Estrela do YouTube na Itália surpreende ao revelar ser filho de mafioso preso

24 abr 2017 - 13h54
(atualizado às 13h59)
O youtuber italiano Marco Leonardi, de 15 anos, sucesso nas redes e na vida real
O youtuber italiano Marco Leonardi, de 15 anos, sucesso nas redes e na vida real
Foto: Marco Del Torchio / BBC News Brasil

"Eu não tenho vergonha da minha história. Do contrário, não seria uma pessoa feliz". Marco Leonardi, youtuber de 15 anos, não nega suas origens.

Marco nasceu na província de Catânia, na Sicília, mas sua vida não é igual a de outros jovens influenciadores digitais. Ele é filho de Francesco Leonardi, condenado por associação mafiosa e preso em abril de 2013, durante a operação Fiori Bianchi 2 (Flores Brancas 2).

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Trata-se de uma ação que levou à prisão 77 membros do grupo mafioso Santapaola-Ercolano, para o qual foram pedidos, ao todo, 503 anos de prisão.

Marco, no entanto, tornou-se famoso nas redes sociais sem que seus fãs soubessem desse aspecto da sua vida. Seu pai deixará a cadeia em 14 meses. Enquanto isso, o filho se torna cada vez mais popular entre o público adolescente.

No Instagram, tem 564 mil seguidores; no YouTube, 174 mil assinantes; no Twitter, 43 mil seguidores; e no Facebook, 33 mil curtidas em sua página. Um número significativo quando comparado à população italiana, de cerca de 60 milhões.

Ele viaja pelo país, com outras estrelas da web, apresentando-se em shoppings e levando à loucura meninas da sua faixa etária.

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Biografia reveladora

Agora, depois de todo o sucesso, publicou um livro no qual revela os segredos de sua família: a vida fácil durante a infância, a prisão do seu pai, os problemas escolares e a ascensão como ídolo social.

"Meu pai ainda não conseguiu ver o livro. Vou levar quando visitá-lo na próxima semana, mas sei que ele está orgulhoso da minha carreira", disse Marco em entrevista à BBC Brasil. "Ele sempre soube que estava escrevendo um livro e nunca me impediu de revelar nossa história ao público."

"Eu construí meu sucesso sozinho, e meu pai está orgulhoso de mim porque com apenas 15 anos consigo sustentar minha família. Até poucos anos atrás, eu trabalhava coletando ferro para juntar dinheiro. Não tenho vergonha disso", acrescenta.

Marco Leonardi, com seu livro "Il web mi ha tolto dalla strada" ("A Web me afastou da estrada", editora Mondadori)
Foto: Divulgação / BBC News Brasil

Marco, segundo relata, consegue sustentar as despesas da casa, pagar o advogado do pai e ajudar sua mãe desempregada.

A vida do youtuber de 15 anos pode ser dividida em duas: antes e depois da prisão do pai. Francesco Leonardi já havia sido preso por assalto duas vezes: foi condenado a dois anos e oito meses na primeira vez; e a dois anos, na segunda.

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Na biografia, o adolescente reconhece os crimes do pai, mas também o defende.

"Meu pai pode parecer um criminoso, que vive de roubos e coisas do tipo", escreve em seu livro "Il web mi ha tolto dalla strada" ("A web me afastou da estrada", da editora Mondadori). "Eu não digo o contrário. Ele cometeu muitos erros, mas nunca fez mal a ninguém, nunca usou armas."

Apesar das prisões do pai, a infância de Marco foi repleta de mimos - bancados provavelmente com recursos do crime.

"Ninguém entendia a vida que tinha quando pequeno. Todos os dias eu ganhava roupas de grife novas, meu pai não deixava faltar nada", escreve.

"Às vezes, ele voltava para casa e, inesperadamente, com os bolsos cheios de dinheiro vivo, nos dizia: 'Vamos tirar umas férias!'. Lembro-me que fazíamos viagens todos os fins de semana, tenho várias fotos em fazendas, resorts... tínhamos férias maravilhosas".

Uma vida que permitia à família trocar de carro de um dia para outro: "Nós tínhamos um Twingo, mas depois o vendemos para comprar um Mini Cooper. Meu pai fez isso por mim, eu era vidrado no Mini, mas custava 12 mil euros (quase R$ 40 mil)."

