Na pequena cidade chinesa de Yanji, a terra tremeu neste domingo.
Logo, blogueiros locais começaram a postar nas redes sociais imagens de cômodos e coisas sacudindo.
O que as pessoas nessa região - em que o coreano é quase uma língua dominante por causa da proximidade da fronteira da China com a Coreia do Norte - não sabiam é que o terremoto era "artificial".
E, não muito longe dali, em Pyongyang, horas depois, o regime norte-coreano anunciou o bem-sucedido teste nuclear com uma bomba de hidrogênio - segundo a análise dos sismógrafos, a mais potente já detonada pelo país.
O timing de tudo isso foi uma bofetada em Pequim, o grande aliado do sistema totalitário liderado por Kim Jong-un.
Isso porque o teste ocorreu no mesmo dia em que o presidente chinês, Xi Jinping, faria o discurso de abertura da reunião dos Brics, em Xiamen.
Ainda que não seja possível provar que a Coreia do Norte escolheu de propósito o dia de abertura de um evento diplomático de porte para fazer o controverso teste, o país certamente não viu a necessidade de adiá-lo para evitar ofender a China.
E, certamente, a nova "coincidência" não vai fazer favores às relações estremecidas com Xi Jinping.
Em março, pouco antes de o presidente chinês encontrar-se em Pequim com o secretário de Estado dos EUA, Rex Tillerson, Pyongyang anunciou o teste de um míssil.
Lista de "coincidências"
Dois meses depois, quando Xi Jinping se preparava para abrir um fórum reunindo líderes de diversas nações para discutir possíveis investimentos, os norte-coreanos novamente fizeram um disparo. Que isso tenha voltado a acontecer neste domingo é algo incrível.
E Xi Jinping, que também acumula o cargo de presidente da Comissão Militar Central da China, não deve estar nem um pouco contente com esse padrão.
Os norte-coreanos, por sua vez, andam furiosos com seu aliado. A China não somente apoiou as sanções contra Pyongyang no Conselho de Segurança da ONU como ainda liderou medidas punitivas como a suspensão da importação de carvão - Pequim é também o principal parceiro comercial do país.
Troco
A realidade é que, se realmente quisesse, a China poderia colocar a economia do vizinho de joelhos. Poderia interromper o fornecimento de óleo e gás a Pyongyang, por exemplo.
Sem falar nos bancos: acredita-se que a Coreia do Norte "lava" muito dinheiro usando instituições financeiras chinesas. E o governo chinês, que certamente sabe disso, poderia fechar a torneira amanhã se quisesse.
E por que não fecha? Há uma razão simples: por mais que não curta a instabilidade regional provocada pelo programa nuclear norte-coreano, a China tem mais medo de um colapso do regime norte-coreano. Mas especificamente de uma Coreia reunificada e dominada pelo vizinho mais rico do Sul.
O mesmo vizinho apoiado pelos Estados Unidos, e que poderia deixar que tropas americanas se instalassem bem pertinho da fronteira chinesa. Por isso, Pequim vai aturar muito mais "estripulias" da Coreia do Norte para evitar esse cenário.
O Ministério do Meio Ambiente da China anunciou neste domingo que vai realizar testes de emergência para analisar os níveis de radiação ao longo da fronteira para ser se o território chinês foi contaminado pela detonação nuclear.
O órgão das Relações Exteriores emitiu uma nota de desagravo, mas o governo enfrenta mais e mais pedidos para exercer mais pressão sobre Kim Jong-un para que Pyongyang abandone o programa de mísseis intercontinentais. Pressões que vem inclusive dos escalões mais altos do Partido Comunista Chinês.
O problema é que o líder norte-coreano fez do programa nuclear a marca registrada de sua administração, e fica difícil ver que oferta ou ameaça pode mudar a situação.
A não ser que Washington e Pequim façam um acordo secreto que preveja a retirada das tropas americanas da Península Coreana - onde estão estacionadas desde os anos 50 - em caso de uma reunificação.
Isso, sim, poderia mudar tudo.