Susan Greenfield é neurocientista e pesquisadora sênior da Universidade de Oxford, e tem observações importantes sobre como o ambiente digital pode alterar nosso cérebro. A britânica explicou, durante entrevista, que tudo o que fazemos no dia a dia inevitavelmente afeta nosso cérebro, pois ele muda a todo instante de nossas vidas.
Nosso poderoso órgão se desenvolveu para se adaptar ao ambiente, não importa qual ele seja. Fator tão importante para compreender como o ciberespaço pode afetar nossas vidas, uma vez que nossas interações estão cada vez mais tecnológicas.
Um dos pontos mais críticos da análise de Susan é como as redes sociais têm impacto na construção da identidade, afetando consequentemente os relacionamentos. Se antes as pessoas viviam em comunidades locais, e construíam a identidade dentro de determinada cultura ou país, agora a constroem em presença global.
Isso é preocupante porque a construção da identidade dentro das redes sociais parte do princípio da aprovação de terceiros, ou seja, dos “likes”. E, nada é real. Prova disso é quando alguém está em determinado local ou evento e apenas se preocupa em publicar o acontecimento nas redes sociais. Ela não está, de fato, vivendo aquilo.
A pesquisadora aponta como as pessoas se sentem muito importantes e conectadas, mas igualmente inseguras, com baixa autoestima e constantemente inadequadas.
E quando se trata de videogames, Susan se preocupa em como eles podem influenciar na atenção, agressividade e dependência. Já foi demonstrado como jogar videogames é semelhante a fazer um teste de QI. Uma das possíveis razões do aumento de QI é devido a repetição de uma certa habilidade.
No entanto, não significa que o aumento do QI esteja relacionado ao aumento da criatividade ou capacidade escrita. Estudos também já mostraram através de exames de imagem como os videogames aumentam áreas do cérebro que liberam dopamina. Ela ressalta como na ciência nada é definitivo, e é preciso realizar mais estudos acerca do assunto.
Em relação ao TDAH (transtorno de déficit de atenção e da hiperatividade), há um aumento alarmante do diagnóstico. Nos últimos 10 anos, a prescrição de drogas como Ritalina, usadas no tratamento da condição, quadruplicaram.
Há duas possibilidades para esses índices: ou há um diagnóstico maior do TDAH, ou maior prescrição dos remédios pelos médicos. A causa principal, entretanto, pode estar nas tecnologias digitais. O uso do medicamento ainda pode estar sendo utilizado de maneira equivocada.
O vício em jogos tem sido combatido com o uso da Ritalina. Se ambos liberam a mesma substância, estão sobrecarregando o cérebro com dopamina. Susan diz que é preciso aprofundar no aprendizado sobre os mecanismos cerebrais para compreender como funciona essa dinâmica.
A pesquisadora cita um estudo americano, de 2010, que indicou como mais de metade dos adolescentes entre 13 e 17 anos gastam mais de 30 horas por semana na internet. São cinco horas por dia em frente às telas, sem contato com o mundo real, sem tomar sol, sem brincar no quintal. Enfim, sem realizar atividades que crianças costumavam apreciar.
Crescer no ciberespaço pode implicar na falta de capacidade de olhar nos olhos de alguém, interpretar tons de voz ou linguagem corporal. Ela acredita que essa geração, chamada de “nativos digitais”, poderá enfrentar dificuldades em desenvolver o contato físico e perderá o interesse em conhecer pessoas no mundo real. As comunicações tendem a ser cada vez mais escolhidas através das telas.
Ao contrário da televisão, porém, nosso contato com a internet é altamente interativo e estimulante. Um estudo recente publicado pela agência internacional We Are Social revelou que o Brasil é a terceira nação mais conectada do mundo. Diariamente, gastamos em média 5 horas e 26 minutos online via computador ou tablet e mais outras 3 horas e 46 minutos pelo celular. São 9 horas e 13 minutos diários imersos no ambiente digital.
A pesquisadora cita que já foi comprovado que passar 10 horas na frente das telas tem forte correlação com anormalidades em exames cerebrais.
Quanto ao futuro da nova geração, a neurocientista tem previsões otimistas quanto pessimistas. Segundo ela, pessoas nascidas na metade do século 21 podem apresentar um QI maior e boa memória.
Em contrapartida, essa geração pode ter identidade mais frágil, menos empatia, menos concentração e pode viver estagnada no presente, sem desenvolver o senso de passado, presente e futuro.
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