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"Um dia meu pai chegou em casa e com naturalidade me mostrou um monte de notas de 50 euros dizendo: 'Vamos sair!'. E fomos comprá-lo", conta o menino siciliano.

Operação anti-máfia

Em 2013, no entanto, a operação contra grupos mafiosos invadiu a vida dos Leonardi. "Por volta das 4h30, ouvimos ruídos vindos de todos os lados: helicópteros, passos, luzes azuis que se infiltraram através das janelas. Era a polícia", lembra o jovem.

"Chegaram de repente, quando eu ainda estava na cama, embaixo dos lençóis, abraçado a meu pai. Um deles apontou a arma para mim porque não conseguia entender quem eu era. Então perguntei para o meu pai gritando: 'O que está acontecendo?'. Ele tentou me tranquilizar: 'Nada, é apenas um controle'."

Na Itália, ser acusado de associação mafiosa é um crime muito grave. O simples fato de pertencer a uma máfia pode levar a penas de 10 a 15 anos de prisão. Este é o resultado de uma legislação que se adaptou em resposta às frequentes ações das organizações criminosas.

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O pai de Marco não é um "chefão" da Cosa Nostra, a máfia siciliana. Seria apenas um "soldado", como se diz na Itália. Um famoso canal de televisão, apresentando o livro de Marco, disse que o pai era um "chefão", o que contrariou o adolescente, que foi desabafar nas redes sociais.

"Eu quis me pronunciar porque é uma notícia falsa. Ele foi acusado de associação mafiosa, mas não é um chefe da máfia, caso contrário, estaria isolado e sem poder falar com ninguém."

O adolescente se refere a um regime disciplinar diferenciado, chamado de "prisão rigorosa" e que costuma ser aplicado a condenados por associação mafiosa. Trata-se de uma medida de prisão muito controversa, que restringe ao máximo o contato externo ou com outros detentos.

A Promotoria pediu 12 anos de prisão por associação mafiosa, mas o pai foi condenado a cinco anos e quatro meses.

A prisão do pai fez com que Marco se sentisse deprimido. Ele não conseguia interagir e chegou a abandonar a escola. Assistentes sociais queriam colocá-lo num centro de reabilitação, quando então ele descobriu o mundo das redes sociais.

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"No início eu usava o perfil da minha mãe, e do outro lado da tela percebia que existiam pessoas como eu. Pouco a pouco, conversando com elas, comecei a acreditar em mim mesmo e pensei que talvez também pudesse compartilhar vídeos."

Marco diz que consegue sustentar as despesas da casa, pagar o advogado do pai e ajudar sua mãe desempregada
Foto: Marco Del Torchio / BBC News Brasil

Em 2013, ele inaugurou o primeiro perfil no Facebook, que não evoluiu. Em 2015, ele voltou à rede e gravou um vídeo. Os resultados chegaram em três dias: 60 mil visualizações e três mil curtidas. Em seguida, os vídeos se multiplicaram, entre imitações, desafios e brincadeiras.

Sua fama cresceu e, junto com os amigos, começou sua vida de web star na Itália.

"Acho que minha história vai ser útil para os adolescentes que não gostam de si mesmos. É uma história de esperança. Não há necessidade de se denegrir, há outras maneiras de encarar os problemas", afirmou.

Seu livro foi apresentado nas livrarias mais importantes de Milão, e já nos primeiros dias chegou aos mais vendidos pela Amazon no país.

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Os fãs não parecem condicionados ao seu passado, eles parecem na verdade gostar de sua sinceridade. O sucesso de Marco Leonardi ainda reabriu um velho debate na sociedade italiana sobre como se comportar diante dos filhos de mafiosos.

"Não é automático que o filho de um mafioso também se dedique ao crime. É preciso saber distinguir isso", afirmou o professor Enzo Ciconte, historiador das organizações criminosas na Itália.

Alguns políticos, no passado, propuseram que o Estado retire a guarda das crianças de famílias mafiosas.

Houve também casos de filhos que testemunharam contra os próprios pais mafiosos em processos judiciais. É uma discussão aberta, que hoje, também graças ao sucesso do jovem youtuber siciliano, volta ao debate público.

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