Troca de sede da Alerj custará R$ 156 milhões

A mudança tem como justificativas as melhores condições estruturais do prédio e a economia anual de recursos

3 ago 2021 - 05h10
(atualizado às 07h26)

Palco histórico da República brasileira - e, nos últimos anos, de escândalos de corrupção -, o Palácio Tiradentes não é mais a casa da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Os deputados fluminenses farão, hoje, a primeira sessão da nova sede do Legislativo estadual: o Edifício Lúcio Costa, o "Banerjão", que pertenceu ao Banco do Estado do Rio de Janeiro (Banerj), privatizado nos anos 90.

Sede da Alerj
Sede da Alerj
Foto: Zô Guimarães/Alerj/Divulgação / Estadão Conteúdo

O palácio de estilo eclético foi inaugurado em 1926 e é uma das principais construções do que resta do centro velho da capital. A mudança, coordenada pelo diretor da Casa, Wagner Victer, tem como justificativas as melhores condições estruturais do prédio e a economia anual de recursos.

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Atualmente, a Alerj precisa de dois edifícios, além do Palácio Tiradentes, para funcionar. Mesmo assim, o terreno somado das três construções é metade do espaço do Banerjão. São 44.700 metros quadrados na nova casa, contra 23.000 da soma das três antigas, que incluíam o palácio, um anexo para gabinetes e a sede administrativa.

O palácio agora desativado, "guardado" por uma estátua de Tiradentes aos pés da escadaria, transformou-se, nos últimos anos, em símbolo dos casos de corrupção que envolveram o Rio, sobretudo na era Sérgio Cabral. A partir de 2017, a Alerj passou a ser alvo de operações policiais, com parlamentares entre seus alvos. Irônicos, procuradores do Ministério Público Federal batizaram as principais ações contra os parlamentares com nomes que se referem a espaços históricos da Casa.

A Operação Cadeia Velha, batizada com o nome de antiga prisão que funcionou ali antes da construção do palácio, foi a primeira. Em novembro de 2017, o então presidente da Assembleia, Jorge Picciani, o ex-presidente Paulo Melo e o deputado Edson Albertassi, todos do MDB, foram presos. Eram acusados de comandar esquemas de corrupção vinculados ao governo Cabral, seu correligionário, na área de transportes. O ex-governador, atualmente na cadeia, foi presidente da Alerj de 1995 a 2002.

Um ano depois houve outra "homenagem" dos procuradores: a Operação Furna da Onça. Espécie de desdobramento da Cadeia Velha, a ação expandiu as suspeitas sobre outros deputados fluminenses. Ao batizar a investigação focada em pagamentos de propina, o MPF escolheu o nome de uma sala que fica ao lado da entrada do plenário do Tiradentes. Ali, nos tempos da Câmara, os deputados se reuniam para conversar, articular e, segundo os investigadores, negociar acordos espúrios. Na ação foram cumpridas ordens de prisão de dez deputados.

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Foi em um desdobramento da Furna da Onça que surgiu aquela que se transformou na mais famosa investigação sobre supostos desvios na Assembleia. Um relatório produzido pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) para a operação identificou movimentações suspeitas na conta de Fabrício Queiroz, ex-assessor do então deputado estadual, Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), hoje senador - o caso foi revelado pelo Estadão.

O documento detalha as movimentações nas contas de assessores da Assembleia. No caso de Queiroz, o valor inicial no período de um ano era de R$ 1,2 milhão. A partir do relatório de inteligência financeira (RIF), foram abertas diversas investigações pelo Ministério Público do Rio para apurar um amplo esquema de "rachadinha" (desvio de salários) na Alerj. Flávio foi denunciado por peculato, lavagem de dinheiro, apropriação indébita e organização criminosa no ano passado.

Gabinetes. No novo edifício, os escritórios dos parlamentares se espalham por doze andares - seis por cada pavimento. São mais de 100 metros quadrados por deputado.

Com o parlamento transferido, o Tiradentes passa a ser mais um palácio "abandonado" pelo poder público na antiga capital federal - a ideia é que vire um museu. Um dos casos mais emblemáticos desde a transferência do Poder para Brasília foi o do Palácio Monroe, na Cinelândia, que sediou o Senado e foi demolido nos anos 70. O pretexto foi a obra de construção do Metrô, que atingiria uma pequena parte do edifício. Discute-se se o motivo não foi outro: uma decisão da ditadura militar de apagar parte da memória política da democracia no País.

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Antes de abrigar a Assembleia do Rio, o Tiradentes foi sede do Legislativo do antigo Estado da Guanabara. Também funcionou ali a Câmara dos Deputados, quando o Rio ainda era a capital da República, até 1960. São cerca de 95 anos como parlamento, com breves intervalos. Um deles foi no Estado Novo, quando o palácio inspirado no Grand Palais de Paris foi usado por Getúlio Vargas para sediar o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), que cuidava da censura aos órgãos de comunicação.

O nome do palácio, vizinho do Paço Imperial, remete a uma história ainda mais antiga do País. Na Cadeia Velha, que funcionou ali muito antes de o palácio ser erigido, o inconfidente mineiro Tiradentes saiu para ser enforcado, após passar três anos preso.

De frente para a Praça Mário Lago, mais conhecida como Buraco do Lume, o prédio de 31 andares que passa a receber a Alerj custou R$ 156 milhões, segundo estimativas oficiais. Começou em julho de 2016 e envolveu 250 pessoas. Apesar dos gastos, a Casa argumenta que economizará no longo prazo. Com estrutura moderna, o prédio pode gerar uma economia de 40% nas despesas com água e de 25% em energia, avalia.

Outras novidades incluem auditório, oito salas voltadas para uma universidade corporativa e cinco salas para abrigar comissões - eram duas no palácio. Apesar de mais genérico e sem o caráter artístico e histórico do Tiradentes, o plenário é 30% maior que o anterior e terá espaço para 150 pessoas nas galerias. Elas ficarão, no entanto, atrás de um vidro, o que deve diminuir a pressão popular durante as votações.

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O edifício já ganhou o apelido de Alerjão, mantendo uma tradição carioca de dar apelidos no aumentativo para construções públicas. Há, por exemplo, os Brizolões, como ficaram conhecidas as escolas de tempo integral concebidas no primeiro governo de Leonel Brizola (1983-1987), e outros prédios no aumentativo.

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