Espanha: vitória da esquerda grega causa esperança e medo

Afundado em crise, país poderia seguir exemplo grego e 'se rebelar', elegendo esquerda e engrossando movimento antiausteridade na Europa.

27 jan 2015 - 16h18
(atualizado às 16h19)
<p>Tsipras terá uma margem muito pequena de negociação</p>
Tsipras terá uma margem muito pequena de negociação
Foto: Marko Djurica / Reuters

A vitória do partido de extrema esquerda Syriza na Grécia repercutiu na Espanha como se as eleições fossem locais: o tema monopolizou capas de jornais, debates no rádio, programas de televisão e pode, segundo analistas, ter impacto na política espanhola maior que em qualquer outro país europeu.

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Afundada numa crise econômica que já dura seis anos e com quase um quarto da população vivendo o drama do desemprego, a Espanha pode factivelmente ser a próxima a 'se rebelar' contra as forças políticas majoritárias e, seguindo o exemplo grego, eleger uma alternativa de extrema esquerda.

Essa alternativa se chama Podemos, nasceu há menos de um ano e promete convulsionar o cenário político espanhol.

Liderado pelo carismático professor universitário Pablo Iglesias, de apenas 36 anos, o partido lidera as principais pesquisas de intenção de voto nas eleições gerais espanholas, no fim do ano. Uma vitória significaria o fim do bipartidarismo vigente no país desde o fim da ditadura, em 1978.

"Hoje celebramos o começo da mudança na Europa, chega a esperança", afirmou Pablo Iglesias durante um comício para 9 mil pessoas em Valencia, no domingo.

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Gregos dizem não à austeridade imposta pela Europa
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"A austeridade fracassou e agora quem vai ficar isolada será Angela Merkel", discursou o político espanhol, em referência à chanceler alemã, partidária das medidas de austeridade.

Ele esteve presente no último comício da campanha do Syriza ao lado do seu líder, Alexis Tsipras.

Insatisfação

A aproximação dos dois partidos é lógica e representa a base do movimento antiausteridade que ganha ímpeto na Europa, mais ligada à insatisfação popular com os governos vigentes e o clamor por uma mudança imediata do que propriamente ideologia.

"As pessoas estão cansadas dos políticos de sempre e querem uma alternativa. Não sabem muito bem o que querem, mas sabem exatamente que não querem mais do mesmo", avalia Paloma Román Marugán, diretora da Faculdade de Ciências Políticas da Universidad Complutense de Madrid.

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Essa frustração em massa na Espanha é o pilar do crescimento vertiginoso do Podemos. O partido conseguiu o feito de se transformar na quarta força política do país pouco mais de três meses depois da sua criação, quando arrebatou 1,2 milhão de votos (8% do total) e cinco assentos nas eleições para o Parlamento Europeu, no ano passado.

Hoje, os números dos principais institutos de pesquisa espanhóis, Metroscopia e Sigma Dos, dão a vitória à legenda de Pablo Iglesias com 28% dos votos, com os tradicionais Partido Popular (PP, de direita) e Partido Socialista (PSOE, de centro-esquerda) brigando pelo segundo lugar.

Mas nem a mudança na opinião pública nem os resultados na Grécia parecem abalar a confiança dos governistas.

"A Espanha não é a Grécia", afirmou Josér María Beneyto, porta-voz de Relações Internacionais do Partido Popular no Congresso. "Os gregos elegeram o Syriza porque achavam que era sua única opção, mas essa espécie de esperança não passa de um grande engano", disse o político espanhol.

Em ano eleitoral, a Espanha terá três datas que podem servir para redefinir o cenário político nacional: eleições municipais e nas comunidades autônomas — em março, na Andaluzia, e em maio no resto do país — e, finalmente, eleições gerais no fim do ano (ainda sem data definida).

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Embora o governo minimize as semelhanças entre a realidade grega e a espanhola, analistas dizem que estas similaridades são difíceis de ignorar.

"Os dois países têm os piores índices de desemprego da Europa, viram seus benefícios sociais diminuírem drasticamente pelas políticas de cortes e austeridade e viram seus governos serem incapazes de solucionar a situação, atados pela União Europeia e a troika (o trio de credores formado pela União Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional)", explica a professora Román Marugán.

"A Espanha não é a Grécia", diz a professora, porém "o sentimento geral da população em relação à classe política é o combustível dos dois partidos".

Eleições distantes

Mas se a curto prazo a vitória do Syriza na Grécia dá uma injeção de ânimo a Pablo Iglesias e ao Podemos, os espanhois ainda terão quase um ano inteiro para acompanhar de perto os passos de Alexis Tsipras e aliados à frente do governo.

Assim como o sucesso do projeto antiausteridade grego pode ter uma influência positiva nas ambições da extrema esquerda espanhola, um fracasso pode ter um efeito devastador.

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"Se a Grécia conseguisse negociar mudanças em certos elementos da política econômica europeia, seria o máximo para o Podemos, mas Tsipras terá uma margem muito pequena de negociação. A sensação que tenho é que ele terá que engolir em seco o que lhe for imposto pela troika (o trio de credores formado pela União Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional) e isso geraria uma sensação de frustração tremenda nos espanhóis que sonham com uma mudança", afirma Federico Steinberg, economista da Universidad Autónoma de Madrid.

Por enquanto a sensação é de vitória e é com este espírito que Pablo Iglesias e seus aliados prometem tomar as ruas de Madri, no próximo sábado, em uma passeata que representará o começo do ano de campanha eleitoral.

"Vamos mandar uma mensagem ao primeiro ministro Mariano Rajoy: tic-tac, tic-tac, tic-tac... começa a contagem regressiva para a mudança", afirmou Iglesias no comício de domingo.

A eleições podem ter terminado na Grécia, mas o resto do ano ainda promete ser decisivo para gregos e espanhois.

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