O que é 'cidades-esponja', conceito que tem se popularizado entre especialistas em clima

Termo, criado pelo arquiteto chinês Kongjian Yu, tem como ideia central “parar de lutar contra a água”; entenda como funciona

12 jun 2024 - 05h00
Vista aérea de uma "estrada de esponja" na área de demonstração de carbono quase zero de Boao em 17 de março de 2024 em Boao, cidade de Qionghai, província de Hainan, na China.
Vista aérea de uma "estrada de esponja" na área de demonstração de carbono quase zero de Boao em 17 de março de 2024 em Boao, cidade de Qionghai, província de Hainan, na China.
Foto: Reprodução/Getty Images

Nos últimos meses, o Brasil enfrentou uma tragédia assustadora e vista como consequência das alterações climáticas, que ocorrem não apenas aqui, mas no mundo todo. Por mais que as chuvas intensas façam parte da “natureza”, o nível que temos visto nos últimos anos é um sinal de alerta, segundo cientistas climáticos. 

Com isto em mente, um arquiteto, paisagista e professor da Universidade de Pequim chamado Kongjian Yu desenvolveu uma alternativa para as enchentes urbanas a partir de uma ideia: “deixar a água entrar”. 

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Enquanto explica o conceito para o jornal norte-americano The New York Times, ele aponta que não se pode lutar contra a água, apenas “se adaptar” a ela. Ao invés de instalar uma rede de drenagem ou muretas de contenção, Yu deseja dar espaço para que as enchentes se espalhem em algo chamado “cidades-esponjas”. 

Inspirado no Tai Chi, uma arte marcial chinesa, e em como os antigos lidavam com as chuvas na aldeia em que cresceu, o arquiteto supervisionou através da sua empresa ‘Turenscape’ a construção de parques aquáticos urbanos na China, onde o escoamento das inundações é desviado para penetrar ou ser absorvido pelo solo.

Ao jornal, ele disse que os terraços são plantados com bambu, ervas e gramas nativas, divididas por passarelas de madeira. O local filtra a água, retarda o fluxo do rio e fornece habitat para os peixes locais. Segundo Yu, o objetivo é que até 2030, cerca de 70% da chuva que cai nas cidades com o sistema instalado seja absorvida ao invés de ficar nas ruas

Em 2015, o presidente da época, Xi Jinping, apoiou a ideia e adaptou 16 cidades com a sugestão do arquiteto após uma inundação em Pequim ter matado mais de 70 pessoas, segundo a mídia local. Atualmente, dezenas de municípios possuem as 'cidades-esponjas'. 

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Desde então, a alternativa tem chamado atenção de urbanistas e especialistas em clima, que reconhecem ser mais ecológica. Porém, a maior dúvida é adaptar os terrenos nos centros das cidades, visto que já foram construídos no concreto.

O que dizem os especialistas?

Ao Terra, a fundadora e diretora executiva do Instituto DuClima, que combate o racismo ambiental e a crise climática no Brasil, Naira Santa Rita Wayand apontou que o investimento na ideia seria altamente eficaz e sustentável para a gestão de inundações, mas a eficácia depende de vários fatores. 

“Clima e geografia locais: é crucial adaptar soluções às condições climáticas e geográficas específicas. Integração com infraestruturas existentes, a implementação bem-sucedida requer a integração de infraestruturas verdes com sistemas de drenagem convencionais. E manutenção e gestão, que são essenciais para garantir a funcionalidade da infraestrutura verde”, explica Wayand. 

Ainda segundo ela, há outras abordagens que devem ser consideradas ou combinadas com os princípios das ‘cidades-esponjas’. Como, por exemplo:

  • Sistemas de Drenagem e Esgotos: Aumentar a capacidade e a eficiência dos sistemas de drenagem urbana para lidar com maiores volumes de água.
  • Barreiras e diques contra inundações: Construção de barreiras físicas para proteger áreas vulneráveis contra inundações.
  • Bacias de Detenção de Águas Pluviais: Criação de bacias para reter temporariamente o excesso de águas pluviais e liberá-las gradualmente.
  • Sistemas inteligentes de gerenciamento de água: usando sensores, IoT e análise de dados para monitorar e gerenciar o fluxo de água em tempo real.
  • Modelagem Preditiva: Utilização de modelos climáticos e previsões meteorológicas para prever e preparar-se para eventos de inundação.
  • Regulamentos de Zoneamento e Uso da Terra: Implementação de políticas que restrinjam o desenvolvimento em áreas propensas a inundações.
  • Programas de realocação e aquisição: Realocar comunidades de áreas de alto risco para locais mais seguros.
  • Conscientização e Educação Pública: Educar as comunidades sobre os riscos de enchentes e medidas de preparação.
  • Iniciativas lideradas pela comunidade: Incentivar o envolvimento local na concepção e manutenção de infraestruturas verdes.

“As cidades-esponja representam uma abordagem promissora e sustentável à gestão de inundações urbanas, amplamente apoiada por especialistas em clima. No entanto, combinar estratégias de cidades-esponja com soluções de engenharia tradicionais, tecnologias e medidas políticas robustas pode criar um sistema abrangente de gestão de inundações. A adaptação destas soluções às necessidades e condições específicas de cada área urbana maximizará a sua eficácia e resiliência contra inundações”, conclui a especialista. 

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Fonte: Redação Terra
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