Amazônia está perto de ponto irreversível, dizem cientistas

Reunidos na COP-26, especialistas alertam que desmatamento, queimadas e mudanças climáticas tornarão inviável a regeneração da mata

12 nov 2021 - 20h06
(atualizado às 21h31)

O desmatamento, as queimadas e as mudanças climáticas deixam a Amazônia cada vez mais perto de um ponto irreversível, a partir do qual a regeneração da floresta se tornará inviável, e a área tenderá a se transformar num grande deserto. A desertificação da floresta terá impactos "catastróficos" para o clima do planeta. O alerta foi feito nesta sexta-feira, 12, na COP-26, em Glasgow, na Escócia, pelo Painel Científico para a Amazônia.

As análises fazem parte do primeiro relatório do painel, que reúne 200 cientistas - a maioria deles de países amazônicos Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa. O documento ressalta a importância da ciência para a tomada de decisões na região. Também encoraja a inovação tecnológica e as soluções baseadas na natureza, juntamente com as soluções sustentadas pelo conhecimento tradicional de indígenas e populações ribeirinhas. Para evitar a catástrofe iminente, o relatório recomenda a suspensão imediata do desmatamento nas áreas mais degradadas. Seria um plano escalonado para atingir o desmatamento zero até o fim desta década e um novo modelo econômico para a região.

"O atual modelo de desenvolvimento está alimentando o desmatamento e a perda de biodiversidade, levando à devastação e mudanças irreversíveis", afirmou o climatologista Carlos Nobre, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, e um dos coordenadores do painel. "Para que a Amazônia sobreviva, precisamos mostrar como ela pode ser transformada de forma a gerar benefícios econômicos e ambientais como resultado de uma colaboração entre cientistas, povos indígenas, comunidades locais, setor privado e governos."

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Vista aérea de região desmatada da Amazônia em Rondônia
28/09/2021 
REUTERS/Adriano Machado
Vista aérea de região desmatada da Amazônia em Rondônia 28/09/2021 REUTERS/Adriano Machado
Foto: Reuters

Pelo menos 17% da floresta já foram totalmente destruídos e outros 17% são compostos de áreas já degradadas. Especialistas estimam que 366,3 mil quilômetros quadrados de mata foram desmatados entre 1995 e 2017. A cada ano, apontam, centenas de milhares de hectares são queimados para abrir espaço para a agricultura, a pecuária e o garimpo.

Pesquisadores afirmam que é preciso agir o mais rapidamente possível para que seja possível zerar o desmatamento na região antes de 2030, conforme foi acordado na COP-26 por mais de cem países, o Brasil entre eles, além de recuperar áreas degradadas. A preservação da floresta, alertam, é crucial para a redução das emissões de gases do efeito estufa, uma vez que ela atua como um sumidouro de CO2. São de 150 a 200 bilhões de toneladas de carbono armazenadas no solo e na vegetação.

A floresta amazônica é um dos elementos mais importantes do sistema climático da Terra. A mata exerce um papel crucial nos ciclos globais da água e na regulação da variabilidade climática. Um volume significativo de água evaporada pela floresta vai para sul por meio dos chamados "rios voadores". É uma das principais fontes de água a alimentar outros ecossistemas e cultivos agrícolas do Centro-Oeste e do Sudeste do País. Além disso, a Bacia Amazônica é fonte de de 16% a 22% de toda a água lançada anualmente nos oceanos.

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Cerca de 47 milhões de pessoas vivem na região amazônica. Entre elas, estão 2,2 milhões de indígenas distribuídos em mais de 400 grupos, falantes de 300 línguas diferentes. Segundo o relatório, os indígenas são cruciais para a conservação e para o desenvolvimento sustentável da floresta e sua biodiversidade. No entanto, alerta, estão sob ameaça. O documento diz que parte das populações perderam direitos nos últimos anos.

"Com os aumentos recentes no desmatamento da maior floresta tropical da Terra, nós precisamos acender o sinal vermelho", afirmou Mercedes Bustamante, professora de Ecologia da Universidade de Brasília (UnB) e também integrante do painel. "Salvar as florestas existentes do desmatamento e da degradação e recuperar os ecossistemas é uma das tarefas mais urgentes de nosso tempo para preservar a Amazônia e seu povo e para lidar com o risco global e os impactos das mudanças climáticas."

À frente da Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica, o líder indígena equatoriano Gregório Marabal fez um apelo emocionado ao fim da apresentação do relatório:

"A Amazônia é nossa casa, vivemos lá há milhares de anos", disse Marabal. "A floresta é um ser vivo, tem espírito, e ela está gritando por uma nova oportunidade para continuar respirando com a ajuda de todos. Temos que seguir respirando junto. Não é possível viver sem árvores, sem biodiversidade, sem montanhas, sem selva amazônica."

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