Rebeldes no leste da Ucrânia entregaram as duas caixas-pretas do voo MH17, que foi derrubado na última quinta-feira, quando ia de Amsterdã, na Holanda, para Kuala Lumpur, na Malásia. Elas foram entregues a especialistas da Malásia na cidade ucraniana de Donetsk.
A ação ocorreu horas depois de o Conselho de Segurança da ONU ter exigido o acesso imediato de enviados internacionais à área da queda. A tragédia deixou 298 mortos.
Especialistas dizem que as caixas-pretas irão revelar a hora do acidente, altitude e posição exatos da aeronave, além de gravações do que foi dito na cabine, que podem dar pistas para a solução do caso. Um dos dirigentes da delegação da Malásia disse a repórteres que os gravadores estão "em boas condições".
Espera-se que a entrega das caixas-pretas ajude a minimizar as incertezas sobre as causas e as consequências do acidente, que ocorreu em uma área crítica da fronteira com a Rússia.
Ucrânia e Rússia trocam acusações pela responsabilidade do acidente, enquanto a Holanda, país de origem da maioria das vítimas, chora pelos mortos do voo da Malaysia Airlines.
A BBC tenta trazer as respostas para as cinco principais interrogações que surgiram até agora sobre a queda do avião:
Por que o avião caiu?
Até agora, não se sabe quais são as causas que fizeram o voo MH17 cair no leste da Ucrânia, no meio de uma área de guerra entre governo e rebeldes pró-Rússia.
No acidente, 298 pessoas morreram - 283 eram passageiros e 15, tripulantes. A maioria das pessoas a bordo eram cidadãos holandeses, entre eles o cientista Joep Lange, reconhecido por seu trabalho no tratamento do vírus HIV.
A teoria mais forte até agora é a pregada pelas autoridades americanas e pelo governo da Ucrânia: o avião foi abatido com um míssil SA-11 Buk lançado por militantes separatistas pró-russos que atuam na região onde o avião caiu.
Essa hipótese é apoiada por uma conversa, divulgada na sexta-feira pelo governo ucraniano, entre dois ativistas pró-Rússia em que se relata que um avião civil fora atingido e que havia centenas de vítimas. Mas a informação não foi confirmada.
Entretanto, tanto o governo de Vladimir Putin como os rebeldes separatistas têm negado a responsabilidade no incidente e acusaram os Estados Unidos, a União Europeia e a Ucrânia de realizarem uma "guerra de informação". Eles ainda acusam o governo da Ucrânia pela queda da aeronave durante ataques na fronteira com a Rússia.
Quem poderia derrubar o avião?
Em meio à disputa pelo controle da região na Ucrânia, os dois lados teriam armamento para abater um avião voando a 10.000 metros de altitude.
Michael Clarke, diretor-geral do Departamento de Estudos em Defesa e Segurança do Royal United Services Institute, disse à BBC que é possível que o ataque tenha sido feito pelo lado rebelde por engano. "Todas as provas são circunstanciais, mas tudo aponta para um sentido: os separatistas utilizaram um míssil SA-11 Buk", disse Clarke.
O sistema Buk, também conhecido como o Gadfly (como nomeia a Otan), é de fabricação russa e foi concebido originalmente nos anos 70 (como sucessor do sistema SA-6).
"Nós sabemos que os separatistas comemoram no dia 29 de junho o fato de terem roubado um (míssil russo) SA-11 Buk dos ucranianos", disse, "inclusive disseram onde pegaram, de uma região de defesa aérea ucraniana e até informaram seu número, que era A1402 ", conta Clarke.
Mas a Rússia e os rebeldes separatistas acusaram a Ucrânia de ser responsável pelo ato. O exército da Ucrânia também usa o mesmo sistema de mísseis.
Por essa razão, o ministro da Defesa da Ucrânia emitiu um comunicado na sexta-feira negando qualquer operação militar na área onde ocorreu o roubo do míssil e também negou que utilizaram aeronaves de guerra.
As equipes de resgate que trabalham na área onde caiu MH17 relatam que até agora foram encontrados 196 corpos nos destroços.
A maioria dos corpos foi colocada em vagões refrigerados e levada para a cidade de Torez. De lá, um trem saiu com os corpos rumo a Kharkiv, onde deverão ser entregues a autoridades holandesas. Não se sabe quem tem ou teve acesso aos corpos.
O correspondente da BBC na região, Fergal Keane, informou que esses corpos foram retirados da área que está sob o controle de separatistas pró-Rússia por homens que se recusaram a ser identificados.
Ele acrescentou que a indisciplina e o caos dos últimos dias foram substituídos por uma forte presença da polícia de choque, que isola a área.
Para os representantes do governo holandês – nacionalidade de maior parte das vítimas - a maneira como a situação está sendo tratada é mais do que indelicada.
"Estou chocado com as imagens do lugar. As pessoas andam por lá com os pertences pessoais das vítimas. É absolutamente repugnante", disse o primeiro-ministro holandês, Mark Rutte.
O chanceler da Holanda, Frans Timmermans, apelou à cooperação internacional para ter acesso à área do desastre.
"A Holanda está de luto e quer repatriar seu povo para casa. Recuperar os corpos é a nossa prioridade, e, dadas as circunstâncias, é um grande desafio", disse Timmersmans.
Por que não começaram uma investigação?
Uma das principais dificuldades encontradas pelas autoridades europeias é o fato de os ativistas pró-russos controlarem o local.
Um dos líderes dos separatistas, Aleksander Borodai, rejeitou as acusações do governo da Ucrânia, que disse que os rebeldes estão interferindo nas provas.
No entanto, representantes da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), que foram inspecionar o local onde o avião caiu, encontraram uma parede humana que, a princípio não deixou que realizassem seu trabalho e, em seguida, permitiram, mas com limitações.
A competência da investigação é do país onde ocorreu o acidente, de acordo com a Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO, na sigla em Inglês), agência filiada à ONU.
Neste caso, seria a Ucrânia, mas, como se trata de uma área disputada, ainda é muito difícil saber como proceder com a investigação. Os Estados Unidos, a Holanda e a Austrália pediram, através de seus representantes, que seja feita uma investigação internacional.
Que implicações internacionais tem o caso?
Uma das preocupações no âmbito internacional é que, encontrando evidências de que rebeldes separatistas derrubaram o avião com armas pesadas dadas pela Rússia, a relação entre o Ocidente e Moscou possa piorar.
Na segunda-feira, o presidente russo, Vladimir Putin, disse que "tudo deve ser feito para garantir a segurança dos especialistas internacionais no local da tragédia."
O relato foi uma resposta à solicitação dos líderes dos governos da Grã-Bretanha, Alemanha e Estados Unidos, que continuam pedindo que a Rússia se empenhe em colaborar com o início de uma investigação internacional sobre as causas do incidente.
O primeiro-ministro britânico, David Cameron, falou por telefone durante meia hora no domingo com o presidente russo, para solicitar sua intervenção para ajudar a repatriar os corpos.
Os Estados Unidos, por sua vez, anunciaram no sábado uma série de medidas para reforçar as sanções econômicas contra a Rússia.