Por que 'pausa' militar em Gaza gerou divisões em Israel

O anúncio de uma 'pausa tática local' nos combates desencadeou uma resposta furiosa de ministros mais radicais do governo israelense.

16 jun 2024 - 13h33
(atualizado às 13h38)
Mulheres andam nos escombros de uma loja de roupas destruída em um prédio residencial atingido por bombardeios israelenses, no bairro de Daraj, na cidade de Gaza, em 14 de junho de 2024, em meio ao conflito em curso entre Israel e o Hamas
Mulheres andam nos escombros de uma loja de roupas destruída em um prédio residencial atingido por bombardeios israelenses, no bairro de Daraj, na cidade de Gaza, em 14 de junho de 2024, em meio ao conflito em curso entre Israel e o Hamas
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Quando é que um cessar-fogo não é um cessar-fogo? Segundo o exército israelense, quando se trata de uma "pausa local e tática da atividade militar para fins humanitários".

O coordenador de ajuda humanitária de Israel para Gaza divulgou os detalhes da pausa diária programada nos combates, que vai acontecer entre 8h e 19h, no horário local, ao longo de uma rota importante que segue para norte a partir do ponto de passagem de Kerem Shalom — onde os suprimentos aguardam sinal verde para serem entregues.

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O anúncio desencadeou quase imediatamente um furioso ataque político por parte de ministros mais radicais que integram o governo — e uma rápida defesa do exército de Israel, que insiste que a medida não indica o fim dos combates no sul de Gaza, ou qualquer alteração na entrada de ajuda humanitária.

O fato de este anúncio ter se revelado tão explosivo realça a situação cada vez mais tensa do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, que se encontra numa encruzilhada.

De um lado, estão os custos dos vagos — e até agora inatingíveis — objetivos de desmantelar o Hamas e trazer para casa os reféns. Do outro, os aliados políticos de quem depende para permanecer no poder.

As agências ainda precisarão acertar os processos com o exército israelense. O diretor do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas em Gaza, Matt Hollingworth, disse que os testes mostrarão se essa coordenação se tornaria mais suave e rápida a partir de agora.

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Mas ele também entende que a coordenação é apenas uma parte dos obstáculos enfrentados pelas agências que tentam levar ajuda a Gaza.

Segundo ele, o anúncio da pausa "não resolve a questão da insegurança e da criminalidade".

"E esta é a área mais perigosa da Faixa de Gaza neste momento para a movimentação de ajuda humanitária", complementa Hollingworth.

As agências informaram no fim de semana que a guerra contínua gera desnutrição aguda em algumas partes de Gaza.

Israel está sob pressão — de organizações, de aliados e do próprio Tribunal Superior do país — para garantir mais ajuda a Gaza.

Mas Netanyahu enfrenta forte oposição de dois colegas de gabinete, que dizem que derrubarão o governo se ele concordar em acabar com a guerra. Ambos consideram que a entrega de ajuda atrasa a vitória de Israel.

Eles reagiram furiosamente ao anúncio de pausa feito neste domingo (16/6). O Ministro da Segurança Interna, Itamar Ben-Gvir, classificou "quem tomou esta decisão" como "malvado" e "um tolo".

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Já o Ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, disse que a ajuda humanitária permite manter o Hamas no poder e corre o risco de levar "as conquistas da guerra pelo ralo".

O fato de o exército poder emitir esta mensagem num dia em que Israel enterrava onze dos seus soldados, disse Smotrich, era um sintoma de que a liderança dá demasiado peso à opinião internacional e não considera suficiente a situação das forças no terreno.

Os dois políticos ameaçaram derrubar o governo de coligação de Netanyahu se ele acabar com a guerra, como querem os Estados Unidos.

Mas a pressão sobre os custos da guerra também aumenta. O conflito paralelo de Israel com o Hezbollah no Líbano se intensificou nos últimos dias, realçando os riscos mais amplos de continuar a guerra com o Hamas.

Em Israel, milhares de pessoas fizeram um protesto em que apelam ao gabinete de guerra para trazer os reféns de volta para casa
Foto: EPA / BBC News Brasil

Na noite de sábado (15/6), grandes multidões protestaram em Tel Aviv. As pessoas pediam que Netanyahu colocasse um fim ao conflito em Gaza e assinasse um acordo para trazer os 120 reféns israelenses de volta.

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Os funerais de onze soldados, mortos em Gaza no fim de semana, colocam de novo o foco nos questionamentos sobre se os objetivos de guerra declarados pelo primeiro-ministro podem ser alcançados de fato.

Netanyahu prometeu uma "vitória total" contra o Hamas. Ele enquadrou a atual operação em Rafah como um ataque aos últimos batalhões restantes do grupo em Gaza — algo necessário para destruí-la, segundo a avaliação dele.

Mas é claro que mesmo o desmantelamento do Hamas como organização militar estruturada não significa o fim total do conflito.

As forças israelenses ainda enfrentam operações de guerrilha levadas a cabo por combatentes do Hamas em áreas que já estão teoricamente controladas.

E não há sinais de que os principais líderes do grupo — como Yahya Sinwar e Mohammed Deif — tenham sido mortos ou capturados.

Para Netanyahu, o fim da guerra irá provavelmente trazer uma nova batalha pela própria sobrevivência política do primeiro-ministro.

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As divisões reveladas entre o exército e os aliados políticos realçam as tensões entre a retórica e a realidade nesta guerra.

Tensões essas que Netanyahu enfrenta ao estar preso entre a promessa de "vitória total" e a perspectiva de uma "guerra eterna".

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