Há coisas que nós sabemos que sabemos, outras que sabemos que não sabemos e outras que acreditamos saber, mas provavelmente não sabemos.
Fazer com que possamos identificar nossas lacunas de conhecimento e corrigi-las foi uma das missões que o médico, acadêmico e estatístico sueco Hans Rosling deu a si mesmo. Rosling, que faleceu no último mês de fevereiro, ficou famoso como o "profeta da demografia".
Por intermédio de sua organização - a Fundação Gapminder, que promove o desenvolvimento sustentável -, ele usou estatísticas simples para combater o que chamou de "devastadora ignorância" e os mitos que existem em todo o mundo sobre a evolução populacional e o desenvolvimento global.
Mas uma das ferramentas mais eficientes que ele criou foi o "Teste de ignorância" - que consiste em poucas perguntas sobre temas de que ouvimos falar frequentemente, mas sobre os quais, na maioria das vezes, temos informações defasadas.
Qual seria o seu resultado no teste? Experimente.
PERGUNTA 1
Sabe-se que a vacina mais importante para as crianças é a de sarampo, especialmente para as crianças subnutridas, que podem morrer por causa da doença.
Quantas crianças de um ano estão vacinadas contra o sarampo em todo o mundo?
a) 2 em cada 10
b) 5 em cada 10
c) 8 em cada 10
PERGUNTA 2
Em 1950, havia no mundo menos de 1 bilhão de crianças menores de 15 anos. No final do século 20, o número duplicou, chegando a 2 bilhões.
A ONU estimou quantas crianças menores de 15 anos haverá ao final do século 21.
Qual é a quantidade estimada?
a) 4 bilhões (a cifra continuará duplicando)
b) 3 bilhões (o crescimento sofrerá uma desaceleração)
c) 2 bilhões (não haverá mais crescimento)
PERGUNTA 3
Como mudou nos últimos 20 anos a proporção da população mundial que vive na pobreza extrema?
a) Duplicou
b) Se manteve igual
c) Caiu para a metade
RESPOSTAS
Nos três casos a resposta correta é a opção c.
Você acertou?
Rosling explicou à BBC os resultados do teste e suas implicações:
PERGUNTA 1: Oito em cada 10 crianças de um ano estão vacinadas contra o sarampo em todo o mundo.
Mais especificamente, 83% do total, segundo Rosling.
"A ajuda humanitária funciona", disse. "Nesse caso, os governos trabalharam em conjunto com a Fundação Bill e Melinda Gates (do dono da Microsoft e sua esposa) e com a Unicef e conseguiram que a vacina chegasse às pessoas."
PERGUNTA 2: No final deste século haverá 2 bilhões de crianças menores de 15 anos (não haverá crescimento na cifra)
Há 2 bilhões de menores de 15 anos atualmente e não se espera crescimento - apesar de um aumento no número de jovens na África, a cifra está diminuindo na Europa e na Ásia.
Como se explica então o cálculo de que a população mundial aumentará dos 7 bilhões atuais a 11 bilhões no final deste século?
"Se chama 'efeito de recheio'", explicou o estatístico sueco.
"Há 4 bilhões de pessoas menores de 30 anos. Se elas tiverem um filho cada uma (duas crianças por casal, em média), haverá 4 bilhões de pessoas entre as idades de 30 e 60 anos e e 4 bilhões de crianças."
Somando-se o resto da população, incluindo aos idosos que hoje vivem mais, chegaria-se à cifra de 11 bilhões. "Hoje há 2,4 crianças por mulher no mundo", disse.
"Para mim o fato de que o número de crianças deixou de subir é um dos eventos mais importantes na história da humanidade. No entanto, é um dado que a maioria dos meios de comunicação, incluindo a BBC, não passa ao seu público."
PERGUNTA 3: A proporção da população mundial que vive na pobreza extrema se reduziu à metade nos últimos 20 anos.
Segundo Rosling, quando ele fez essas mesmas perguntas aos especialistas no Fórum de Davos, onde se reúnem economistas, empresários e políticos influentes, só 38% deles sabiam que a pobreza extrema havia diminuído e só 25% acertaram a pergunta sobre a população infantil do futuro.
"Quando fiz a mesma pergunta a chimpanzés no zoológico, 33% deles acertou a resposta correta."
Mas o que significa isso? Que enquanto os chimpanzés responderam de maneira completamente aleatória, os especialistas não recorreram à sorte, ou teriam acertado índices semelhantes.
Em vez disso, responderam mal porque estão mal informados e basearam suas respostas em ideias preconcebidas, segundo Rosling.
O melhor exemplo é o das vacinas - só 18% dos especialistas de Davos deu a resposta correta.
Por que somos tão ignorantes?
Segundo Rosling, porque os frequentadores de Davos se especializam em um assunto específico e quando estudaram assuntos globais na escola, aprenderam com os dados disponíveis na época - que muitas vezes ficaram defasados.
"Ainda existe essa noção de que há um mundo em desenvolvimento, que reúne países como Brasil e Somália", exemplificou.
"Mas o Brasil tem uma renda per capita 24 vezes maior que a Somália. É uma estranha mania de dividir o mundo em dois, que já não se sustenta."
"A maior parte da população mundial vive em uma posição intermediária: têm dois filhos, são vacinados, conseguem alimentar sua família, têm luz elétrica e trabalham duro para poder comprar uma máquina de lavar. Mas isso não é comunicado a todos", afirmou o sueco.
Os bem informados
Surpreendentemente, o grupo que obteve os melhores resultados no teste de ignorância foi o dos grandes executivos de empresas transnacionais.
"Se você administra uma grande empresa, tem que conhecer o mundo. E, hoje em dia, todas as empresas querem ser globais", disse Rosling.
O estatístico também revelou que sua fundação, a Gapminder, recebia ofertas muito bem remuneradas do setor financeiro e corporativo para educar seus funcionários.
"Quem investe dinheiro e administra aposentadorias tem que saber onde pôr seu dinheiro para obter lucro. Hoje a Europa Ocidental oferece um retorno de capital de 1% a 2%, enquanto que na África, esse retorno é de 4% a 5% e, na Ásia, ainda maior", afirmou.