Um adolescente envolvido no que a polícia descreveu como uma rede terrorista satanista que visava crianças online para chantagem e violência sexual foi condenado a seis anos de prisão no Tribunal Central Criminal, conhecido como Old Bailey, em Londres.
Cameron Finnigan se declarou culpado de incitação ao suicídio, posse de um manual de terrorismo e imagens indecentes de uma criança.
O julgamento mostrou que o jovem de 19 anos, de Horsham, na Inglaterra, fazia parte de um grupo satanista de direita radical chamado 764, que a polícia antiterrorismo adverte que representa "uma imensa ameaça".
Pelo menos quatro adolescentes britânicos foram presos em conexão com as atividades do grupo, que chantageia crianças — principalmente meninas — para que pratiquem atos sexuais, se automutilem ou tentem até suicídio.
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Em uma audiência anterior, Finnigan se declarou culpado de cinco acusações — e agora, na quinta-feira (16/1), foi condenado a cumprir uma pena de seis anos de prisão e três anos em regime condicional após ser libertado.
O juiz disse que ele representava "um alto risco de danos graves ao público".
Finnigan foi preso em março de 2024 depois que a polícia recebeu informações de que ele tinha uma arma.
Nenhuma arma de fogo foi encontrada na casa dele, mas depois de analisar seus dispositivos digitais, os policiais encontraram bate-papos online em que ele incentivava uma jovem, que acredita-se estar na Itália, a transmitir ao vivo seu próprio suicídio.
Os policiais não conseguiram identificar esta mulher, e não sabem o que aconteceu com ela.
Em bate-papos online, Finnigan se gabava para outros membros do 764 sobre suas tentativas de fazer com que as crianças se automutilassem.
A detetive Claire Finlay, chefe da Polícia de Combate ao Terrorismo da região de South East, na Inglaterra, diz que os membros do grupo competiam para ver quem era o mais radical:
"Se você consegue fazer alguém se automutilar, você está se saindo muito bem nesse grupo. Se você consegue fazer com que se matem, você está chegando ao auge."
Um documento em PDF de 11 páginas também foi encontrado no computador de Finnigan, dando instruções detalhadas sobre como realizar um ataque terrorista com "vítimas em massa" usando um caminhão, armas de fogo ou facas.
E na plataforma de troca de mensagens Telegram, ele e outros membros planejaram o que chamaram de "semana do terror".
Ele disse ao grupo que planejava assassinar um morador de rua que vivia em uma barraca perto da casa dele — e chegou até a postar fotos do local.
"Não vou parar até que ele esteja morto", ele escreveu online.
"Este caso foi muito chocante", afirmou Finlay.
"Cameron Finnigan era perigoso. Havia uma ameaça à segurança pública."
'Uma imensa ameaça'
A rede 764 foi fundada em 2020 por um adolescente americano, Bradley Cadenhead, que tinha 15 anos na época. Acredita-se que seu nome tenha sido inspirado no código postal parcial de sua cidade natal, no Texas.
A polícia afirma que o grupo faz parte de uma rede internacional informal de grupos extremistas de direita radical que adotaram o que os policiais chamam de "ideologia militante aceleracionista".
Aqueles que pesquisaram os grupos dizem que eles buscam destruir a sociedade moderna e civilizada cometendo atos depravados de violência e exploração sexual — muitas vezes envolvendo crianças.
Cadenhead foi preso em 2021 e agora está cumprindo uma pena de 80 anos de prisão no Texas pela criação de vídeos em que crianças não apenas eram abusadas sexualmente, como também asfixiadas, espancadas, sufocadas e gravemente feridas.
A rede usa imagens nazistas e satanistas. Finnigan, cujo nome de usuário online era "Acid", decorava seu quarto em West Sussex com suásticas e pentagramas.
Em uma postagem online, ele escreveu: "Acid é filho de Hitler".
No ano passado, o FBI, a polícia federal americana, divulgou uma advertência sem precedentes sobre o 764, dizendo que o grupo "usa ameaças, chantagem e manipulação para controlar as vítimas e fazê-las gravar ou transmitir ao vivo automutilação, atos sexualmente explícitos e/ou suicídio".
Agora, a polícia britânica emitiu seu próprio alerta.
"Queremos conscientizar o público [sobre o 764]", afirmou Finlay.
"A ameaça que eles representam, não apenas no Reino Unido, mas globalmente, é imensa."
Não se sabe como Finnigan se envolveu com o grupo.
