Duas histórias dramáticas envolvendo crianças argentinas levaram o Papa Francisco a transformar em santo um padre argentino que morreu no início do século passado.
Familiares atribuem a sobrevivência das crianças, que ficaram entre a vida e a morte, ao chamado "cura" (padre) Jose Gabriel del Rosario Brochero (1840-1914), agora o primeiro santo que nasceu e morreu na Argentina.
No último domingo, ele foi canonizado em uma cerimônia no Vaticano com participação de Nicolás Flores e Camila Brusotti, que teriam recebido as supostas intervenções divinas, e suas famílias.
Acidente de carro
O primeiro suposto milagre ocorreu em 2000, quando Osvaldo Flores rezou para que Brochero salvasse seu filho Nicolás, que havia sofrido várias paradas cardiorrespiratórias.
O garoto tinha 11 meses quando o carro em que viajava com a família sofreu um acidente. Com o choque, seu avô morreu, sua mãe quebrou as pernas e ele ficou desacordado. O pai de Nicolás tentou reanimá-lo no local da tragédia, com respiração boca a boca.
"Meu filho sofreu quatro paradas cardíacas. Na quarta, já no hospital, passou 15 minutos sem respirar, e os médicos disseram que ele não sobreviveria. Meu marido rezou para o padre Brochero e ele salvou nosso filho", disse à BBC Brasil a advogada Sandra Violino, mãe de Nicolas.
Segundo ela, os médicos disseram que o menino teria uma vida vegetativa pela perda de massa encefálica e pelo tempo que passou sem respirar, sem oxigenação cerebral. "Mas hoje meu filho leva uma vida normal. Tem amigos, frequenta a escola e é feliz", disse Violino.
Fé e milagre
Filho único e hoje com 16 anos, Nicolás estuda em um colégio para crianças e adolescentes com algum tipo de limitação. A família vive na região de Traslasierra, na província de Córdoba, onde o padre Brochero passou boa parte da vida e onde fica a igreja em que os pais do jovem se casaram.
"Mesmo muito antes de ele (Brochero) ser santo, meu marido já tinha fé em seu poder de cura", disse a mãe.
Em 2012, o Vaticano certificou a intervenção de Brochero na recuperação de Nicolás, validando o milagre.
Violência
O segundo suposto milagre atribuído a Brochero se refere ao caso de Camila Brusotti, ocorrido em 2013.
A menina tinha oito anos quando foi alvo de um crime que causou comoção na Argentina - entrou em coma após, segundo a investigação judicial, ter apanhado do padrasto.
No tribunal, a mãe confirmou que o marido era um homem violento, mas disse que a menina havia caído de um cavalo. A Justiça, porém, não acreditou nessa versão.
Quando a menina foi hospitalizada, em estado grave, os médicos disseram que ela ficaria com sequelas caso sobrevivesse. Os avós maternos, devotos do padre Brochero, pediram a ele que a salvasse.
Os avós, Raúl e Marina Ríos, contaram que ganharam de uma amiga da família um quadro com uma foto do padre Brochero, segundo informou o jornal Diario de Cuyo.
Ao saber da história de Nicolás, que havia sobrevivido ao acidente, a amiga da família notou que era parecida com o caso de Camilla, que também teve o cérebro afetado.
"Ela ficou 15 dias sem reagir, em terapia intensiva. Eu falava com ela e ela não respondia, não tinha reflexos, nada. Desesperei-me e pedi ajuda a Brochero. Na segunda novena, ela saiu da terapia intensiva", disse o avô da menina, que é professor aposentado.
Na cerimônia no Vaticano, Nicolás e Camilla foram apontados pela imprensa argentina como "as crianças do milagre de Brochero". Camila se apresentava aos jornalistas com a mesma frase: "Sou a menina do milagre do Brochero".
A mãe de Camilla, Alejandra Ríos, cumpre pena de seis anos de prisão, e o padrasto da menina, Pedro Oris, nove anos de detenção.