Brasil terá aumento de mortes por ondas de calor, diz estudo

Pesquisa internacional, com participação da USP, coloca País entre os mais afetados pelas altas temperaturas

1 ago 2018 - 03h11
(atualizado às 08h33)

Um novo estudo internacional revela que o número de mortes causadas por ondas de calor aumentará sem parar nas próximas décadas, caso não sejam tomadas providências de adaptação às mudanças climáticas. Entre os 20 países avaliados na pesquisa, o Brasil está em terceiro lugar nas projeções de aumento das mortes ligadas ao calor. Nos dois primeiros lugares estão a Colômbia e as Filipinas.

De acordo com os autores do estudo, o maior aumento das mortes ocorrerá nas regiões tropicais do planeta - em especial nos países de baixa renda -, mas também haverá expressivo aumento das mortes na Austrália, na Europa e nos Estados Unidos. Neste momento, diversos países do Hemisfério Norte estão sofrendo com fortes ondas de calor.

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Foto: batuhan toker / iStock

O estudo liderado por cientistas da Universidade Monash (Austrália) foi publicado nesta terça-feira, 31, na revista científica PLOS Medicine. Um dos autores é o médico brasileiro Paulo Saldiva, diretor do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo (USP).

Segundo os autores, a pesquisa é a primeira a fazer uma previsão do número de mortes associadas às ondas de calor. Eles esperam que o resultado ajude os tomadores de decisão a planejar estratégias de adaptação e mitigação para as mudanças climáticas.

Para realizar a pesquisa, os cientistas desenvolveram um modelo para estimar o número de mortes relacionadas às ondas de calor em 412 cidades de 20 países, no período de 2031 a 2080. "No futuro, as ondas de calor serão cada vez mais frequentes, mais intensas e terão duração maior", disse um dos autores do estudo, Yuming Guo, da Universidade Monash.

"Se nós não encontrarmos um jeito para mitigar a mudanças climáticas - reduzindo assim o número de dias de ondas de calor - e não ajudarmos as pessoas a se adaptarem a elas, haverá um grande aumento das mortes ligadas a esse fenômeno, especialmente em países pobres mais próximos da região equatorial", afirmou Monash.

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Com o modelo desenvolvido pelos cientistas, foi possível projetar o aumento da mortalidade associada às ondas de calor no futuro em diferentes cenários, caracterizados por níveis de emissões de gases de efeito estufa, grau de preparação e estratégias de adaptação e densidade populacional das regiões estudadas.

"O objetivo do estudo era ver o que acontecerá com a saúde humana em diferentes cenários climáticos, em cidades de diferentes latitudes e longitudes. No Brasil, as cidades litorâneas têm um bom controle térmico e têm grandes problemas com ilhas de calor. Mas nossos dados mostram que cidades do Centro-Oeste e do Sudeste, como São Paulo, sofrerão bastante", disse Saldiva ao "Estado".

Segundo Saldiva, não basta apenas fazer projeções sobre a elevação das temperaturas em cada cidade. Para saber os efeitos do futuro aumento das ondas de calor sobre a mortalidade, é preciso levar em conta as características de cada localidade.

"As cidades respondem às variações climáticas de maneiras diferentes. Algumas cidades como Toronto (Canadá) e Helsinque (Finlândia), por exemplo, não têm resposta alguma, se tornaram muito resilientes. Mas muitas respondem ao aumento do calor com um aumento das mortes ", explicou Saldiva.

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Outras cidades, como Nova York (Estados Unidos) e São Paulo, respondem tanto ao frio como às ondas de calor, segundo Saldiva, com o aumento das mortes. "Mas cada local tem sua própria definição de onda de calor. Se em São Paulo a mortalidade começa a aumentar quando a temperatura passa dos 28 graus, em Teresina (PI) isso só acontece quando o calor passa dos 34 graus", disse Saldiva.

Quando foram consideradas todas as características das mais de 400 cidades avaliadas no estudo, as que mostraram maior aumento potencial das mortes nas próximas décadas são as colombianas, filipinas e brasileiras, segundo Saldiva.

"A  mensagem do estudo é que o aquecimento global já está em curso - como podemos observar nesse inverno completamente atípico em São Paulo e nas ondas de calor que estão matando gente no Hemisfério Norte - e que os problemas serão mais graves nos locais mais despreparados e com menos recursos."

De acordo com outro autore da pesquisa, Antonio Gasparrini, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres (Reino Unido), neste momento vários países - como Índia, Grécia, Japão, Rússia e Canadá - estão sendo afetados por fortes ondas de calor que estão matando milhares de pessoas e deixando dezenas de milhares com doenças ligadas ao calor.

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"É bastante preocupante. A pesquisa mostra que é altamente provável que, com as mudanças climáticas, teremos um aumento na frequência e na severidade dessas ondas de calor. No entanto, as evidências sobre os impactos na mortalidade em escala global têm sido limitadas", disse Gasparrini.

"Esse estudo, que é a maior pesquisa epidemiológica dos impactos projetados de ondas de calor no contexto do aquecimento global, sugere que as mortes associadas a ondas de calor podem aumentar dramaticamente, especialmente em países populosos de áreas tropicais e subtropicais", afirmou o cientista.

"A boa notícia é que, se mitigarmos as emissões de gases de efeito estufa o bastante para atingir cenários compatíveis com os compromissos do Acordo de Paris, os impactos terão uma grande redução", declarou Gasparrini.

Recomendações

No estudo, os cientistas fizeram uma série de recomendações para evitar que as ondas de calor cada vez mais fortes causem mortes em grande escala. Eles indicam seis intervenções de adaptações, especialmente importantes para países de regiões tropicais e subtropicais.

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No plano individual, a recomendação é que as pessoas se informem mais e passem adiante o conhecimento. No plano interpessoal, é recomendado o compartilhamento de informações, a comunicação, o uso de argumentos persuasivos e o esforço educacional. No plano da comunidade, as recomendações incluem fortalecer as infraestruturas comunitárias, incentivar o engajamento, focar em grupos vulneráveis.

No plano institucional, os cientistas recomendam a adoção de políticas institucionais, padrões de qualidade, procedimentos formais e regulações. No plano ambiental é recomendado o planejamento urbano, aumento da cobertura de árvores e instalação de bebedouros públicos.

No plano das políticas públicas, as recomendações envolvem melhora dos serviços de saúde, redução da pobreza, redistribuição de recursos, educação e um sistema de alerta para ondas de calor.

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