O irmão de um homem que morreu no naufrágio de um barco com dezenas de migrantes, em Cabo Verde, disse à BBC que eles estavam tentando chegar à Espanha.
A estimativa é que mais de 60 pessoas tenham morrido no barco, que ficou à deriva no mar por mais de um mês. A maioria era do Senegal.
"Todos estão chocados. Ele era um dos pilares da nossa família", disse Mamour Ba sobre seu irmão, que se chamava Cheikhouna.
Mas o rapaz, de 27 anos, disse que ainda tentaria fazer a viagem sozinho, pois era impossível ganhar a vida no Senegal.
Ba é um estudante da pequena cidade pesqueira de Fass Boye, a meio caminho da costa entre a capital, Dakar, e a cidade histórica de St. Louis.
Três de seus irmãos e um de seus primos estavam no barco de madeira que partiu para a Europa em 10 de julho de Fass Boye. Havia 101 pessoas a bordo.
"Eles queriam ir para a Espanha. Eles disseram que queriam ir embora e eu não podia dizer a eles que não, porque eles já haviam se decidido."
Ele pensou que todos haviam morrido, até receber uma ligação de Cabo Verde na quarta-feira após o resgate.
Seus familiares estavam entre as 38 pessoas, incluindo crianças, que foram salvas. As imagens mostravam os migrantes sendo ajudados a desembarcar, alguns em macas, na ilha do Sal. Estima-se que mais de 60 outras pessoas tenham se perdido no mar.
O arquipélago fica a cerca de 600 km da costa da África Ocidental e, na rota de migração para as Ilhas Canárias, é um território espanhol visto por muitos como uma rota para a Europa.
Ba diz que ainda não conhece os detalhes da viagem de cinco semanas de seus parentes porque eles estavam muito desorientados. "Eles não tiveram forças para explicar o que aconteceu, apenas disseram: 'Estamos vivos'. Eles estavam muito fracos."
Mas conforme a conversa continuou, ele descobriu que nem todos haviam sobrevivido.
"Um dos meus irmãos, o Ibrahima, usou um dos telefones do médico para me ligar de Cabo Verde. Ele me disse que nosso outro irmão, Cheikhouna, havia se perdido no mar. Fiquei chocado. Éramos muito próximos, ele era um verdadeiro lutador. Ele era casado e tinha dois filhos", conta.
"No dia em que ele partiu, ele segurou minhas mãos e disse: 'Irmão, tenho que ir'.
"Ele era meu irmão, ele era meu amigo."
Depois que a notícia da tragédia se espalhou em Fass Boye, de onde vinha a maioria das pessoas a bordo do barco, a raiva explodiu na quarta-feira.
Alguns atearam fogo na casa do prefeito, revoltados com as autoridades sobre a falta de oportunidades para os jovens.
Essa frustração é algo com o qual Ba está muito familiarizado - ele tentou pelo menos duas vezes deixar o Senegal.
"Não havia nada para mim aqui. Então decidi que precisava tentar me mudar para a Europa via Marrocos", disse ele, falando sobre sua primeira tentativa durante seu terceiro ano na universidade.
As coisas não deram certo e ele foi forçado a voltar para casa depois de passar nove meses no trajeto.
Mas ele estava determinado a realizar seu sonho de se mudar para a Europa - e tentou novamente, desta vez apenas algumas semanas atrás, no final de junho, com Cheikhouna.
Mas a tentativa falhou.
"Esta última viagem foi a segunda tentativa de Cheikhouna de chegar à Europa de barco.
Três dias depois que voltamos, ele partiu novamente", disse Ba.
"Ele estava determinado a sair porque tinha família e não há nada para nós aqui no Senegal. Somos pescadores, trabalhamos o dia todo e não ganhamos dinheiro. Ele só queria alimentar a família e ter uma vida melhor."
Ba sabe que é arriscado tentar chegar à Europa em outro barco, mas tudo se resume às finanças. "Não tenho dinheiro para pegar um avião. É melhor pagar U$ 480 (cerca de 2.400) para ir à Espanha do que gastar milhões tentando chegar lá de avião", diz.
Ele afirma não ter medo de se afogar. "Outros fizeram esta viagem e se afogaram, mas isso não me desanima. É um risco que estou disposto a correr. Mesmo que houvesse um barco pronto para partir hoje, eu aceitaria."