O menino de 9 anos entre os mortos em ataque a feira de Natal na Alemanha

André Gleissner morreu depois que um carro avançou contra a multidão que fazia compras na feira natalina de Magdeburg.

23 dez 2024 - 08h13
(atualizado às 08h23)

A morte de um menino de nove anos no ataque a uma feira de Natal na Alemanha, na noite da última sexta-feira (20/12), gerou comoção — provocando uma série de homenagens e gestos de solidariedade.

André Gleissner morreu depois que um carro avançou contra a multidão que fazia compras na feira de Natal de Magdeburg, conforme informou o Corpo de Bombeiros local.

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Quatro mulheres ainda não identificadas, de 45, 52, 67 e 75 anos, também morreram no ataque, e pelo menos 200 pessoas ficaram feridas — algumas delas em estado grave.

Uma cerimônia em memória das vítimas foi realizada na catedral da cidade na noite de sábado (21/12), com a presença do chanceler alemão, Olaf Scholz, do presidente do país, Frank-Walter Steinmeier, e da ministra do Interior, Nancy Faeser.

Um suspeito está sendo mantido em prisão preventiva pelas autoridades sob diversas acusações de homicídio, tentativas de homicídio e lesões corporais perigosas.

Bombeiro mirim

Uma postagem nas redes sociais, supostamente atribuída à mãe de André, chamava o menino de "meu ursinho de pelúcia" — e dizia que ele "sempre viverá em nossos corações".

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"André não fez nada a ninguém. Ele só esteve conosco na Terra por nove anos... por quê... por quê? Eu não entendo", ela escreveu.

E concluiu: "Você sempre viverá em nossos corações... eu prometo".

Mapa mostra onde e como aconteceu o ataque
Mapa mostra onde e como aconteceu o ataque
Foto: BBC News Brasil

Outra homenagem a André foi feita pelo Corpo de Bombeiros da cidade vizinha de Schöppenstedt.

Em comunicado, eles afirmaram que o menino era membro da brigada de incêndio mirim de Warle, que fica a cerca de uma hora de carro de Magdeburg.

A brigada de incêndio mirim é uma organização juvenil aberta a crianças de seis a 12 anos interessadas no trabalho dos bombeiros.

"Nossos pensamentos estão com os familiares de André, que também queremos apoiar neste momento difícil", diz o comunicado.

A brigada de incêndio mirim da Baixa Saxônia também prestou uma homenagem a André.

"Nossas condolências vão para sua família, seus amigos e todos que eram próximos a ele", afirmaram em comunicado.

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"Estamos ao lado deles neste momento difícil, e manifestamos nossa mais profunda solidariedade."

Uma campanha de arrecadação de fundos online, supostamente criada para angariar doações para a família de André, recebeu mais de 60 mil euros (R$ 380 mil) até agora.

Muitas pessoas compareceram ao local do ataque para deixar flores em homenagem às vítimas
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Como foi o ataque

Além de provocar cinco mortes, o ataque deixou pelo menos 200 pessoas feridas, sendo algumas em estado grave.

O carro avançou contra o mercado lotado por uma via de acesso para veículos de emergência por volta das 19h (horário local) de sexta-feira, segundo a polícia.

Testemunhas contaram como conseguiram escapar do carro se jogando para fora da via, fugindo ou se escondendo. Imagens não verificadas publicadas nas redes sociais mostram o veículo passando em alta velocidade por uma passagem para pedestres entre as barracas.

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A polícia informou que o motorista posteriormente retornou à rodovia, e foi forçado a parar no trânsito, onde foi preso.

Cerca de 100 policiais, médicos e bombeiros compareceram ao local do ataque para atender as vítimas, segundo autoridades municipais.

Os serviços de emergência montaram tendas no local para atender os feridos
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Quem é o suspeito

O suspeito foi identificado pela imprensa local como Taleb al-Abdulmohsen, de 50 anos, um psiquiatra nascido na Arábia Saudita que chegou à Alemanha em 2006.

O motivo do ataque ainda não está claro, mas as autoridades dizem acreditar que o motorista agiu sozinho.

Al-Abdulmohsen chegou à Alemanha em 2006 — e foi reconhecido como refugiado em 2016, após se declarar ateu e pedir asilo.

Ele administrava um site destinado a ajudar outros ex-muçulmanos a fugir da perseguição em seus países de origem.

