Especialista explica os sinais de alerta e como toda a sociedade deve agir para coibir os casos
Uma tragédia anunciada. No dia 12 de agosto de 2024, o estudante Pedro Henrique dos Santos infelizmente tirou a própria vida em Osasco, São Paulo. Ele tinha apenas 14 anos e o suicídio ocorreu semanas após denunciar ser vitima de bullying por outros colegas. O falecimento precoce de um rapaz que, até então, era cheio de vida e planos, viralizou nas redes sociais após uma cobertura da revista Piauí, e trouxe à tona uma discussão já antiga, mas que ainda se faz necessária: o efeito devastador que o bullying pode causar à mente das vítimas.
Não é só brincadeira!
"Um aspecto muito preocupante do bullying é que suas consequências variam em duração e intensidade. Elas podem ser amenas, assim como podem ser extremamente destrutivas. Os casos mais graves podem levar ao desenvolvimento de transtornos, como depressão, ansiedade e transtorno de estresse pós-traumático. Além disso, podem ocorrer eventos de automutilação, ideação e até tentativa de suicídio", explica Ana Wasilewski, psicóloga clínica especializada em crianças e adolescentes.
A especialista pontua que consequências comuns são o impacto negativo sobre a autoestima da vítima, resultando em queda no desempenho escolar, isolamento e inibição social. "A longo prazo, aparecem outras consequências, como dificuldade de manter relacionamentos saudáveis, desconfiança, agressividade e comportamentos de risco na vida adulta", alerta.
Bullying é coisa séria!
Dados do Colégio Notarial do Brasil, em 2023, registraram em cartório chocantes 121 mil atos de bullying e cyberbullying no Brasil, uma média de 10 mil casos por mês. A situação fica mais grave quando pensamos que existe a subnotificação, e nem todos os casos são percebidos ou denunciados, já que ainda persiste no imaginário que essa situação é apenas 'brincadeira'. "Muitas vezes, a minimização do bullying está associada à falta de informação ou à normalização da agressividade, especialmente em contextos em que a competitividade e a hierarquia são valorizadas. Felizmente, muitas pesquisas vêm sendo produzidas nos últimos anos para derrubar esse mito, mas é muito importante que todas as pessoas se engajem nessa luta", pontua a psicóloga.
"Para mudar essa percepção, é fundamental que todos os ambientes adotem estratégias que mostrem, de forma clara, o impacto emocional, social e psicológico do bullying, além de destacar a importância da empatia e do respeito nas relações humanas", comenta.
Encarar a realidade é essencial
Ana afirma que uma das razões para tantos adultos não conseguirem encarar a gravidade do bullying é justamente a resistência em se responsabilizarem. "Primeiro, a sociedade é o palco dos ideais de comportamento dos jovens. Quer dizer, eles repetem o que veem adultos fazendo - inclusive atitudes categorizadas como bullying. Além disso, muitas pessoas adotam uma postura defensiva quando se trata desse tema, porque é difícil admitir que você estava envolvido num caso desses. Nesse ponto, expressar vulnerabilidade e relatar como o bullying afetou sua própria vida - seja enquanto agressor, testemunha ou vítima - pode ajudar a refletir."
Como saber se meu filho está sofrendo bullying?
Ana explica que, geralmente, o primeiro grande sinal são mudanças bruscas de comportamento. "O filho passa a evitar falar da escola, pedir para faltar às aulas ou evadir do colégio, ter uma queda no desempenho escolar, assim como ter pouca interação com os colegas. Entre os aspectos emocionais, pode haver uma queda na autoestima, irritabilidade, mudanças bruscas de humor, apatia ou tristeza", exemplifica.
Outros pontos de atenção são o sono e a alimentação. A psicóloga descreve que mudanças bruscas no sono e alterações no apetite também são sinais, além de marcas de ferimentos, seja por automutilação ou por violência. "No caso do cyberbullying, um sinal comum é o jovem deixar de se interessar em usar os aparelhos eletrônicos ou apagar contas nas redes sociais. Ao notar algum desses sinais, é fundamental mostrar-se aberto para o diálogo e ser acolhedor, sem julgar ou pressionar a criança", aconselha.
O papel dos pais e da escola
É essencial que os educadores também sejam preparados para identificar e lidar com o bullying de forma adequada. Isso envolve reconhecer sinais de alerta — como o isolamento de um aluno e mudanças de comportamento — bem como estratégias eficazes de intervenção. "A intervenção deve ser baseada no diálogo, sendo também necessário que haja consequências claras para o comportamento inadequado."
O papel dos pais de filhos que estão praticando bullying é fundamental e determinante para o desfecho, nesses casos. O primordial é entender que a postura deles vai representar um modelo de comportamento para a criança. Quanto mais violentos forem, mais violenta a criança também será. Muitas crianças que praticam bullying normalizaram esse comportamento após serem vítimas", esclarece. "O trabalho dos pais deve ser de incentivar uma reflexão sobre responsabilidades. "Depois, os pais precisam ser claros e manter-se firmes nos valores familiares para restabelecer limites e incentivar a criança a pedir desculpas à vítima e reparar seu erro", aconselha.
Lutar contra o bullying é tarefa de todos
Ana aponta que outro mito comum é acreditar que o bullying está limitado ao ambiente escolar ou é uma responsabilidade exclusiva da escola. "A escola deve promover uma cultura de respeito e diversidade. O que faz isso são políticas claras contra o bullying e iniciativas educativas voltadas para empatia e resolução de conflitos, com foco em uma socialização saudável. Mas não é só a escola que deve ter essa postura, é importante que a sociedade como um todo tenha consciência desse problema e busque adotar uma postura combativa", finaliza a especialista.