'Parece que só fugimos de uma morte para outra': o relato de repórter da BBC que obedeceu ordem de evacuação em Gaza

Um repórter da BBC e a sua família deixaram o norte de Gaza após a ordem de evacuação feita por Israel. Agora, depois dos bombardeios no Sul, eles estão novamente em movimento.

19 out 2023 - 08h12
(atualizado às 08h46)
Uma pomba voa sobre os escombros de casas em Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza
Uma pomba voa sobre os escombros de casas em Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Adnan Elbursh, repórter do serviço em árabe da BBC, e a família dele tiveram que se mudar de casa mais de uma vez — depois de já terem obedecido a ordem dada por Israel a mais de um milhão de residentes para evacuar o norte de Gaza.

Confira a seguir o relato do jornalista:

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Nós deixamos Jabalia, no norte de Gaza, na sexta-feira, 13 de Outubro, depois de Israel ter ordenado que os residentes evacuassem a área. Israel descreveu o sul como uma área segura do ponto de vista humanitário, então minha esposa, minhas quatro filhas, meu filho e eu fomos para a cidade de Khan Younis.

Agora estamos no sul. Vi colunas de fumaça e ouvi explosões. Fontes oficiais e testemunhas oculares me disseram que casas foram atingidas por ataques aéreos e famílias acabaram mortas.

Junto com meu irmão e a família dele, conseguimos encontrar um apartamento para ficar que achamos seguro. Éramos 12 pessoas hospedadas no local, que tinha dois quartos e um banheiro. Não havia água, eletricidade ou quaisquer outras instalações.

Mas logo fomos aconselhados a partir.

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Disseram-nos que o exército israelense entrou em contato o proprietário do edifício para dizer que o local seria bombardeado. Eles afirmaram que o dono do prédio era procurado por uma associação com o Hamas.

Pouco depois do meio-dia, eu estava fazendo filmagens para uma reportagem da BBC. Minha família e a família do meu irmão foram retiradas às pressas. Eles não puderam levar nenhum dos pertences que havíamos trazido do norte de Gaza e fugiram rapidamente, sem saber qual direção seguir.

O prédio vizinho foi bombardeado enquanto eles fugiam. Felizmente, ninguém se feriu.

Adnan Elbursh, repórter da BBC
Foto: BBC News Brasil

Agora minha família e eu estamos sem teto. Não sabemos para onde ir. Fui dominado pelo pânico e pelo medo. Alguém sugeriu que fôssemos ao prédio do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho em Khan Younis. Lá até poderia ser seguro, mas o local já está superlotado — os corredores e os quartos estão cheios de gente.

Não sei o que fazer. Pergunto-me constantemente se devemos voltar à nossa casa no norte de Gaza — que é uma escolha perigosa — ou permanecer no sul — que também não é seguro.

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Parece que só fugimos de uma morte para outra. Não há um único centímetro seguro em Gaza.

Sem ter onde dormir dentro de casa, passamos a noite ao ar livre, em um parque perto do prédio do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho. Foi incrivelmente duro. Uma sensação de impotência me assombrou.

Minha esposa, meus filhos, os filhos do meu irmão e a esposa dele estavam deitados no chão. Foi uma visão terrível. Eles não tinham nada para se cobrir. Espalhamos pedaços de papelão e sentamos sobre eles.

O tempo ficou extremamente frio naquela noite e estávamos congelando, principalmente as crianças. Pegamos alguns cobertores emprestados das pessoas ao nosso redor para cobrir as crianças e ficamos acordados a noite toda, sem dormir.

Na manhã seguinte, decidi levar a minha família para ficar com um amigo que está no campo de Nuseirat, no meio da Faixa de Gaza.

Pouco antes de chegarmos, vários ataques aéreos atingiram uma padaria perto da região. Uma testemunha ocular me disse que os foguetes foram lançados pela força aérea israelense. Eles disseram que centenas de pessoas fizeram fila para comprar pão devido à escassez de alimentos. Com os bombardeios no local, pessoas foram mortas. Foi extremamente horrível e perigoso.

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O Ministério da Saúde palestino afirma que os ataques iraelenses em Gaza causaram 3,5 mil mortes e 12,5 mil feridos até o momento. O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, apelou a um cessar-fogo humanitário imediato para aliviar o "sofrimento humano épico".

O bombardeio de Israel é uma resposta ao ataque dos militantes do Hamas, que matou pelo menos 1,3 mil pessoas no dia 7 de outubro. Outros 199 indivíduos foram feitos reféns.

Os militares israelenses disseram na manhã de terça-feira (17/10) que atacaram centros de comando operacional, infraestrutura militar e esconderijos do Hamas em Khan Younis e em Rafah, que ficam no sul de Gaza, bem como em duas áreas ao norte.

Mas, para mim e para a minha família, o som dos aviões militares é alto e assustador. Minha família está no campo de Nuseirat. Eu estou em Khan Younis. Não sei onde passarei esta noite. Realmente não sei para onde ir.

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