Futuro do Chevrolet Cruze é incerto; GM deve mirar nos SUVs

Vai longe o tempo em que sedãs aspiracionais eram a síntese da Chevrolet no Brasil. Hoje a marca está de olho nos compactos e nos SUVs

14 out 2020 - 10h00
(atualizado às 10h41)
Chevrolet Cruze Premier: alto nível de conectividade e acabamento superior.
Chevrolet Cruze Premier: alto nível de conectividade e acabamento superior.
Foto: Sergio Quintanilha / Guia do Carro

O Chevrolet Cruze é um bom carro. Mas parece ser mais um automóvel correndo em direção à guilhotina. A segunda geração, lançada em 2016, chegou produzida em cinco países do mundo porque tinha pretensão de ser mundial: China, EUA, México, Coreia do Sul e Argentina. Passados apenas quatro anos, só a fábrica de Alvear, na Argentina, mantém o Cruze em produção, para o mercado local e para o Brasil. Este carro tem futuro? Dificilmente.

No mundo globalizado, é raro um carro ser produzido apenas para um mercado. Para quebrar isso, é preciso fazer sucesso em vendas, como é o caso do Volkswagen Gol. Porém, o Chevrolet Cruze não está nesse patamar. Em setembro, o Cruze sedã foi apenas o 62º colocado no ranking de emplacamentos com apenas 426 vendas. Perdeu até para o BMW 320i, um carro de categoria superior, que ficou em 60º lugar com 531 vendas. 

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O Cruze hatch teve um desempenho ainda pior: emplacou apenas 177 unidades -- e, por incrível que pareça, é líder disparado de seu segmento (hatches médios), uma prova de que esse mercado acabou. Seus seguidores são o Audi A3, o BMW Série 1 e o Mercedes-Benz Classe A. No caso do Chevrolet Cruze sedã, ainda há mercado disponível. Tanto que o Toyota Corolla ficou em 12º lugar com 3.336 vendas e o Honda Civic ficou em 29º com 2.296. 

Chevrolet Cruze tem as características de um bom sedã, mas não vende.
Foto: Sergio Quintanilha / Guia do Carro

Faz sentido para a GM fabricar um carro que vende 8 vezes menos do que o líder do segmento? Depende do segmento. Mas o mercado de sedãs médios responde por apenas 4,6% das vendas no Brasil; o de hatches médios, por 0,3%. Juntos, não chegam a 5%. Por tudo isso, as chances de o Chevrolet Cruze durar mais três ou quatro anos parece pequena. Na China, o carro foi substituído pelo Chevrolet Monza (ele mesmo!), que nada mais é do que um Onix Plus ampliado. A indústria automobilística vive a segmentação da segmentação.

Há vários motivos para a precoce condição do Chevrolet Cruze. Ele pode até não ser o carro mais atraente do segmento, mas com certeza é um sedã bonito, seguro, bem conectado e bom de dirigir. Por que, então, não deu certo? Ou melhor: por que não tem futuro? Há vários fatores -- e a reviravolta do mercado em direção aos SUVs é o maior deles. Mas, no caso do Brasil, podemos também acrescentar o reposicionamento da marca Chevrolet ao longo dos anos. Ela vive numa gangorra entre marca aspiracional e marca popular. No momento, embora tenha o carro mais popular do Brasil (Onix), ela parece estar tentando ser aspiracional.

Chevrolet Cruze Sport6: modelo hatchback ficou praticamente isolado no mercado..
Foto: GM / Divulgação

Neste início de século XXI a General Motors (e, por extensão, a marca Chevrolet) foi a montadora que mais mudou sua estratégia de negócios em relação ao final do século passado. Desde 1968, quando lançou o Chevrolet Opala no Brasil, a GM construiu uma imagem de fabricante de carros superiores. Os sedãs da Chevrolet marcaram época. O Opala se transformou em um mito e tem muitos fãs no Brasil. Até mesmo o pequeno Chevette teve seu carisma dentro da linha Chevrolet -- sua configuração de motor dianteiro com tração traseira resultava em uma dirigibilidade agradável.

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Nos anos 80, a GM lançou o Chevrolet Monza. O Monza três-volumes logo se tornou referência de sedã médio confiável, confortável e bem-acabado. Nos anos 90, o Omega -- talvez o melhor Chevrolet já produzido no Brasil -- impôs um alto padrão de qualidade para os carros brasileiros. E o Monza foi substituído pelo Vectra, melhorando a fama da Chevrolet de oferecer bons sedãs.

Mas, no início do século XXI, a GM decidiu ser uma montadora de carros populares. O Chevrolet Celta foi o ícone dessa fase. Mas, ao contrário do Corsa, não trouxe nenhuma inovação ao mercado. O lançamento do Prisma como versão sedã do Celta foi uma demonstração de que os bons sedãs da Chevrolet eram coisa do passado. O Corsa Sedan, rebatizado de Chevrolet Classic, reforçou o apego ao popular. Para piorar, o Astra foi rebatizado de Vectra quando já tinha parado de ser fabricado pela Opel na Europa.

Cruze da segunda geração perde em porta-malas para seus principais rivais, mas isso não explica tudo.
Foto: Sergio Quintanilha / Guia do Carro

O Onix sedã (que salvou o nome Prisma) foi um bom recomeço. Já o Cobalt tinha mais compromisso com o espaço do que com o requinte mecânico. O Cruze da primeira geração estreou na linha substituindo o Chevrolet Vectra-Astra (ou Astra-Vectra) e também significou uma melhora de qualidade no segmento de carros médios, mas havia muita coisa a ser feita -- e o foco da GM, acertadamente, foi o compacto Onix. Durante todo esse tempo, os sedãs japoneses (especialmente o Toyota Corolla) foi criando uma história de confiança com o consumidor brasileiro, aquela mesma que a GM tinha nas últimas décadas do século XX.

Se hoje o Chevrolet Cruze talvez seja um carro injustiçado, pois tem mais qualidades do que suas vendas sugerem, não é culpa só do mercado, mas também das escolhas da própria GM. Vamos ver como as coisas caminham na questão da produção do Cruze na Argentina. Vale lembrar que a GM só tem um SUV competitivo no mercado brasileiro: o Tracker. A Volkswagen já tem T-Cross e Nivus e logo terá o Taos. A Jeep, já tem o Renegade e o Compass e logo terá um SUV 7 lugares. Até a Fiat terá um SUV só para chamar de seu. Nesse ambiente, parece difícil o Cruze escapar da guilhotina.

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