Com um início que não estava no script, o governo Temer chega ao fim depois de superar duas denúncias na Câmara dos Deputados e de atingir níveis recordes de reprovação. Eleito vice-presidente em 2014 na chapa encabeçada pelo PT, Michel Temer (MDB) assumiu o cargo máximo da República de forma interina em 12 de maio de 2016 e, definitivamente, no dia 31 de agosto do mesmo ano após a conclusão do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Em mais um texto da Retrospectiva 2018, o Terra traz um balanço do governo emedebista, que termina no final do mês.
Entre as principais promessas do presidente, quando tomou posse, estavam a volta do crescimento econômico, o controle da inflação, a criação de empregos, a redução da dívida pública e do rombo fiscal e a aprovação de reformas, como a trabalhista e a da Previdência. Temer cumpriu apenas algumas delas.
O PIB não atingiu os patamares almejados, mas o País saiu da recessão, com as taxas de crescimento de 1,0%, em 2017, e de 1,3% na previsão para 2018. Além disso, Temer conseguiu aprovar a reforma trabalhista e levou a inflação a 2,95% - um pouco abaixo do piso da meta de 3% -, em 2017, e a 3,71% nas estimativas para 2018. Com o IPCA baixo, o Banco Central pôde baixar gradativamente a taxa básica de juros, a Selic, que estava da casa dos 14% em meados de 2016 e fecha o ano em 6,5%, no menor patamar desde a adoção do regime de metas para a inflação em 1999.
Em contrapartida, o desemprego continuou crescendo, chegando ao pico de 13,7%, em março de 2017 - em novembro de 2018, a taxa foi de 11,7% -, e a relação entre a dívida pública e o PIB pulou de 67,75% para 77,16% em dois anos de acordo com dados do Banco Central. Já o rombo fiscal, que em 2015 foi de R$ 114,98 bilhões, aumentou para R$ 154,2 bi, em 2016, caiu para R$ 124 bi, no ano passado, e deverá ficar próximo de R$ 126 bi em 2018. Uma de suas principais bandeiras quando assumiu, a reforma da Previdência, mesmo bastante modificada de sua proposta inicial, contida no documento “Uma ponte para o futuro”, não foi adiante no Congresso.
A prometida recuperação econômica ficou ainda mais comprometida com a greve dos caminhoneiros, em maio deste ano. Contra a política de reajuste de preços da Petrobras, lançada por Pedro Parente, o movimento paralisou a oferta de serviços pelo País e exigiu a redução do preço do diesel, combustível usado por caminhões. Temer se viu obrigado a ceder e assinou medidas provisórias que diminuíram o preço do litro em R$ 0,46, gerando um prejuízo bilionário ao governo. Parente acabou pedindo demissão da presidência da Petrobras.
Articulação política, liberação de emendas e denúncias barradas
Ao contrário de sua antecessora, Temer foi habilidoso politicamente ao articular e negociar emendas com o Congresso para permanecer no cargo. Dilma caiu no primeiro processo de impeachment acolhido pelo então presidente da Câmara Eduardo Cunha - aliado político histórico de Temer -, que o fez em retaliação à decisão do PT de votar pelo prosseguimento da cassação de seu mandato.
Temer, por outro lado, sempre teve ao seu lado Rodrigo Maia, presidente da Câmara desde junho de 2016, e realizou negociações e concessões para manter a base de apoio na casa e barrar duas denúncias da Procuradoria Geral da República (PGR). Entre as principais medidas, o governo perdoou dívidas do programa de refinanciamento de débitos tributários, o Refis.
Durante o período em que os processos corriam, em 2017, Temer ganhou o apoio da bancada ruralista ao conceder descontos e benefícios nas alíquotas de contribuição no Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural), além de permitir a anistia de um passivo de cerca de R$ 17 bilhões referentes ao imposto que custeia aposentadorias.
Na primeira denúncia levada ao Supremo Tribunal Federal (STF), a PGR acusava Temer de crime de corrupção passiva com base nas delações premiadas de executivos do grupo J&F, que controla a JBS. Na segunda, o presidente da República foi acusado de organização criminosa e obstrução da Justiça em supostas articulações de propina na Câmara por meio de órgãos como Caixa Econômica, Furnas e Petrobras.
Neste ano, uma terceira denúncia quase veio à tona, mas a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu ao STF a suspensão do inquérito, que investiga se Temer recebeu propina da Odebrecht. As duas primeiras, barradas pela Câmara, serão analisadas pela Justiça após o fim do mandato de Temer, em 31 de dezembro deste ano.
Nesta quarta-feira (19), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, apresentou outra denúncia contra o presidente. Desta vez, porém, não será necessária votação na Câmara. O político está a poucos dias de deixar o Planalto e perder as prerrogativas de foro. O processo deverá ser enviado à primeira instância. Desta vez, ele é acusado de irregularidades no Decreto dos Portos.
Quase candidato à Presidência
Apesar de no começo ter afirmado que não disputaria a Presidência em 2018 e que faria apenas um governo de transição, Temer passou a namorar a hipótese ao longo do mandato. O presidente pretendia se apresentar como um candidato de “centro”, com uma plataforma de continuidade do programa de reformas consideradas fundamentais pelo mercado para a estabilização da economia.
A desistência oficial da candidatura veio em 22 de maio deste ano, quando Temer anunciou o nome de Henrique Meirelles para tentar o cargo pelo MDB. O ex-ministro da Fazenda terminou as eleições como o 7º mais votado, com apenas 1,20% dos votos válidos.
Rejeição
Michel Temer deixa o cargo mais alto da República como o presidente mais rejeitado da história no final do mandato. De acordo com pesquisa do Ibope encomendada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria), divulgada no dia 13 de dezembro, 74% consideram sua gestão ruim ou péssima. Apenas 5% consideram o governo bom ou ótimo e 18% o apontam como regular. Outros 5% não souberam ou não responderam. No mesmo levantamento, 85% disseram que desaprovam a maneira de governar.
Com o patamar de reprovação, o presidente supera os 69% atingidos por Dilma Rousseff, em março, no último levantamento do instituto antes do afastamento. O ex-presidente José Sarney é o terceiro de pior avaliação desde a redemocratização do País, deixando o cargo com 60% de rejeição.