Mortes de botos na Amazônia acendem alerta vermelho sobre a crise ambiental

Aquecimento das águas e a forte seca que atinge rios da região contribuem para aumento da mortalidade dos animais aquáticos

17 nov 2023 - 05h00
Especialistas e voluntários atuam no resgate de botos na Amazônia
Especialistas e voluntários atuam no resgate de botos na Amazônia
Foto: Miguel Monteiro/Instituto Mamirauá

A região amazônica enfrenta uma crise alarmante com a mortalidade de botos, e especialistas têm se debruçado sobre as causas e as implicações dessa tragédia ambiental. Uma das principais causas apontadas para o aumento nas mortes destes animais aquáticos é a seca nos rios da Amazônia, além do aumento da temperatura das águas.

A amplitude térmica, aliada à presença de algas potencialmente tóxicas e à seca extrema, emergem como os principais motivos apontados por Mariana Paschoalini Frias, analista de Conservação do WWF-Brasil (World Wide Fund for Nature, em português Fundo Mundial para a Natureza). O aumento da temperatura da água, decorrente das mudanças climáticas, gera um estresse térmico nos botos, comprometendo seu estado metabólico. As áreas mais afetadas são os lagos de Tefé e Coari.

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Visando o recolhimento dos botos e o monitoramento das espécies, uma coalizão entre organizações como a WWF, Ministério do Meio Ambiente, prefeitos, bombeiros, exército, universidades e ONGs, trabalha para acompanhar a situação.

Cláudia Sacramento, analista ambiental e chefe da Divisão de Emergências Ambientais do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), fala sobre o monitoramento, tanto de animais vivos quanto mortos, realizando necropsias para análises biológicas. O ICMBio também faz o monitoramento de parte dos lagos Urupu e Mamiá. As espécies que mais são encontradas nos lagos amazônicos são tucuxi e boto vermelho.

Equipes de diferentes organizações participam de monitoramento de botos na Amazônia
Foto: Jaqueline Lisboa/WWF

As especialistas afirmam que a crise teve início em setembro de 2023, resultando na morte de cerca de 240 botos até o momento. Os lagos Tefé e Coari são algumas das áreas mais impactadas com a seca, que restringiu drasticamente o espaço que é ocupado pelos animais.

O aumento sem precedentes da temperatura da água, combinado com a seca, representa uma ameaça significativa. A falta de precedentes na faixa térmica torna os mamíferos, incluindo os botos, suscetíveis ao choque metabólico.

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“Não há precedentes para essa faixa térmica e a tolerância dos mamíferos em geral não tem tempo de resposta de adaptação, o que provoca o choque metabólico que estamos vendo com os botos. É preocupante que possamos perder muitos animais que têm ciclos de vida longos e intervalos de nascimento longos”, diz Mariana Frias, da WWF.

Estudos

O monitoramento desses animais é dividido entre os animais vivos e os que são encontrados mortos, segundo explica Cláudia Sacramento. “A gente precisa entender qualquer alteração comportamental desses animais no rio”, explica a especialista.

“A gente tem uma equipe que se desloca no lago Coari, cerca de 30 quilômetros lago acima, monitorando o comportamento desses animais, fazendo uma contagem de quantos animais são avistados, e também coletando informações da temperatura da água. Nós temos sensores instalados no lago, então a gente monitora a temperatura também”, completa.

Equipes monitoram praias em busca de botos mortos, que vão para necrópsia
Foto: Miguel Monteiro/Instituto Mamirauá

Já o setor dos animais mortos é responsável por monitorar as praias para encontrar carcaças, que são recolhidas e vão para a necrópsia. Segundo Mariana Frias, após a coleta das carcaças, pesquisadores e voluntários realizam a necrópsia para coletar amostras biológicas para diagnóstico: “Coletam material para depositar em um acervo (os ossos) e o restante é enviado para um aterro controlado". O objetivo é avaliar a causa primária da morte e relacionar à seca.

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Outras equipes, do ICMBio, percorrem os lagos para averiguar condições dos botos vivos
Foto: Miguel Monteiro/Instituto Mamirauá

Cláudia ressalta que não está sendo realizado resgate de animais vivos, apenas o monitoramento e acompanhamento comportamental. No momento, eles não apresentam nenhum comportamento atípico. “Principalmente porque os tucuxis cinza são muito sensíveis e muito estressados. Então, manejar esses animais requer, além de muita experiência, uma estrutura muito grande. E o risco deles morrerem, a partir do momento que a gente pega neles, é muito grande.”

Bioindicadores

A mortandade dos botos é preocupante porque, segundo as especialistas, estes animais são bioindicadores. Isso significa que são animais que medem a qualidade do ambiente e são os primeiros que respondem às mudanças ambientais, como por exemplo, o aumento das temperaturas e a seca.

“Muito provavelmente, o que eles estão passando, pode ser que a gente também passe. E a gente também está passando. O aumento de pessoas com doenças respiratórias é consequência disso”, argumenta Cláudia.

Após encontrados, os botos mortos são levados para necrópsia
Foto: Miguel Monteiro/Instituto Mamirauá

Mariana Frias, da WWF, destaca a urgência de ações para que esses animais sejam salvos. “Exigência de ações e compromissos adotados pelos países para reduzir os efeitos catastróficos das alterações climáticas,  mudança no modelo de consumo de bens renováveis e consumismo”, são algumas das soluções possíveis neste momento, segundo ela.

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Cláudia Sacramento, do ICMBio, ressalta que o evento de seca extrema e o aumento da temperatura da água são as causas primárias para as mortes dos botos. Ela alerta, inclusive, sobre a necessidade do ser humano repensar seu papel na preservação ambiental.

“A gente, enquanto sociedade, precisa entender a nossa importância de atuação para termos um ambiente com maior qualidade, porque isso vai nos afetar. A seca está afetando a vida de muita gente. Quantas famílias a gente tem isoladas precisando de apoio das instituições governamentais para garantir hoje o pão na mesa, tendo que ter essa assistência, que há pouco tempo atrás não precisavam porque tinham condições de ir buscar fazer sua pesca, viver do seu trabalho?”, questiona.

“Precisamos começar a pensar quais atitudes que a gente pode fazer para mudar essas consequências. Então isso também é responsabilidade da sociedade como um todo. E, com certeza, fazer o papel de cobrar politicamente essas mudanças, essa postura, é importante, necessária e estratégica para que a gente consiga dar qualidade de vida para os que virão, para os que estão. E isso também vai afetar a conservação do ambiente”, considera.

Fonte: Redação Terra
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