O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, pretende tomar posse nesta sexta-feira (10/1), dando início ao seu terceiro mandato de seis anos como líder do país.
A oposição a Maduro, no entanto, não aceita o que o governo de Maduro diz ser o resultado da eleição.
O Conselho Eleitoral, chefiado por aliados do presidente da Venezuela, nunca publicou as atas da eleição para comprovar que Maduro ganhou de fato o pleito — um gesto criticado não só pela oposição da Venezuela, como por diversos outros países, inclusive pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva, no Brasil.
O líder da oposição, Edmundo González — que concorreu contra Maduro nas eleições venezuelanas realizadas em 2024 —, disse ser ele próprio o vencedor do pleito. E prometeu voltar para a Venezuela nesta sexta-feira para tomar posse.
González está no exterior desde o fim das eleições. A justiça da Venezuela expediu uma ordem de prisão contra ele - e o governo de Maduro ofereceu uma recompensa de US$ 100 mil (cerca de R$ 607 mil) por qualquer informação que leve à sua captura.
O chavismo — movimento político iniciado pelo falecido presidente Hugo Chávez e liderado desde sua morte por Maduro — tem um histórico de perseguição política à oposição.
O chavismo está no poder desde 2002; e Maduro é presidente desde 2013.
Até o fim de 2024, havia 1.794 presos políticos na Venezuela em 30 de dezembro, segundo a entidade de direitos humanos venezuelana Foro Penal.
Os dois principais líderes da oposição na Venezuela hoje — María Corina Machado e Edmundo González — estão exilados.
Nesta semana, falando da clandestinidade, a líder política de 57 anos disse à BBC que o chavismo nunca esteve tão debilitado quanto agora e pediu a Maduro que não permaneça no poder pela força.
No passado, outros líderes oposicionistas também tiveram problemas com a Justiça venezuelana — que há anos é controlada por chavistas.
Dos cinco principais líderes oposicionistas ao chavismo, três estão no exílio e dois estão na Venezuela — uma delas escondida e outro banido da política. Veja a seguir.
1. Edmundo González Urrutia: no exílio
Edmundo González Urrutia virou candidato da oposição venezuelana na eleição de julho de 2024 depois que a principal líder da oposição, María Corina Machado, foi barrada de concorrer.
O diplomata aposentado de 75 anos, de perfil discreto e fala pontuada, nunca havia ocupado cargos públicos e nem mesmo era amplamente conhecido nos círculos da oposição. Mas após meses de campanha, sua popularidade cresceu.
Ele contestou o resultado das eleições — que foram declaradas oficialmente vencidas por Maduro, mas sem apresentação de atas eleitorais que comprovassem a vitória. Houve violência após as eleições na Venezuela, com a morte de pelo menos 27 pessoas e com 192 feridos.
O governo de Nicolás Maduro prendeu mais de 2,4 mil pessoas depois das eleições.
Em setembro de 2024, dois meses após a eleição venezuelana, González deixou o país para se exilar na Espanha — depois de um juiz ter emitido um mandado de detenção contra ele relacionado à sua postura de contestação das eleições.
González passou alguns dias na embaixada da Espanha em Caracas.
Um juiz venezuelano ordenou a captura de Edmundo González por suposta "usurpação de funções, falsificação de documento público, incitação à desobediência das leis, conspiração, sabotagem de sistemas e delitos de associação criminosa".
O ex-candidato não compareceu à Justiça, apesar das sucessivas convocações, e estava na clandestinidade desde julho.
O governo de Maduro ofereceu uma recompensa de US$ 100 mil (cerca de R$ 607 mil) por informações que levassem à captura do líder da oposição.
Nesta semana, González disse que tem "toda intenção de chegar à Venezuela" no dia 10 de janeiro, data da mudança de governo.
"Minha intenção é ir à Venezuela simplesmente para tomar posse do mandato que os venezuelanos me deram quando me elegeram com 7 milhões de votos para servir como presidente", declarou González à imprensa na Argentina, após se reunir com o presidente Javier Milei esta semana.
O governo de Maduro anunciou o deslocamento de 1,2 mil militares em todo o país para "garantir a paz" no dia 10 de janeiro. E assegurou que não existe "nenhuma possibilidade" de que González "coloque um pé na Venezuela sem ser detido".
González disse na terça-feira que seu genro, Rafael Tudares, foi "sequestrado" na Venezuela.
Em uma mensagem no X, ele disse que Tudares foi "sequestrado" por "homens encapuzados vestidos de preto" nas ruas de Caracas.
"Esta manhã meu genro Rafael Tudares foi sequestrado. Rafael estava indo para a escola dos meus netos de 7 e 6 anos em Caracas para deixá-los para o início das aulas, e foi interceptado por homens encapuzados vestidos de preto", disse em sua publicação.
