Talebã no Afeganistão: as novas regras para estudantes mulheres anunciadas pelo grupo fundamentalista

Desde que o Talebã foi derrubado do poder em 2001, um enorme progresso foi feito na melhoria das matrículas na educação e nas taxas de alfabetização do Afeganistão, especialmente para meninas e mulheres. Agora, muitos temem que tudo isso se perca.

13 set 2021 - 06h05
(atualizado às 07h26)
Estudantes pró-Talebã comparecem a comício na Shaheed Rabbani Education University, em Cabul, no sábado
Estudantes pró-Talebã comparecem a comício na Shaheed Rabbani Education University, em Cabul, no sábado
Foto: EPA / BBC News Brasil

As universidades afegãs passarão a ser segregadas por gênero, e um novo código de vestimenta será adotado para as estudantes, segundo o Talebã, grupo fundamentalista islâmico que tomou o poder no Afeganistão após a saída de tropas americanas do país.

O ministro do Ensino Superior, Abdul Baqi Haqqani, indicou que as mulheres teriam permissão para estudar, mas não próximas aos homens. Ele também anunciou uma revisão das disciplinas ministradas aos alunos.

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O Talebã disse que não vai impedir que as mulheres recebam educação ou tenham empregos. Mas desde que assumiu o controle do Afeganistão, em 15 de agosto, o grupo determinou que todas as mulheres, exceto as do setor público de saúde, se afastassem do trabalho até que a "segurança do país" melhorasse.

O anúncio de mudanças no ensino superior ocorre um dia depois de o Talebã hastear sua bandeira no palácio presidencial, sinalizando o início de sua administração. A nova política educacional remete ao período em que comandou o país, de 1996 a 2001, ano em que foi derrubado pelos EUA por ligações com o grupo responsável pelos atentados de 11 de Setembro.

Mulheres e meninas foram banidas de escolas e universidades sob o governo do Talebã. Depois da queda do grupo, as alunas não tinham que obedecer a um código de vestimenta e as universidades eram mistas, com homens e mulheres estudando lado a lado.

Para o novo ministro do Ensino Superior, Abdul Baqi Haqqani, não haverá problemas em acabar com o sistema de ensino misto porque "as pessoas são muçulmanas e vão aceitar isso".

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Retrocesso em curso

Desde que o Talebã foi derrubado do poder em 2001, um enorme progresso foi feito na melhoria das matrículas na educação e nas taxas de alfabetização do Afeganistão, especialmente para meninas e mulheres.

Estudante em Cabul em 1972: direitos das mulheres no Afeganistão tiveram muitas idas e vindas no último século
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Um relatório recente da Unesco, braço da Organização das Nações Unidas (ONU) para educação, apontou que o número de meninas na escola primária aumentou de quase zero para 2,5 milhões nos 17 anos seguintes à queda do Talebã.

O relatório também disse que a taxa de alfabetização feminina quase dobrou em uma década, para 30%.

Agora a situação pode piorar, segundo especialistas. Alguns deles afirmam que as novas regras de segregação excluirão as mulheres da educação porque as universidades não têm recursos para oferecer aulas separadas.

O ministro negou essa possibilidade e disse que há professoras suficientes. Nos lugares em que elas não estejam disponíveis, Haqqani afirmou que serão encontradas "alternativas".

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"Tudo depende da capacidade da universidade. Também podemos usar professores do sexo masculino para ensinar (as alunas) por trás de uma cortina ou usar tecnologia."

Meninas e meninos também serão segregados nas escolas primárias e secundárias, o que já era comum em todo o Afeganistão.

Mulheres afegãs estudam em Cabul durante o governo comunista, nos anos 1980
Foto: AFP / BBC News Brasil

As mulheres serão obrigadas a usar hijabs, mas Haqqani não especificou se coberturas faciais adicionais seriam novamente obrigatórias.

O novo ministro disse ainda que as disciplinas ministradas nas universidades serão revistas. Ele disse a repórteres que o Talebã deseja "criar um currículo islâmico razoável que esteja de acordo com nossos valores islâmicos, nacionais e históricos e, por outro lado, seja capaz de competir com outros países".

O anúncio foi feito logo depois de uma manifestação de mulheres que apoiam as novas políticas de gênero do Talebã na Shaheed Rabbani Education University, em Cabul.

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Centenas de mulheres, a maioria delas usando niqabs negros e portando pequenas bandeiras do Talebã, ouviram discursos que elogiaram o novo regime e atacaram os envolvidos em grandes manifestações em todo o país exigindo a proteção dos direitos das mulheres adquiridos quando o grupo fundamentalista islâmico estava fora do poder.

As mudanças em curso não se restringem ao setor educacional.

O novo governo do Talebã substituiu o Ministério dos Assuntos da Mulher pelo Ministério da Virtude.

O temido departamento foi responsável, até o início dos anos 2000, por enviar a polícia religiosa às ruas para fazer cumprir uma interpretação radical da lei Sharia (lei islâmica). Tornou-se conhecido, por exemplo, por bater em mulheres acusadas de se vestir indecentemente ou de sair de casa sem um tutor.

A iminência da retomada do poder pelo Afeganistão levou diversas mulheres proeminentes a fugirem do país antes de meados de agosto. A maior cantora pop do país, Aryana Sayeed, viajou em um avião de carga dos EUA e a famosa diretora de cinema Sahraa Karimi foi levada para a Ucrânia.

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O time feminino de futebol do país, criado em 2007, também conseguiu escapar.

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