Protestos pressionam governo na Venezuela; entenda a crise

Mobilizações formam parte da mais recente série de protestos de massa contra as políticas do presidente Nicolás Maduro

17 fev 2014 - 18h19

Caracas tornou-se mais uma vez palco de enfrentamentos da oposição e de simpatizantes do governo chavista de Nicolás Maduro. A atual onda de protestos ganhou tons trágicos na última quarta-feira com a morte de três manifestantes. Desde então, o país vive sob tensão crescente.

Nicolás Maduro durante transmissão de pronunciamento na TV
Nicolás Maduro durante transmissão de pronunciamento na TV
Foto: Reuters

Na última quarta-feira, a maioria dos manifestantes já havia se retirado do que até então era uma mobilização pacífica quando indivíduos em motocicletas abriram fogo contra o resto da multidão.

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Dois estudantes que marchavam com a oposição e um simpatizante do governo morreram após o episódio. O número de feridos passa de cem, segundo as agências de notícias.

As mobilizações formam parte da mais recente série de protestos de massa contra as políticas do presidente Nicolás Maduro, sucessor de Hugo Chávez.

Quem está protestando?

O que começou há pouco mais de uma semana como uma manifestação estudantil contra a insegurança em vários estados do país desencadeou uma série de mobilizações às quais diversos grupos políticos e outros setores da sociedade aderiram.

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Inicialmente, estudantes no estado de Táchira, que exigiam maiores medidas de segurança, foram presos por desordem pública. O evento gerou outros protestos neste estado e em Mérida, que resultaram em distúrbios e mais prisões.

Figuras da oposição se uniram às manifestações, convocando seus simpatizantes a saírem às ruas pedindo uma mudança de governo.

O movimento estudantil convocou, para a quarta-feira passada, uma manifestação em apoio a seus colegas presos, da qual também participaram grupos de oposição.

O governo, por sua vez, organizou sua própria manifestação para celebrar o Dia da Juventude, uma data cívica venezuelana que comemora uma batalha da guerra de independência.

Até o final da tarde aconteceram enfrentamentos violentos entre simpatizantes e opositores, cujo motivo é objeto de disputa.

Por que eles protestam?

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Originalmente, os protestos eram contra os altos índices de criminalidade. Mas problemas como a inflação, a falta de bens de consumo básicos, o mercado negro e os apagões também geraram mal-estar em alguns setores. Isso sem falar da oposição de direita, que pretende mudar 15 anos de políticas "chavistas" - iniciadas pelo ex-líder Hugo Chávez e continuadas por Nicolás Maduro.

A Venezuela tem uma das taxas de homicídio mais altas do mundo. Grupos da sociedade civil denunciam a impunidade em relação aos infratores e acusam também as milícias armadas.

O país também sofre com a inflação mais alta na região - que chegou a 56,2% em 2013. Produtos básicos como leite, açúcar, medicamentos e até papel higiênico frequentemente não podem ser encontrados nos supermercados.

Desde 2003, o governo de Chávez impôs um controle cambial às moedas estrangeiras em uma tentativa de frear a fuga de capitais e manter os preços da cesta básica. O dólar oficial vale 6,3 bolívares, mas a moeda no mercado negro vale dez vezes mais.

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É com base nesse mercado negro que os venezuelanos calculam o custo de vida.

A isso se somam os apagões de energia que ocorrem com frequência. Dois aconteceram na capital, Caracas, em 2013, mas muitos ocorreram em outras regiões.

O que diz o governo?

O presidente Nicolás Maduro condenou os incidentes da manifestação da quarta-feira passada e os atribuiu a um levante "nazifascista" que buscaria um golpe de Estado.

"Não haverá golpe de Estado na Venezuela, tenham certeza absoluta, o mundo deve saber disso", declarou.

Maduro pediu a paz, mas afirmou que os que participaram do episódio de violência não ficariam impunes, ao mesmo tempo em que manifestou apoio às investigações que a Promotoria Pública realizará para determinar os possíveis responsáveis.

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Um dia depois, de acordo com a mídia local, o governo emitiu uma ordem de prisão contra o líder opositor Leopoldo López, que é acusado de liderar os protestos da quarta-feira.

Ele também é acusado de incitação à delinquência, de intimidação pública, de danos à propriedade pública e até de homicídio doloso qualificado.

López, um dos líderes opositores de maior projeção, foi prefeito do município de Chacao, na região de Caracas - um dos focos da oposição. Em 2008, no entanto, ele foi impedido de exercer cargos públicos.

