Criada contra desmatamento, força militar atua para garantir hidrelétricas

Serviço militar foi criado para acabar com a devastação da Amazônia. Mas tropas também atuam como segurança em projeto de construção de usina no rio Tapajós. Índios e população ribeirinha pedem o fim da operação

19 abr 2013 - 13h46
(atualizado às 19h30)

A Força Nacional de Segurança Ambiental foi criada para combater o desmatamento ilegal na Amazônia. Seis meses depois, parte da tropa executa uma missão contraditória, que nada tem a ver com a proteção da mata: garantir a construção de novas hidrelétricas na região.

O serviço ambiental de inteligência militar foi fundado em outubro de 2012. Na época, equipes foram enviadas à Amazônia para cumprir a operação Onda Verde. A meta era apoiar a fiscalização do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) no combate ao comércio ilegal e derrubada criminosa da floresta.

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Segundo o Ministério da Justiça, em novembro do ano passado, por exemplo, só três pessoas foram presas pelo desmatamento de mais de 256 hectares no Estado do Pará, área equivalente a 284 campos de futebol. Com a ajuda de homens do Exército, Marinha e Aeronáutica, fiscais do Ibama apreenderam 20 mil m³ de madeira em tora, além de balsas e tratores. Mais de 1,5 bilhão de multas foram aplicadas.

Apesar da presença dos soldados, os alertas de desmatamento na Amazônia Legal subiram 26% de agosto de 2012 a fevereiro de 2013, em comparação com o mesmo período anterior. Os dados são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Luciano de Meneses Evaristo, do Ibama, contesta. "O fato de o sistema reconhecer áreas de desmatamento não quer dizer que elas realmente existam. Em 50% dos casos, a nossa equipe chega até o local e encontra ou lençóis d'água, ou montanhas", disse à DW Brasil.

Ainda assim, o combate ao desmatamento não recebe a atenção integral da tropa criada especiamente para esse fim. Recentemente, homens foram escalados para garantir a segurança de pesquisadores do Ibama no Pará. Os cientistas em questão são responsáveis pelo estudo de impacto ambiental e viabilidade técnica e econômica das hidrelétricas previstas na região do rio Tapajós.

Segundo a Secretaria Nacional de Segurança, o número exato de soldados – entre eles profissionais da Marinha, Aeronáutica e do Exército – não pode ser divulgado por razões estratégicas. Estima-se, no entanto, que cerca de 240 homens tenham sido mandados para a região para apoiar os pesquisadores.

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Hidrelétricas como prioridade

A decisão de mandar as tropas ao Pará foi tomada depois que o Ministério de Minas e Energia solicitou ao Ministério da Justiça o apoio de equipes de segurança para garantir a integridade física do grupo e da população local. Base para o ultimato foi a alegação do governo de que pesquisadores teriam sido atacados por índios.

As novas hidrelétricas no Tapajós são prioridade do PAC, Programa de Aceleração de Crescimento do governo federal. As tropas da Força Nacional de Segurança Ambiental estão no local para garantir que os trabalhos prossigam sem a interferência de povos indígenas e população ribeirinha que moram às margens do rio.

"Duas hidrelétricas – São Luiz de Tapajós e Jatobá – já funcionam. A previsão é que a próxima barragem prevista inunde cerca de 20 mil hectares", disse à DW Brasil Brent Millikan, diretor do programa International Rivers.

O Ministério Público entrou com uma ação contra a construção das hidrelétricas para evitar um desmatamento em larga escala e os impactos ambientais. O governo recorreu contra a ação e ganhou o direito de dar continuidade ao projeto.

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Versão das tribos indígenas é outra

Segundo Millikan, os índios e os ribeirinhos não foram avisados de que novas hidrelétricas serão construídas no local onde moram. “Não houve nenhum processo de consulta por parte do governo federal antes de tomar a decisão política de fazer as barragens. Os índios tentaram argumentar com os pesquisadores, e a resposta do governo foi mandar tropas e aviões”, relata.

Para Luciano de Meneses Evaristo, do Ibama, "os índios estão confundindo as coisas" e estão agindo agressivamente, assim como agiram na operação Eldorado, quando policiais "apenas reagiram ao ataque das tribos". Ele diz que os índios não entenderam o propósito das equipes e dos homens que os defendem.

O diretor da International Rivers contesta. “Em novembro de 2012, aconteceu a operação Eldorado, de combate ao garimpo, em uma aldeia Mundurucu e um índio foi morto por policiais que usavam armamento pesado", afirma Millikan. "Os índios já veem qualquer aproximação como ameaça depois disso. Eles fizeram uma carta pedindo que os soldados e pesquisadores se retirem das margens do Tapajós. Eles disseram que não queriam guerra, mas que se o governo insistir em invadir as terras deles, aí sim, haverá uma guerra.”

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