De acordo com a imprensa local, o suspeito trabalhava desde março de 2020 como psiquiatra em uma clínica especializada na reabilitação de criminosos dependentes de drogas em Bernburg, a cerca de 40 quilômetros ao sul da cidade onde ocorreu a tragédia.

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"Desde o fim de outubro de 2024, ele tem estado ausente por motivo de férias e doença", informou o centro de saúde em comunicado.

A agência de notícias Reuters publicou que o suspeito morava em uma rua tranquila no centro de Bernburg, uma cidade de 30 mil habitantes, em um prédio de três andares.

A polícia alemã revistou a casa do suspeito
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Uma autoridade que falou sob condição de anonimato com o jornal americano Washington Post disse que a polícia estava revistando a casa do suspeito — e acreditava que ele poderia estar sob a influência de drogas no momento do ataque.

Possíveis motivações

O suspeito não tem vínculos conhecidos com o extremismo islâmico. Na verdade, suas redes sociais e publicações parecem sugerir que ele criticava o Islã.

Em um documentário da BBC de julho de 2019, ele aparece falando sobre a criação da plataforma wearesaudis.net, por meio da qual apoiava outros ex-muçulmanos perseguidos.

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Nestas entrevistas, segundo a Reuters, o suspeito criticava fortemente o Islã. Além disso, em junho do mesmo ano, ele disse ao jornal alemão FAZ: "Não existe Islã bom".

A ministra do Interior, Nancy Faeser, não quis comentar sobre as motivações ou afiliações políticas de al-Abdulmohsen, mas reconheceu que sua islamofobia era bastante "evidente".

Já o procurador local de Magdeburg, Horst Nopens, afirmou que um possível fator no ataque pode ter sido a "insatisfação do suspeito com o tratamento dado aos refugiados sauditas na Alemanha".

"Ele é uma pessoa psicologicamente perturbada com um senso exagerado da sua própria importância", disse Taha Al-Hajji, diretor jurídico da Organização Saudita Europeia para os Direitos Humanos, com sede em Berlim, à agência de notícias AFP.

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"Não se trata de forma alguma de um ataque com motivação islâmica", acrescentou.

A polícia coletou evidências do carro usado pelo suspeito
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Hajji disse à AFP que, apesar do apoio que dava aos sauditas que solicitavam asilo na Alemanha, al-Abdulmohsen era considerado "um pária" naquela comunidade.

A mesma agência de notícias informou que, em agosto passado, o suspeito publicou uma mensagem perturbadora nas redes sociais.

"Existe um caminho para a justiça na Alemanha sem explodir uma embaixada alemã ou massacrar aleatoriamente cidadãos alemães? Estou procurando um caminho pacífico desde janeiro de 2019, e não o encontrei. Se alguém souber, por favor, me avise."

Na mesma postagem, ele questionou o que considerava "crimes cometidos pela Alemanha contra refugiados sauditas e obstrução da justiça, por mais provas que fossem apresentadas".

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De acordo com a imprensa local, os perfis de Al-Abdulmohsen nas redes sociais também oferecem algumas pistas sobre suas afiliações políticas e ideológicas.

Em várias de suas publicações, ele manifestou apoio ao partido de direita radical anti-imigração Alternativa para a Alemanha (AfD).

Além disso, de acordo com a Reuters, o suspeito tornou público seu apoio a ideias defendidas pelo bilionário americano Elon Musk, que tem sido um crítico do chanceler alemão, Olaf Scholz.

Advertências prévias

As autoridades alemãs estão enfrentando uma série de questionamentos em relação à segurança após ter sido divulgado que foram avisadas no ano passado de que o suspeito poderia representar uma ameaça.

O Ministério das Relações Exteriores saudita afirmou que alertou o governo alemão sobre as visões extremistas de al-Abdulmohsen, mas não obteve resposta.

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Mais tarde, o chefe do Departamento Federal de Polícia Criminal (conhecido como BKA), Holger Münch, disse à emissora pública ZDF que seu escritório havia recebido uma notificação da Arábia Saudita em novembro de 2023. Ele afirmou que a polícia local havia tomado as medidas investigativas apropriadas, mas o assunto não era específico.

E acrescentou que o suspeito "havia tido vários contatos com autoridades, as insultou e até fez ameaças, mas não era conhecido por atos violentos".

Segundo ele, as investigações anteriores precisariam ser revisadas.

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