O 'sacrifício' de candidatos de esquerda e centro para barrar direita radical na França

Mais de 200 candidatos de esquerda e centro resolveram desistir do segundo turno para reforçar chances da oposição de derrotar a direita radical.

3 jul 2024 - 14h09
Os resultados do primeiro turno realizado no domingo 30 de junho, produziram centenas de disputas de segundo turno entre três candidatos
Os resultados do primeiro turno realizado no domingo 30 de junho, produziram centenas de disputas de segundo turno entre três candidatos
Foto: GETTY IMAGES / BBC News Brasil

O prazo para confirmação de candidaturas para o segundo turno das eleições legislativas francesas a ser realizado no próximo domingo (7/7) terminou nesta terça-feira (3/7), com um grande número de candidatos de esquerda e de centro deixando de concorrer numa tentativa de bloquear uma possível vitória do Reunião Nacional, de direita radical.

Segundo o sistema eleitoral que regula as eleições para a Assembleia Nacional francesa, passam para o segundo turno todos os candidatos que conseguirem assegurar mais de 12,5% dos votos no primeiro turno.

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Sem que tenha sido divulgada uma lista oficial, a mídia francesa estima que entre 214 e 218 candidatos, que chegaram em terceiro lugar em seus distritos eleitorais. desistiram da disputa.

Assim, os grupos de centro e de esquerda esperam que nestes distritos, o RN passe a enfrentar um oponente (segundo lugar no primeiro turno) mais fortalecido, capaz de aglutinar os votos conseguidos também pelos candidatos que chegaram em terceiro lugar no pleito de domingo passado (30/7) e que agora retiraram a candidatura.

Isso significa que agora a disputa com três candidatos se resumirá a apenas 108 distritos eleitorais (em dois distritos a disputa reunirá 4 candidatos), comparados a pouco mais de 300 no primeiro turno.

A estratégia de retirada em massa de candidaturas é uma tentativa de aumentar a chance da oposição ao RN — grande vencedor do primeiro turno — já que candidatos de centro e de esquerda deixariam de dividir entre eles a preferência dos eleitores.

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Marine Le Pen e Jordan Bardella: direita radical conseguiu votação expressiva no primeiro turno com agenda focada no controle de imigração
Foto: GETTY IMAGES / BBC News Brasil

O primeiro turno do último domingo produziu uma grande vitória para o RN, partido de Marine Le Pen, que, reforçado por aliados, obteve cerca de 33% dos votos.

A aliança ampla de esquerda — Nova Frente Popular (NPF) — ficou em segundo lugar com cerca de 28% dos votos, e os centristas do presidente Emmanuel Macron em terceiro com pouco menos de 21%.

Mas agora, as chances de Le Pen de conquistar a maioria absoluta na Assembleia Nacional — 289 de um total de 577 assentos — ficam prejudicadas pelas táticas de bloqueio dos adversários.

A NPF — que compreende desde social-democratas de centro-esquerda até anticapitalistas da esquerda radical — orientou todos os seus candidatos que chegaram em terceiro lugar que renunciassem e apoiassem um centrista na briga pelo voto anti-RN.

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Por outro lado, François Ruffin, um candidato pró-Macron renunciou para apoiar o esquerdista radical na tentativa de derrotar o candidato do RN na cidade de Amiens, no norte do país.

O presidente do RN, Jordan Bardella, de apenas 28 anos, condenou a iniciativa dizendo que esses arranjos representam uma "aliança de desonra" entre partidos que até agora estavam brigando um com o outro.

Porém, as orientações para candidatos do bloco centrista de Macron têm sido mais ambíguas do que as do NPF. o que revela um certo desconforto de membros do partido do presidente de se alinhar com a esquerda mais radical, embora o próprio Macron e o primeiro-ministro Gabriel Attal tenham pedido o "não voto para o RN".

Figuras importantes do partido de Macron como o ministro das Finanças, Bruno Le Maire, e o ex-primeiro ministro Edouard Philippe — ambos originários da centro-direita — têm se recusado a pedir votos sistemáticos contra o RN.

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Em terceiro lugar no primeiro turno, partido do presidente da França forja aliança para impedir vitória da direita radical no segundo turno
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

A liderança do RN declarou que o partido não tentará formar um governo a menos que obtenha maioria absoluta no Parlamento. O partido não quer ter um poder apenas aparente sem capacidade de aprovar legislação.

No entanto, na terça-feira, Marine Le Pen pareceu mudar levemente essa orientação ao dizer que uma maioria não absoluta já seria boa o suficiente — se não ficasse muito abaixo do limite de 289 membros (metade + 1).

Falando na rádio francesa, Le Pem disse que com algo em torno de 270 deputados o partido poderia negociar com parlamentares individualmente na esperança de convencê-los a firmar um acordo.

"Vamos dizer a eles: 'Vocês estão prontos para participar conosco na criação de uma nova maioria? Você está pronto para votar uma moção de confiança? Você está pronto para votar a favor do orçamento? '" disse ela.

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Le Pen citou como possíveis aliados deputados independentes de direita e esquerda e parte do Partido Republicano conservador, que obteve 10% dos votos no primeiro turno.

Se o RN conseguir maioria absoluta no domingo, Bardella (ou alguém indicado pela cúpula do RN) seria convidado pelo presidente Macron a formar um governo — e então começaria um período tenso de "coabitação" com dois inimigos políticos compartilhando o poder.

De acordo com a Constituição da Quinta República Francesa, o poder fluiria de Macron para o gabinete do primeiro-ministro porque "o governo determina e conduz a política da nação".

No entanto, Macron provavelmente procuraria manter o controle nas áreas de política externa e defesa, que, por precedentes — já que não está previsto na constituição - permaneceram na alçada do presidente em coabitações anteriores.

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Marine Le Pen também acusou o presidente na terça-feira de dar um "golpe administrativo de Estado " quando soube que Macron estaria preparando várias nomeações importantes na polícia e no Exército poucos dias antes da votação.

"Quando você quer contrariar os resultados de uma eleição nomeando seus aliados para cargos, e quando isso impede que [o governo] seja capaz de executar as políticas que o povo francês exige... isso é um golpe de Estado administrativo", disse ela.

"Espero que seja só um boato", acrescentou.

Esta reportagem foi traduzida e revisada por nossos jornalistas utilizando o auxílio de IA na tradução, como parte de um projeto piloto.

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