A BBC conversou com uma pessoa que o conhecia bem. Ela nos disse que seu comportamento mudou quando ele se envolveu com outros extremistas online.
"Eles compartilhavam todas as coisas horríveis e terríveis entre si. Foi quando ele passou de atencioso e amoroso a manipulador, tóxico, controlador e sádico", a pessoa afirmou.
"Ele nunca demonstrou sentimento de culpa, na verdade, ele se gabava disso com os amigos, como se gostasse do sofrimento e achasse divertido. Era repulsivo e completamente desumano."
'É algo que causa pesadelo'
Becca Spinks é uma investigadora especializada em internet, baseada nos EUA, que estudou o grupo.
"Eles vão tentar coagir e persuadir jovens vulneráveis a se automutilar, pegar uma lâmina de barbear e gravar o nome do abusador no corpo em vídeo", diz ela.
Spinks identificou Finnigan como membro do 764 antes de ele ser preso. Ele entrou então em contato com ela — e, em mensagens às quais a BBC teve acesso, ameaçou estuprá-la e matá-la.
"Percebi rapidamente que havia mexido em um vespeiro terrível", conta Spinks.
"O FBI me disse que esse grupo era muito violento e muito perigoso. É uma coisa horrível, que causa pesadelo."
Prisões relacionadas ao 764 com base em acusações relacionadas a abuso infantil, sequestro e assassinato foram efetuadas em pelo menos oito países, incluindo o Reino Unido.
Ano passado, Vincent Charlton, de Gateshead, na Inglaterra, então com 17 anos, foi preso por disseminar publicações terroristas, possuir documentos úteis a um terrorista e produzir e possuir imagens indecentes de crianças.
A BBC descobriu online que o 764 ainda está ativo no mundo todo — e viu mensagens em que os membros do grupo se gabam dos seus feitos, compartilhando fotos e vídeos de suas vítimas.
Normalmente, o grupo procura meninas vulneráveis nas redes sociais, muitas vezes em comunidades dedicadas à automutilação ou à saúde mental. Eles se comunicam com elas em plataformas de troca de mensagens como Discord e Telegram, geralmente enviando material de abuso infantil sexualmente explícito.
Um porta-voz do Discord nos disse que havia denunciado Finnegan às autoridades nos EUA, e acrescentou que a plataforma estava comprometida em combater conteúdo prejudicial.
Jenna (nome fictício), da Austrália, tinha 15 anos quando foi alvo do 764 pela primeira vez.
Por mais de dois anos, ela foi ameaçada por membros do grupo.
"Foi horrível", diz a mãe de Jenna, que falou conosco sob condição de anonimato.
"Temos manuais de suicídio que eles enviaram a ela."
O grupo também enviou a Jenna imagens de abuso infantil e animal, e a coagiu a compartilhar fotos explícitas de si mesma e de automutilação diante das câmeras.
A mãe de Jenna nos disse que o grupo fez sua filha se mutilar cada vez mais.
"Mais profundo. Pior. Ela está coberta de cicatrizes."
Por fim, os abusadores ordenaram que Jenna matasse o gato da família, e ela se recusou a obedecer.
"Eles queriam que ela fizesse isso em uma transmissão ao vivo. Tudo explodiu a partir daí. Quando ela se recusou a fazer isso, acho que eles perceberam que estavam perdendo o controle sobre ela", disse a mãe.
Como vingança, os membros do 764 fizeram uma denúncia falsa à polícia, alegando que o pai de Jenna tinha uma arma — uma tática comum, conhecida como "swatting". Policiais australianos armados foram até a casa, aterrorizando a família.
Alguns dos abusadores de Jenna já foram presos e estão cumprindo pena de prisão nos Estados Unidos.
Mas outros ainda estão foragidos. Embora tenha conseguido, em grande parte, cortar relações com o grupo, Jenna continua recebendo mensagens ameaçadoras. A mãe dela ainda está tentando fazer com que as imagens explícitas sejam removidas das plataformas de rede social.
"Passei meses vendo que essas pessoas são capazes de acessar as piores coisas que você poderia imaginar do seu filho. E simplesmente gritando no vácuo — ninguém está ouvindo, ninguém está tirando essas coisas do ar. Como isso ainda está lá? E não é só a minha filha, são muitas crianças."
Jenna ainda está traumatizada por conta das experiências com o grupo.
"Tenha muito cuidado com quem você está falando", ela diz.
"E se acontecer com você, converse com alguém sobre isso."