O que já começa a mudar para mulheres com Talebã no poder no Afeganistão

A tomada da capital afegã pelo Talebã gera desconfiança na população, sobretudo nas mulheres, que temem perder os direitos conquistados nos últimos 20 anos.

17 ago 2021 - 08h07
(atualizado às 08h29)
Mulheres caminham em Cabul em 15 de agosto
Mulheres caminham em Cabul em 15 de agosto
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

A chegada do Talebã a Cabul, capital do Afeganistão, despertou medo nos cidadãos, principalmente nas mulheres.

Com o retorno do grupo fundamentalista islâmico ao poder após 20 anos, as afegãs temem perder os direitos sociais e econômicos que conquistaram nas últimas duas décadas.

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O Talebã impõe uma interpretação radical e estrita da lei islâmica que restringe severamente os direitos das mulheres.

A seguir, algumas das mudanças já observadas em Cabul em relação às mulheres nos primeiros dias após a volta do Talebã.

Sem mulheres na TV

Os principais canais de televisão do Afeganistão continuaram suas transmissões depois que o Talebã assumiu o poder.

No entanto, há diferenças notáveis, como o fato de não haver mais apresentadoras mulheres, de acordo com a BBC Monitoring.

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Também foi observado um grande aumento nos comentários favoráveis ao Talebã, em paralelo a muito poucas críticas ao grupo, em canais como a TV estatal National Afghanistan e as redes privadas Tolo News, Ariana, Shamshad e 1TV.

Clérigos islâmicos ocupam espaço nas redes de tv afegãs
Foto: Shamshad TV / BBC News Brasil

A televisão estatal, cuja direção está nas mãos do Talebã desde a noite de 15 de agosto, tem transmitido em sua maioria programas religiosos.

Já grande parte da grade de programação da Tolo News e da 1TV tem repetido programas transmitidos aos domingos, possivelmente devido a dificuldades de trabalho.

No entanto, Saad Mohseni, dono do Moby Group, que inclui a Tolo TV e a Tolo News TV, declarou em um tuíte: "Posso garantir que nossa equipe está bem e que continuamos com nossa transmissão ininterrupta durante essa 'transição'".

O Moby Group é o maior gerador de programas de entretenimento, notícias e atualidades do Afeganistão.

Enquanto isso, a TV Shamshad, de propriedade de um ex-assessor presidencial, estava transmitindo conteúdo pró-Talebã.

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Em um dos programas, o correspondente do canal mostrou moradores de Cabul comemorando que o grupo traria segurança e unidade ao país.

Nem vestidos, nem maquiagem

Após o avanço do Talebã no Afeganistão, muitos direitos sociais e econômicos conquistados nos últimos 20 anos chegaram ao fim de repente, disseram vários cidadãos afegãos à BBC.

Nas ruas de Cabul, até poucos dias atrás, era possível ver anúncios de mulheres maquiadas
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

E denúncias de restrição às liberdades das mulheres não são exceção.

"Há muitas restrições agora. Quando eu saio, tenho que usar burca (traje que cobre completamente o corpo da mulher, com uma treliça estreita à altura dos olhos), conforme ordenado pelo Talebã, e um homem precisa me acompanhar", conta uma parteira de Ishkamish, distrito rural com serviços escassos na província de Takhar, na fronteira nordeste do Afeganistão com o Tajiquistão.

Mulheres temem perda de direitos; uma delas disse que tiraria a própria vida a ter casamento forçado com combatente do Talebã
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Nos primeiros dois dias após a chegada do Talebã a Cabul, as ruas da capital também começaram a dar sinais dessas mudanças restritivas para as mulheres.

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Fotos nas redes sociais mostram que vitrines com imagens de mulheres sem véu, maquiadas e com vestidos de festa estavam sendo arrancadas ou cobertas de tinta.

'Não sei como será o nosso futuro'

Muitas mulheres em Cabul sentem medo e falta de esperança.

Uma jovem, que preferiu não se identificar, descreveu a cidade como "silenciosa". O Talebã governa a capital e todos estão em casa, disse ela à BBC.

"Eu tinha muitos planos para o meu futuro, mas agora não posso trabalhar nem ir para a universidade", acrescentou.

"Não sei como será nosso futuro. Isso me fez perder a esperança. Estou procurando uma maneira de sair do Afeganistão porque não há esperança para as mulheres."

Com a volta do Talebã ao poder no Afeganistão, as mulheres temem perder os direitos conquistados nos últimos 20 anos
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Aisha Ahmad, que estuda ciência da computação na Universidade de Cabul, acabou agredida no domingo junto à multidão que tentava pegar um voo para fugir do país no Aeroporto Internacional Hamid Karzai, na capital.

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"A multidão foi empurrada pela polícia, crianças e mulheres estavam no chão, machuquei minhas mãos, pés e joelhos", contou a jovem de 22 anos à agência de notícias PA.

Depois de não conseguir embarcar, Ahmad fez um apelo nas redes sociais para que algum país conceda asilo a ela para que possa terminar seus estudos, o que ela não acredita mais ser possível.

"Perdi as esperanças e acho que não será um caminho fácil", disse ela.

"Sinto como se estivesse em um túnel... Não consigo ver nenhuma luz brilhante e não sei qual é o comprimento do túnel."

Mahbouba Seraj, ativista pelos direitos das mulheres e crianças em Cabul, disse à BBC que não serviria a ninguém se todas as mulheres deixassem o país, acrescentando que ela está disposta a dialogar e trabalhar com o Talebã.

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"Se as mulheres do Afeganistão, as que estão envolvidas e temos trabalhado, pudessem se sentar à mesa e conversar com essas pessoas (os militantes), eles poderiam ser inteligentes e se conscientizar sobre os recursos que têm com as mulheres do Afeganistão", declarou.

"Porque antes disso, antes do Talebã, nem o mundo nem nossa própria república via realmente a força da mulher afegã."

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