos: de um lado os países do Mediterrâneo (França, Grécia, Itália, Portugal, Malta e Chipre); de outro, as antigas repúblicas soviéticas que integram o chamado Grupo de Visegrado (Hungria, Polônia, República Tcheca e Eslováquia).
Reunido em Atenas na semana passada, o primeiro grupo pediu que a cúpula de Bratislava abra caminho para "uma Europa diferente", com menos austeridade e mais políticas de crescimento, incluindo uma extensão do atual plano europeu de investimentos em infraestruturas.
Principais vítimas tanto da crise econômica como de refugiados, os países do sul devem pressionar por uma abordagem mais "humana" da imigração clandestina. Essa é a principal preocupação de 48% dos europeus atualmente, segundo um órgão do instituto de estatísticas da UE (Eurostat).
O grupo mediterrâneo insiste no sistema de redistribuição de refugiados entre os países europeus, adotado por maioria, mas ignorado pelo Grupo de Visegrado, para quem assuntos como esse são problemas de interesse nacional e devem ficar longe da influência de Bruxelas.
Bloco do leste
Governados por grupos ultraconservadores, os países do leste prometem apresentar em Bratislava uma proposta para devolver competências aos governos nacionais, ainda que isso exija reeditar os tratados europeus.
"Queremos que os parlamentos nacionais tenham mais peso, que a Comissão Europeia (CE) deixe de fazer política, de se intrometer em assuntos internos dos países membros. Vamos propor um debate para reformar os tratados europeus", antecipou a premiê da Polônia, Beata Szydlo, na última sexta-feira.
Já o primeiro-ministro húngaro, Víktor Orban, elencou fatores como imigração, nacionalismo e "Brexit" para sintetizar o espírito de insurgência que desafia os líderes dirigentes da União Europeia.
Para Orban, a separação britânica "oferece uma grande oportunidade para uma contra-revolução" contra os poderes do Executivo europeu e as ideias impostas por Alemanha.
"Devemos afirmar que os valores nacionais e religiosos são importantes e devemos defendê-los", afirmou, depois de um encontro bilateral com Szydlo.
"Os britânicos disseram que querem ser britânicos. Enquanto isso, a elite europeia estava acreditando que é necessário suprimir nossas identidades nacionais. Os imigrantes podem deslocar os habitantes originários da Europa."
Polônia e Hungria receberam, nos últimos meses, reiteradas advertências da CE devido a reformas que, segundo o Executivo europeu, colocariam em risco a democracia.
Segurança
O único ponto em comum parece ser a segurança.
Há consenso em torno da necessidade de controlar os documentos de todos os viajantes que cruzem as fronteiras externas da UE e de intensificar as expulsões e proibições de entrar no bloco para extrangeiros considerados como radicais.
Alemanha e França também pedirão a criação de um 'quartel-general' europeu para coordenar cooperação militar, assistência médica e intercâmbio de dados entre os exércitos nacionais, além de um orçamento comum para a pesquisa militar e compras conjuntas de equipamentos.
"Em um contexto de deterioração da segurança, é mais que hora de reforçar nossa solidariedade e as capacidades de defesa da UE", defenderam as duas principais potências do bloco em uma carta enviada esta semana aos demais países.
A ideia conta com o apoio do Grupo de Visegrado e da líder da diplomacia da UE, Federic Mogherini, que já prometeu apresentar ainda este ano um projeto concreto nessa linha.