"Eles o colocaram em uma caminhonete dourada, placa AA54E2C, e o levaram embora. Ele está desaparecido no momento."
Mariana González de Tudares, filha do líder político e esposa de Rafael, disse em nota que seu marido está em "situação de sequestro por agentes de segurança e inteligência do Estado venezuelano" e acrescentou que ainda não tem informações concretas sobre seu paradeiro ou sua integridade física e pessoal.
2. María Corina Machado: escondida e detida
María Corina Machado foi o braço direito e companheira de campanha de González Urrutia. Ela o apoiou como candidato único, depois que o governo venezuelano a impediu de concorrer à presidência. Ela é hoje a principal voz da oposição no país.
Machado foi "detida violentamente" na quinta-feira e minutos depois liberada, segundo denunciou o seu partido.
Ela apareceu em um protesto contra a posse de Nicolás Maduro, após meses escondida na clandestinidade. Ela não era vista em público desde o final de agosto, em meio a um período em que se intensificaram as prisões de cidadãos comuns e líderes da oposição.
Ela disse recentemente que espera que a marcha ajude a criar espaço para que González volte ao país — desafiando as ordens da Justiça venezuelana para prendê-lo.
Corina Machado tem concedido entrevistas de seu esconderijo.
"Ele sabe que não tem como permanecer no poder, exceto pelo uso da violência, o que é insustentável", disse ela em entrevista concedida por teleconferência à BBC essa semana.
3. Juan Guaidó: no exílio
Em 2019, a Assembleia Nacional (o parlamento venezuelano) declarou o deputado Juan Guaidó, do partido Voluntad Popular, como "presidente interino" da Venezuela — desafiando o poder de Nicolás Maduro.
Guaidó iniciou uma campanha internacional buscando ser reconhecido como líder legítimo do povo venezuelano — e conquistou apoio de mais de 60 países, entre eles os Estados Unidos e o Brasil, na época governado por Jair Bolsonaro.
Maduro congelou os ativos de Guaidó e o acusou de uma conspiração internacional. Em abril de 2019, Guaidó convocou manifestações contra Maduro e disse ter apoio das Forças Armadas do país para derrubar Maduro. No entanto, o levante nunca se concretizou.
Guaidó liderou alguns esforços de negociação com Maduro — mas as discussões nunca evoluíram.
Divisões internas da oposição venezuelana resultaram em um voto que pôs fim ao seu status autodeclarado de presidente interino da Venezuela em dezembro de 2022.
Em abril de 2023, Guaidó fugiu para os Estados Unidos, onde pediu asilo. Ele vive na Flórida desde então.
Em outubro de 2023, a Justiça venezuelana indiciou Guaidó por crimes como lavagem de dinheiro e traição, e ordenou sua prisão. O político nega todas as acusações e diz ser perseguido do governo venezuelano.
4. Henrique Capriles: barrado de concorrer
Henrique Capriles era uma estrela em ascensão da oposição venezuelana, tendo governado o Estado de Miranda.
Em 2012, ele enfrentou Hugo Chávez nas eleições presidenciais. Em 2013, após a morte do líder venezuelano, ele enfrentou Nicolás Maduro nas urnas — tendo sido derrotado em ambas as ocasiões.
O pleito contra Maduro foi apertado — e Capriles acusou irregularidades no processo eleitoral.
Em abril de 2017, Capriles foi banido da política venezuelana — acusado de irregularidades administrativas no comando do governo de Miranda. Capriles convocou protestos contra a decisão, mas foi acusado de incitar violência e impedido de ocupar cargos políticos por 15 anos.
Com isso, deixou o governo de Miranda em 2017 sem poder se candidatar à reeleição.
Mesmo impedido de concorrer, ele chegou a anunciar uma pré-candidatura à Presidência em 2024. Mas acabou desistindo, em favor da união em torno de Edmundo González.
5. Leopoldo López: no exílio
Um dos primeiros opositores ao chavismo foi Leopoldo López, ex-prefeito de Chacao, umas das subdivisões administrativas de Caracas.
Em 2004, ele foi declarado inelegível por seis anos (entre 2008 e 2014) por supostas irregularidades na sua gestão — algo que López acusou como sendo parte de um processo de perseguição.
Ele levou o caso adiante para a Corte Interamericana de Direitos Humanos, onde saiu vitorioso. Mas a decisão não foi reconhecida por autoridades venezuelanas.
Em 2014, ao convocar protestos, ele foi acusado de conspiração. No ano seguinte, foi condenado a 13 anos de prisão.
Desde então, ele é o preso político mais famoso da Venezuela. Em 2017, ele foi transferido para prisão domiciliar. Em 2019, ele foi solto por agentes de segurança que apoiam a oposição, e se refugiou na embaixada da Espanha em Caracas, onde ficou por dois anos.
Em 2020, ele conseguiu fugir da Venezuela e mora na Espanha desde então.