Por que foto de Trump ensanguentado e com bandeira dos EUA é tão poderosa

A imagem de Evan Vucci já pode ser considerada simbólica - e demonstra como as formas fotográficas de observação se estendem para além da composição.

16 jul 2024 - 04h18
(atualizado às 07h30)
Os momentos posteriores à tentativa de assassinato de Donald Trump foram extensamente documentados pelos fotojornalistas
Os momentos posteriores à tentativa de assassinato de Donald Trump foram extensamente documentados pelos fotojornalistas
Foto: AP Photo/Evan Vucci / BBC News Brasil

A tentativa de assassinato de Donald Trump em um comício na Pensilvânia, nos Estados Unidos, foi registrada por diversos fotógrafos que estavam no palco antes do início dos disparos.

A fotografia mais divulgada do evento foi tirada pelo fotógrafo de guerra Evan Vucci, vencedor do Prêmio Pulitzer. Ele é conhecido pela sua cobertura dos protestos que se seguiram ao assassinato de George Floyd, em 2020.

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Diversos prêmios World Press Photograph já foram concedidos a fotógrafos que cobriram assassinatos.

Nesta linha, a imagem de Vucci também já pode ser considerada simbólica. É uma foto que talvez ganhe prêmios pelo seu conteúdo, uso de cores e enquadramento - e irá se tornar uma parte importante dos registros deste momento histórico na nossa memória.

Análise da imagem nas redes sociais

As pessoas que observaram a fotografia de Vucci foram às redes sociais para analisar a composição da imagem, incluindo como motivos icônicos como a bandeira americana e o punho erguido de Trump são reunidos no enquadramento, segundo as normas da composição fotográfica, como a regra dos terços.

Acredita-se que estes elementos contribuam para o poder daquela imagem. E, para entender exatamente o que torna essa foto tão poderosa, existem diversos elementos que precisam ser analisados.

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Acuidade da composição

Nesta fotografia, Vucci está olhando para cima com sua câmera.

Ele faz Trump aparecer em posição elevada, como a figura central rodeada por agentes do Serviço Secreto, que protegem seu corpo. Os agentes formam uma composição triangular que coloca Trump como vértice, levemente à esquerda de uma bandeira americana elevada no céu.

Imediatamente à direita de Trump, um agente olha diretamente para a lente de Vucci, com os olhos ocultos pelos óculos escuros.

O agente nos chama para dentro da imagem. Ele olha na nossa direção e observa o fotógrafo. Por isso, ele parece olhar para nós - ele espelha a nossa visão da fotografia.

Esta figura é central e leva o nosso olhar para o punho erguido de Trump.

Sua longa carreira como fotojornalista levou Evan Vucci a entender a importância de conseguir o disparo no momento certo
Foto: AP Photo/Evan Vucci / BBC News Brasil

Outro ponto interessante é que existem fortes elementos coloridos nesta imagem, que criam a ilusão de se reunirem para formar a fotografia.

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Contra o fundo do céu azul claro, tudo o mais na imagem é vermelho, branco e azul-marinho. As gotas de sangue que caem pelo rosto de Trump combinam com as listras vermelhas da bandeira americana, alinhadas com o vermelho republicano do pódio, no quadrante inferior esquerdo da imagem.

Podemos não observar estes elementos inicialmente, mas eles demonstram como certas convenções fotográficas colaboram com a própria forma de observação e composição de Vucci, alinhadas às normas do fotojornalismo.

Forma fotográfica de observação

Em suas entrevistas, Vucci faz referência à importância de sempre manter o senso de composição fotográfica para poder "capturar" a imagem, para ter certeza de cobrir a situação de diversos ângulos, incluindo a captura da cena com a luz e a composição correta.

Para Vucci, tudo isso faz parte do trabalho do fotógrafo.

As declarações de Vucci são consistentes com o que a maioria dos fotógrafos consideraria uma forma fotográfica de observação. Isso significa estar sintonizado com a forma em que a composição, a luz, o momento e o assunto se combinam no quadro em perfeita união durante a fotografia: significa conseguir o disparo "correto".

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Para a escritora americana Susan Sontag, esta forma fotográfica de observação também corresponde ao relacionamento entre o tiro e a fotografia, que ela considerava atividades análogas.

A fotografia e os revólveres, sem dúvida, são armas. A fotografia e as formas fotográficas de ver e representar o mundo são armas capazes de alterar a percepção do público.

Fazer história com fotografias

Como forma fotográfica de observação, existem ressonâncias familiares entre a fotografia de Vucci e outras imagens simbólicas da história americana.

Um exemplo é a fotografia de Joe Rosenthal, Raising of the Flag on Iwo Jima ("Hasteando a bandeira em Iwo Jima", 1945), durante a Guerra no Pacífico.

Quatro fuzileiros navais se reúnem na imagem para erguer e fixar a bandeira americana. Seus corpos formam uma estrutura de pirâmide na parte inferior central do quadro.

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Esta fotografia também é representada como monumento de guerra no Estado americano da Virgínia, em homenagem aos fuzileiros navais que serviram aos Estados Unidos.

Existem fortes coincidências visuais entre as imagens de Rosenthal e de Vucci. Elas também demonstram como as formas fotográficas de observação se estendem para além da composição.

As imagens conduzem para outra forma fotográfica de observação, que significa observar o mundo e os eventos que nele ocorrem como fotografias, ou construir a história como se ela própria fosse uma fotografia.

Ficções e pós-verdade

O inerente paradoxo da "observação fotográfica" é que nenhuma pessoa pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo, nem prever o que irá acontecer, até que a realidade possa ser transcrita em uma fotografia.

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Na imagem de Vucci, temos a ilusão de que aquela fotografia captura "o momento" ou "um disparo". Ocorre que ela não captura o momento do tiro, mas seu desdobramento imediato.

O fotógrafo mostra a acuidade midiática de Trump e sua rápida reação à tentativa de assassinato, quando ele se levanta e ergue seu pulso no ar.

Na pós-verdade do mundo atual, existe uma preocupação permanente de conhecer a verdade. E, embora isso se estenda além da representação fotográfica, a fotografia e a representação visual desempenham papel importante.

Precisaremos aguardar para saber se esta imagem irá contribuir para o mito em torno de Donald Trump e sua possível reeleição.

*Sara Oscar é professora de comunicação visual da Faculdade de Design da Universidade de Tecnologia de Sydney, na Austrália.

Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Leia aqui a versão original em inglês.

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