Propaganda polemiza: você só precisa ser branca para vencer

9 jan 2016 - 10h56
(atualizado às 11h46)
Propaganda gerou debate sobre racismo introjetado na sociedade tailandesa
Propaganda gerou debate sobre racismo introjetado na sociedade tailandesa
Foto: Reprodução

“Você só precisa ser branca para vencer”. A frase, dita em um comercial de creme branqueador na Tailândia, gerou polêmica e reacendeu o debate sobre racismo no país.

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A busca por uma pele branca é quase obsessiva na Tailândia.

Diversos cosméticos nas prateleiras de farmácias e perfumarias prometem clarear a pele. As mulheres tailandesas expostas ao sol diariamente tentam dissimular a cor da pele com maquiagem branca, evidenciando a diferença do tom entre o rosto e o corpo.

A busca por uma pele de porcelana e o racismo introjetado em mensagens deste tipo ganhou uma nova dimensão com o lançamento de mais um comercial que promete “embranquecer” os tailandeses.

“(A campanha) sugere que as pessoas de pele escura são perdedoras, é definitivamente racista”, escreveu um usuário da rede social tailandesa pantip.com, onde a campanha virou polêmica.

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Na propaganda do creme clareador, uma famosa atriz local afirma: “Sabe de uma coisa? Para estar onde estou agora a competição foi muito alta. Não é fácil ficar aqui por um longo tempo. E uma vez que eu parar de tomar conta de mim mesma, tudo o que tenho dedicado, (ao) investimento da (minha) brancura, tudo se acabará”.

Neste ponto, a câmera mostra outra atriz, que pouco a pouco vai se tornando ainda mais pálida, enquanto a atriz famosa vai se tornando negra. A mensagem final da propaganda resume: “Você só precisa ser branca para vencer”.

No Twitter, um popular blogueiro inglês radicado no país, Richard Barrow, qualificou a campanha como a "mais racista que eu já vi”.

Tuíte de blogueiro inglês critica anúncio que diz que cadeiras em metrô são reservadas para brancos
Foto: Reprodução Twitter

"Os tailandeses tiveram a cabeça 'perfurada' há muito tempo pela ideia de que a brancura te faz belo (…) Branco é mais bonito. Negro não é bonito”, escreveu um usuário chamado Ban Bua Ver Chomph.

Vários usuários pediram um boicote às empresas que defendem o branqueamento da pele.

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A empresa produtora do creme teve de se retratar após a polêmica. Por meio de uma nota pública, a Seoul Secret pede desculpas pelo “erro”.

Após afirmar que a empresa não tinha o objetivo de enviar uma mensagem racista, na mesma nota, a Seoul Secret reafirma que aparência é um elemento importante para o êxito - neste caso, ser branco.

“O que tentamos transmitir é que automelhoria em termos de personalidade, aparência, habilidades e profissional é crucial”, diz o documento. Após a polêmica a empresa decidiu retirar de circulação o vídeo e suspendeu outros materiais publicitários relacionados à campanha.

Pele escura, salário menor

A busca por uma tez branca vai além de campanhas publicitárias de beleza e afeta as relações sociais e de trabalho.

Na escola de idiomas em que o professor M.E dá aulas a jovens tailandeses, no centro de Bangkok, professores de pele escura ganham menos que seus colegas brancos.

Em muitos casos, não são contratados por causa do tom da pele. “Aqui o racismo é contra a aparência asiática e pessoas de pele escura”, diz o professor canadense.

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Foto: BBC Brasil / BBC News Brasil
Foto: BBC Brasil / BBC News Brasil
Na Tailândia, assim como no Brasil, cor é relacionada à classe social
Foto: BBC Brasil / BBC News Brasil

De acordo com M.E, que não quis ter seu nome revelado, a diferença salarial pode chegar a até 40% em relação aos professores brancos. “Eles (professores de pele escura) não podem trabalhar.

E se podem, ganham menos que os nativos (de outros países, brancos procedentes da Europa ou América do Norte”, afirmou M.E à BBC Brasil. “O centro da cidade não é para eles (na visão dos donos do curso)”.

Nas ruas de Bangkok, a publicidade é destinada a um perfil da população que não é visto caminhando pela cidade exposto ao sol, dirigindo táxis, motocicletas ou vendendo comida nas esquinas.

Assim como no Brasil, na Tailândia a cor da pele está relacionada com as classes sociais. A maioria dos brancos estão na capital, descendentes da elite chinesa.

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Os de pele mais escura são, na maioria, migrantes internos, similares na cor e no ofício aos nordestinos brasileiros das décadas de 1950 até 1980. Outros que costumam ser rejeitados pelo tom da pele são os imigrantes dos países vizinhos Mianmar, Laos e Camboja.

“O problema acentua a questão de classes na Tailândia. Aqueles com a pele escura são vistos como pobres do nordeste rural. Os desprezamos, como os cambojanos ou indianos com características escuras”, afirmou o crítico social Lakkana Punwichai à BBC News.

Cremes para branquear a pele também estão disponíveis em outros países, como na Costa do Marfim
Foto: Reprodução

Punwichai afirma que esse não é um problema exclusivamente tailandês, “esse é um problema em todo o mundo”.

Em 2011, a propaganda de um creme branqueador instalada no metrô de Bangkok indicava que aquela fileira de assentos era “reservada à pessoas brancas”. Recentemente uma representante local da Unilever, Citra, lançou um concurso para entregar 100 mil bolsas de estudo a universitários que tivessem a pele mais clara. A polêmica obrigou a empresa a se desculpar.

A obsessão pela pele branca não poupou de críticas a Nonthawan "Maeya" Thongleng, vencedora do Miss Mundo Tailândia, em 2014. Ela foi criticada por não ser tão branca quanto as outras competidoras que disputavam a coroa.

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