O fipronil, um famoso agrotóxico banido em diversos países da União Europeia (UE), já dizimou ao menos 180 milhões de abelhas somente em 2023, no Brasil. Segundo levantamento feito pela Folha de S. Paulo, as mortes foram registradas nos estados de Mato Grosso, Bahia e Minas Gerais, em diferentes períodos do ano.
Já no Mato Grosso do Sul, a crescente morte em massa de abelhas também foi associada ao pesticida. De 2017 para 2021, a presença do fipronil cresceu de 30,5% para 66,6%, nas amostras avaliadas. Em 2022, este número chegou a 85,7%.
A morte em massa das abelhas pode trazer graves consequências para a humanidade, já que esses animais desempenham papel fundamental na polinização. O alto número de mortes coloca também pesquisadores e apicultores brasileiros em alerta.
Goiás, por exemplo, aprovou lei em abril que restringe o uso da substância. Já Santa Catarina adotou um regulamento mais rígido, proibindo a pulverização com o inseticida, o aumento da fiscalização e do diálogo com cooperativa e produtores para deter práticas erradas. "Conseguimos reduzir em 70% as mortes agudas", explicou Ivanir Cella, presidente da Federação das Associações de Apicultores e Meliponicultores de Santa Catarina.
Apesar dos esforços, especialistas e produtores alertam que é necessária uma ação em âmbito nacional. Atualmente o fipronil é proibido em mais de 45 países.
O que é o fipronil?
O fipronil é um inseticida que atua no sistema nervoso central do inseto provocando morte aguda. Ele é usado para matar formigas, cupins, além de pragas comuns e lavouras como a larva-alfinete no milho e a lagarta-elasmo na soja. No uso doméstico, a substância pode ser encontrada em remédios com ação contra pulgas e carrapatos para cães e gatos.
No Brasil, "ele é usado em diferentes culturas, o que explica a ocorrência de contaminações de abelhas em vários pontos" do País, explicou Ricardo Orsi, professor de veterinária da Unesp (Universidade Estadual Paulista).
O que diz a ciência
Identificar a correlação entre o inseticida e as mortes de abelhas no Brasil levou tempo. "Os surtos começaram no início dos anos 2000. As abelhas chegavam, eu examinava, e não encontrava nenhuma doença ou praga que justificasse a mortandade intensa, do dia para noite, então, passei a congelar amostras", explicou o professor aposentado da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Aroni Sattle.
Em 2018, ele enviou 37 amostras para avaliação. O resultado foi a presença de fipronil como principal agrotóxico preponderante. As avaliações de surtos posteriores identificaram a mesma presença. "Podemos afirmar que 60% a 70% das mortandades são provocadas por ele".
O uso do fipronil na pulverização por avião ou do trator oferece ainda mais riscos principalmente se for feito na época de floração, aumento o risco de abelhas infectadas levarem o veneno até a colmeia, contaminando o enxame.
Ainda segundo a reportagem, as mortes em massa no Mato Grosso foram atribuidas a um único produtor, numa fazenda de algodão, que foi multado em R$ 225 mil. O agricultor não respeitou "a temperatura e o vento recomendados para a aplicação e, naquele dia, ainda ocorreu inversão térmica, potencializando o efeito nocivo por um raio de 26 km [quilômetros]", pontuou a médica veterinária Erika do Nascimento, fiscal do Indea (Instituto de Defesa Agropecuária no Estado).