França: projeto de lei que penaliza cliente causa revolta entre prostitutas

5 dez 2013 - 10h38
(atualizado às 12h48)
<p>Mulher dança durante o protesto contra o projeto de lei: temor de mais insegurança e ataque às liberdades</p>
Mulher dança durante o protesto contra o projeto de lei: temor de mais insegurança e ataque às liberdades
Foto: AFP

O projeto de lei de combate à prostituição aprovado na tarde desta quarta-feira pelo Parlamento francês continua causando revolta entre as principais interessadas pelo texto: as prostitutas. 

Após os deputados aprovarem a lei por por 268 votos a favor e 138 contra, cerca de uma centena de profissionais do sexo reuniram-se próximo à Assembleia Nacional francesa para se manifestar contra o mais controverso dos parágrafos do texto, o que inclui a penalização de clientes.

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“Agora, elas irão se esconder no fundo do bosque... para serem assassinadas”, lamentava Morgane Merteuil, secretária-geral do Sindicato de Trabalhadores do Sexo, uma das associações que convocaram a manifestação. A dirigente fazia uma referência ao Bois de Boulogne, uma imensa área verde no oeste de Paris, principal ponto de prostituição da capital e cenário de constantes violências contra prostitutas - há cerca de duas semanas, em meio às árvores do lugar, uma mulher foi encontrada morta, com o corpo parcialmente carbonizado e desfigurada por golpes de soco-inglês e facadas.

Dados oficiais indicam que pelo menos 20 mil pessoas se prostituem atualmente na França. Segundo algumas associações, esse número seria de 400 mil. Além disso, 80% a 90% das prostitutas são estrangeiras vindas do leste europeu, África, América do Sul e China, muitas delas vítimas de máfias dedicadas ao tráfico de seres humanos.  

Segundo o texto da lei, quem utilizar serviços de prostitutas pode ser multado em 1,5 mil euros (cerca de R$ 4,8 mil), mas a taxa pode ser substituída por um estágio de conscientização sobre tráfico de seres-humanos e exploração sexual. Em caso de reincidência, a multa passa a 3.750 euros (cerca de R$ 12 mil). Ao apresentar o projeto de lei à Assembleia, a deputada socialista Maud Olivier afirmou que  “a ideia é reduzir a prostituição ao reduzir a demanda”.

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Inspirada no modelo sueco adotado no fim do século passado, a medida é criticada por diversas associações de defesa de profissionais do sexo e ONGs humanitárias.     

“A penalização do cliente fará com que as prostitutas exerçam seu trabalho escondidas, longe de associações de amparo e da polícia. É um grande problema que só vai agravar a situação de saúde pública e de segurança de quem se prostitui”, explicou Jean-François Corty, responsável pela França na ONG Médicos do Mundo. 

Congressistas votam o projeto de lei que combate a prostituição penalizando o cliente na noite de quarta
Foto: AFP

Lobby feminista

Apesar de ver alguns pontos positivos no texto - como as ajudas previstas pelo Estado francês para prostitutas que queiram largar o trabalho e visto de residência temporária para as estrangeiras - Corty afirma que punir o cliente é uma postura ideológica adotada por “feministas que não conhecem a realidade da prostituição de rua”. 

A opinião é compartilhada por Camille Cabral, transexual franco-brasileira que há 20 anos dirige a associação Prevenção e Ação pela Saúde e o Trabalho de Transexuais na França. “Isso tudo é uma farsa para ceder a um lobby feminista”, acusou a ativista, para quem o projeto aprovado pelos deputados franceses é uma “criminalização indireta das prostitutas”. 

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Prostitutas protestaram em frente à Assembleia Nacional da França na noite de quarta
Foto: AFP

“Já existe um livro que fala sobre tráfico humano e protege mulheres de cafetões. Ele se chama Código Penal e deveria ser utilizado”, disse Camille.

Nem mesmo a polícia francesa está totalmente de acordo sobre os benefícios da medida no combate ao proxenetismo e o tráfico de seres humanos. Em entrevista ao canal de notícias BFM TV, Jean-Marc Bailleul, dirigente do Sindicato de Funcionários da Segurança Interior, também lamentou que a nova lei penalize os clientes. 

“Para a polícia, que combate as redes de prostituição, será mais difícil”, disse Bailleul, ao explicar que a penalização dos clientes fará com que as prostitutas escolham lugares mais escondidos para exercer seu trabalho, dificultando a identificação daquelas que são obrigadas a se prostituir e a cooptação de informantes. “Vamos dar prioridade ao combate ao proxenetismo”, afirmou o policial.

Clientes se manifestam timidamente

Principais alvos da lei aprovada pelo Parlamento, eram poucos os clientes de prostitutas na manifestação realizada na noite de quarta. 

Com um cartaz na mão, cabelos ensebados e aparentando idade para ser avô de muitas mulheres ali presentes, Jean Pierre, um dos poucos a sair de casa para protestar contra a medida, explicou ter feito uso do serviço de prostitutas “por muitos anos” e que poderia voltar a fazê-lo “a qualquer momento”. No entanto, o que mais o irrita no projeto de lei é a intrusão do Estado em suas escolhas pessoais. “É um ataque à vida privada dos clientes”, disse o homem. 

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“São liberdades que nós temos, e queremos guardá-las”, defendeu-se Gilles, outro dos clientes que protestavam no local. “Eu tenho medo, mas vou continuar a sair com prostitutas”, afirmou.

Fonte: Especial para Terra
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