Os volumes recordes de queimadas que assolam a Amazônia e o Pantanal desde o ano passado não repercutiram em medidas práticas do Congresso Nacional. Há quase dois anos, a Câmara dos Deputados recebeu um projeto de lei que estabelecia uma série de medidas estruturantes para que os governos federal, estaduais e municipais passassem a contar com um plano para enfrentar tragédias como a atual.
O PL 11.276, encaminhado ao Congresso pelo governo do então presidente Michel Temer em dezembro de 2018, instituía a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo. O texto mal passou entre uma comissão ou outra, acabou apensado em outros projetos e nunca mais se ouviu falar dele. Sua última tramitação ocorreu em fevereiro de 2019, quando o texto foi encaminhado a comissões da casa.
Só na fase de elaboração do projeto, foram quase dois anos de discussões entre especialistas, membros do governo e órgãos federais do meio ambiente. As propostas incluídas no PL chegaram a receber apoio do Reino Unido e da Alemanha, em cooperação para realização de experimentos com técnicas de manejo do fogo.
Foram sete oficinas temáticas com a participação de diversos Ministérios e órgão vinculados, totalizando mais de 30 instituições; e três seminários setoriais com representantes da sociedade, Estados e de povos indígenas e comunidades tradicionais, que contaram com a participação de mais de 160 pessoas, 100 instituições e 25 estados. Uma dessas oficinas aconteceu na Chapada dos Veadeiros, em Goiás, comprovando que o uso do fogo, de forma controlada, ajuda a reduzir os incêndios avassaladores que se veem hoje no Pantanal e Amazônia.
Como se trata de uma proposta do Executivo, seu andamento no Congresso depende, essencialmente, de parlamentares da base do governo que demonstrem a relevância do assunto, mas isso nunca ocorreu. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, foi questionado sobre o assunto, mas não se manifestou até o fechamento deste texto.
O Ministério do Meio Ambiente informou que uma proposta nacional de novas regras está em estudo, mas isso depende da adesão dos Estados, porque as licenças de queima controlada são emitidas por órgãos estaduais.
Recorde
Este ano é, de longe, portanto, o ano mais incendiário do bioma que cobre parte do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Em apenas 14 dias, este mês de setembro já se confirma como o mais devastador em número de incêndios no Pantanal, superando todos os índices captados pela série histórica medida pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), desde 1998.
Apenas entre os dias 1 e 14 de setembro, foram identificados 5.300 focos de incêndio no bioma. Ainda na metade do mês, o número já se aproxima ao recorde anterior, ocorrido em agosto de 2005, quando 5.993 focos de queimadas foram captados naquele mês. Nesta terça-feira, 15, portanto, são enormes as possibilidade de este número ser superado.
Os meses de agosto e setembro são, historicamente, os mais intensos em queimadas na região, por serem o auge do período seco. Agosto de 2020 foi o segundo mais intenso da série histórica.
Se for considerado o estrago já causado entre o dia 1 de janeiro e 14 de setembro de 2020, o volume de incêndio é o maior já visto, com 15.453 focos de queimadas neste ano, apenas no Pantanal. Até então, o maior volume anual - de janeiro a dezembro - havia sido registrado em 2005, com 12.536 focos.