Em meio a um clima de extrema polarização política, tensão racial, recentes ataques contra policiais e medo de atentados terroristas, a cidade americana de Cleveland, no Estado de Ohio, prepara um esquema de rígido de segurança para receber cerca de 50 mil pessoas durante a Convenção Nacional do Partido Republicano.
O evento, que deverá coroar Donald Trump como o candidato da legenda à presidência dos Estados Unidos, começa oficialmente na segunda-feira, mas as ruas da cidade já serão ocupadas a partir deste domingo por milhares de manifestantes e militantes de todo o país.
A presença frente a frente de partidários e opositores de Trump - candidato que costuma provocar reações apaixonadas dos dois lados -, somada a episódios recentes de violência no país, vem gerando apreensão entre autoridades.
O próprio secretário de Segurança Interna do governo do presidente Barack Obama admitiu temer que os protestos saiam de controle.
"Estou preocupado com a possibilidade de violência", disse Jeh Johnson a um painel de congressistas, na quinta-feira.
Hospitais e cadeias
Mais de 3 mil policiais, muitos vindos de outros estados, irão patrulhar a área próxima ao evento, no centro da cidade, que será isolada por barreiras e cercas de metal.
A segurança dentro da arena Quicken Loans, que abriga a convenção, ficará a cargo de agentes do Serviço Secreto.
O FBI (a polícia federal americana) e agentes especiais também estão mobilizados.
O prefeito de Cleveland, Frank Jackson, afirma que os policiais vão vestir uniformes comuns. Mas equipamentos antimotim estarão prontos para serem usados, caso seja necessário.
Hospitais reforçaram estoques de medicamentos e orientaram médicos que trabalham nos setores de emergência a não tirar férias no período.
Em antecipação à possibilidade de prisões em massa, as cadeias da cidade estão sendo esvaziadas e os tribunais estarão funcionando 20 horas por dia, com juízes de plantão.
"Esperamos não ter de recorrer a essas medidas, mas estarão disponíveis em caso de necessidade", disse à BBC Brasil o vereador Brian Kazy, que faz parte do comitê de segurança da cidade.
Dallas e Nice
A preocupação com a segurança foi acentuada depois que um atirador matou cinco policiais e feriu outros sete em Dallas, no Texas, na semana passada.
O ataque ocorreu durante um protesto pacífico contra as mortes de dois homens negros por policiais, em incidentes separados, cujas imagens foram divulgadas na internet.
Esses foram os mais recentes de uma série de encontros fatais em que homens negros acabaram mortos pela polícia, o que vem provocando protestos e aprofundando a tensão racial no país.
O atentado da última quinta-feira em Nice, na França, em que um homem dirigindo um caminhão matou mais de 80 pessoas, aumentou ainda mais a apreensão, apesar de nenhuma ameaça de terrorismo contra a convenção ter sido identificada.
Manifestantes
Em meio a esse clima volátil, grupos com as mais diversas agendas irão se encontrar em Cleveland nos quatro dias do evento, que se encerra na quinta-feira.
Além dos milhares de correligionários de Trump e de manifestantes que se opõem a sua candidatura, são esperados supremacistas brancos, skinheads, organizações religiosas, ambientalistas, ativistas latinos, manifestantes antiguerra, defensores dos direitos dos palestinos e vários outros grupos.
O fotógrafo Spencer Tunick pretende reunir cem mulheres nuas para posar para um projeto fotográfico intitulado "Everything She Says Means Everything" ("Tudo o que Ela Diz Significa Tudo", em tradução livre).
"Para realizar uma manifestação em Cleveland, é preciso de uma premissão. Nós recebemos um número excessivo de pedidos, alguns deles de grupos radicais com um histórico de comportamento desordeiro", relata Kazy, sem citar nenhum grupo específico.
"Isso não quer dizer necessariamente que algum desses grupos vá causar desordem. Mas estamos nos preparando para isso", afirma.
"Nosso trabalho é permitir que todos possam exercer seu direito constitucional de protestar, mas que o façam de maneira civilizada."
Armas
O desafio de manter a segurança será dificultado ainda pelo fato de que muitos manifestantes planejam levar armas para Cleveland.
A lista de objetos proibidos nas imediações da convenção inclui itens como garrafas de vidro, bolas de tênis e até alimentos enlatados.
Armas de fogo, porém, estão liberadas, já que a legislação de Ohio permite o porte ostensivo de armas. A única restrição será na arena Quicken Loans, onde a entrada com armas será proibida.
Alguns integrantes de grupos como o Oath Keepers, formado por militares da ativa e reformados, e o New Black Panther Party (Novo Partido Pantera Negra), formado por militantes negros, já anunciaram que pretendem levar armas para a cidade.
"É uma preocupação? Sim. Em qualquer situação em que alguém está andando por aí com uma arma haverá preocupação, porque nunca se sabe quais são as intenções desse indivíduo", ressalta Kazy, sem mencionar nenhum grupo em particular.
"Mas somos um Estado que permite o porte ostensivo, e todos têm o direito constitucional de portar armas em Ohio. E nós não vamos negar esse direito. Mas vamos assegurar que todos saibam que, para qualquer um portando arma de fogo, os olhos estarão sobre esse indivíduo."
O objetivo em Cleveland é garantir a segurança do evento e ao mesmo tempo oferecer um ambiente acolhedor aos visitantes, que participarão não apenas de protestos, mas também de centenas de festas.
Depois de mais de dois anos de preparativos, as autoridades apostam que a cidade está pronta.
"Com todas as medidas adotadas, com todos os policiais extras que trouxemos para a cidade, posso dizer que Cleveland será o lugar mais seguro ao longo desta semana", afirma Kazy.