A Rússia passou anos se preparando para este momento.
Em 2014, quando tropas russas entraram na Crimeia, anexando parte da Ucrânia, isto provocou uma primeira rodada de sanções internacionais. Este período ensinou a Moscou uma importante lição: estar preparado para esse tipo de retaliação.
Desde então, a Rússia vem reforçando sua defesa, reduzindo a dependência do dólar e tentando tornar sua economia à prova de sanções.
O presidente Vladimir Putin pode estar contando que vai suportar sanções por mais tempo do que o Ocidente supõe.
Reservas internacionais
Em janeiro deste ano, as reservas internacionais do governo russo, em moeda estrangeira e ouro, chegaram a níveis recordes, valendo mais de US$ 630 bilhões.
Essa é a quarta maior reserva do mundo e poderia ser usada para ajudar a sustentar a moeda da Rússia, o rublo, por um tempo considerável.
Notavelmente, apenas cerca de 16% das divisas da Rússia são atualmente mantidas em dólares, abaixo dos 40% de cinco anos atrás. Cerca de 13% é composto por renminbi chinês.
Tudo isso foi projetado para proteger a Rússia o máximo possível das sanções, lideradas pelos Estados Unidos.
A 'fortaleza Rússia'
Também foram desenvolvidas outras mudanças na estrutura da economia russa.
Com o tempo, o país reduziu sua dependência de empréstimos e investimentos estrangeiros e tem buscado ativamente novas oportunidades comerciais fora dos mercados ocidentais.
A China é uma grande parte dessa estratégia.
O governo de Moscou também deu os primeiros passos para criar seu próprio sistema de pagamentos internacionais, caso seja cortado do Swift - um serviço global de informações financeiras que é supervisionado pelos principais bancos centrais ocidentais.
A Rússia também vem reduzindo o tamanho de seu orçamento, priorizando a estabilidade sobre o crescimento. Isso significa que a economia do país cresceu em média menos de 1% ao ano na última década, mas pode ter se tornado mais autossuficiente no processo.
"O que a Rússia está fazendo, na verdade, é construir quase um sistema financeiro alternativo para que consiga resistir a alguns dos choques de sanções que o Ocidente pode impor", diz Rebecca Harding, presidente-executiva da consultoria Coriolis Technologies.
"Mas tudo isso trará alguma dor no curto prazo, e o sistema russo tem a vulnerabilidade de ter uma rede pouco espalhada no mundo. "
Interesses estratégicos
Certamente Moscou pode estar entrando em um jogo perigoso. Sanções aos principais bancos russos, principalmente os estatais, seriam prejudiciais.
Mas o presidente Putin pode estar calculando que os EUA, o Reino Unido e a União Europeia têm interesses estratégicos ligeiramente diferentes a serem considerados.
É obviamente mais fácil para alguns países impor sanções à indústria russa de petróleo e gás do que a outros. A União Europeia como um todo obtém 40% do gás natural da Rússia; o Reino Unido recebe cerca de 3%.
A decisão da Alemanha de suspender a certificação do gasoduto Nord Stream 2, portanto, é prejudicial para a Rússia, mas também terá um impacto direto nos preços da energia na Europa Ocidental.
Mirando os oligarcas
Desde 2014, uma outra estratégia dos países ocidentais é restringir o acesso de oligarcas russos ao seu patrimônio.
Segundo a professora Tomila Lankina, da London School of Economics (Reino Unido), essas experiências passadas "não foram suficientemente longe".
"Mudanças só acontecerão se eles forem alvo em uma escala muito maior", explica Lankina.
O presidente Putin não mantém dinheiro e outros ativos no exterior em seu próprio nome por razões óbvias, mas uma rede de apoiadores ultrarricos faz isso por ele.
Londres é um foco em especial, pois tem uma rede estabelecida há muito tempo de empresas de fachada, portfólios de propriedades e influência política.
O governo do Reino Unido anunciou recentemente novas sanções contra indivíduos específicos, mas o grupo anticorrupção Transparência Internacional diz que há cerca de 1,5 bilhão de libras (mais de R$ 10 bilhões) em dinheiro russo investido apenas em propriedades de Londres, grande parte de fundos mantidos em paraísos offshore.
"Os governos ocidentais não estão apenas falhando com o povo russo ao permitir que isso aconteça, eles também estão falhando com seu próprio povo", aponta a professora Lankina, destacando os efeitos que tais sanções podem ter nos países de origem.
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