Qual é a resposta dos opositores?

Carlos Vecchio, um dos dirigentes do partido de López, disse que a ordem de prisão "é parte de um plano para criminalizar os protestos".

Ativistas estudantis também afirmaram que foram às ruas pedir por mudanças, e não provocar um golpe de Estado.

"Sempre que alguém protesta por um direito, o governo sai com o discurso de que 'sofremos um golpe de Estado' ou que 'estão criando uma agenda oculta para desestabilizar'. Desestabilizada está a sociedade venezuelana que vive com medo e fazendo filas", disse a líder estudantil Arellano.

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Arellano disse ainda que se o governo de Maduro não quer ver mais manifestações, deve responder às exigências dos estudantes.

No entanto, a resposta às convocações por mais protestos por parte dos líderes estudantis e outros líderes da oposição foi limitada, após o episódio da quarta-feira.

Isso possivelmente se deve ao fato de que a oposição está dividida.

Henrique Capriles, o candidato presidencial da oposição e, até agora, a principal figura opositora, se distanciou das iniciativas de Leopoldo López e condenou a violência.

Capriles acredita que este não seja o melhor momento para mobilizações de massa contra o governo e criticou a convocação de uma parte da oposição, que exigiu a saída antecipada de Maduro do poder.

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O ex-candidato defende a opção por "um caminho mais longo", que evite situações que conduzam à violência.

"Esta luta é uma resistência, mas esta resistência não cresce se nos colocarmos saídas que não levam a nada", afirmou.

A postura menos belicosa de Capriles provocou uma queda em sua popularidade, ao mesmo tempo em que López começa a despontar como o novo rosto da oposição.

Nas redes sociais há constantes elogios aos protestos e seus participantes e duras críticas a Capriles. Alguns, inclusive, o chamam de traidor.

Qual é a situação dos detidos e dos feridos?

Os números de pessoas detidas, liberados, presas e feridas nas manifestações muda a todo momento, na medida em que se resolvem casos individuais, e também muda de acordo com as fontes.

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O que ninguém contesta são as três pessoas que morreram na quarta-feira passada, dia 12 de fevereiro: dois estudantes ativistas e um simpatizante do governo, dos chamados "coletivos".

Os números oficiais dizem que 99 pessoas foram detidas até o domingo por suposta participação em episódios de violência ou outros delitos em Caracas e outros estados.

De acordo com o site da Promotoria Pública, a maioria destas pessoas foram libertadas depois de serem aplicadas medidas cautelares. 13 delas foram presas.

No dia 13 de fevereiro, um dia depois do confronto, as autoridades diziam que o número de feridos era 66. No entanto, agências de notícias informam que já passa de 100.

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Por outro lado, a ONG Foro Penal Venezolano diz que 155 pessoas foram detidas, a maioria em Caracas, e que seis delas estão presas esperando a decisão dos tribunais.

A ONG também menciona 22 feridos durante as manifestações, 14 deles por tiros, só no estado de Lara.

Uma advogada do Foro Penal Venezolano disse ao canal de notícias colombiano NTN24 que alguns presos foram vítimas de torturas por parte da polícia.

Segundo ela, eles teriam recebidos golpes, choques elétricos e ameaças de serem queimados após serem molhados com gasolina.

Não há confirmação independente destas afirmações e o governo não respondeu às denúncias.

O contexto dos protestos

Qualquer seja a avaliação dos fatos da última semana, a Venezuela enfrenta desafios complexos e tem pela frente um longo caminho até a estabilização.

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Em primeiro lugar, o país está tão polarizado politicamente que qualquer atitude que o governo tome não tardará a receber uma reação contrária de igual força. O mesmo acontece com a oposição.

A situação não contribui para atacar o problema mais urgente do país: a economia. A oposição insiste que a culpa pelos problemas econômicos do país é da administração chavista, mas oficialmente se fala de uma "guerra econômica" impulsionada pelos inimigos da Revolução Bolivariana.

A alta taxa de inflação e a escassez de produtos básicos ainda não foram resolvidas.

A Assembleia Nacional outorgou poderes especiais ao presidente Maduro para decretar leis que aumentem o controle estatal da economia. Entre elas está a limitação dos ganhos sobre a venda de produtos e a fixação de preços justos para o consumidor.

Mas os críticos asseguram que estas medidas só aprofundarão as distorções da economia, criando mais escassez e um mercado negro descontrolado.

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