Pode se preparar, porque agora é lei. Em dezembro a gente já tinha contado para vocês aqui na coluna que o Senado havia aprovado a medida e que só faltava a sanção do presidente Lula, o que aconteceu na última segunda feira.
Salvo em casos de saúde (como os jovens que usam o aparelho para o controle de condições como diabetes, por exemplo) ou quando o uso for solicitado pelo professor para a execução de algum trabalho pedagógico, o celular vai ter que ficar desligado ou longe do alcance dos alunos.
Nos países e cidades brasileiras que já adotaram a proibição, depois de uma fase inicial de adaptação, os professores notam um aumento do foco e da atenção nas aulas, e os alunos relatam uma melhora nos contatos sociais, com a redescoberta de formas de interação que não dependam de mensagens e redes.
O impacto negativo e os riscos que o celular têm na saúde mental, nas habilidades sociais e no desempenho escolar dos jovens são tão reconhecidos pela ciência e pelos organismos internacionais que o projeto de lei conseguiu unir de forma pouco habitual partidos de esquerda e de direita, fato raro no conturbado cenário politico brasileiro, e teve uma aprovação relativamente rápida no Congresso.
Mas não basta a lei e a escola proibirem, se os pais não perceberem que essa responsabilidade também é deles. As famílias vão ter que participar ativamente do processo de educação digital dos filhos. Isso passa por, além de ratificar e apoiar o esforço dos professores, trabalhar os limites de uso em casa e, claro, servir como modelo de moderação no emprego das tecnologias.
E o significa ser exemplo? Não basta dizer que os filhos não podem usar o celular nas refeições ou nos períodos de estudo. Os pais também devem mostrar, por exemplo, que é preciso limitar os horários em que recebem e enviam mensagens de trabalho, que não teclam ao dirigir ou, ainda, que não usam o aparelho para falar durante o almoço e o jantar.
Talvez esse esforço seja ainda maior para os adultos, imersos em uma sociedade cada vez mais tecnológica, em que o esgotamento e o burnout batem na porta de casa o tempo todo. Sem enfrentar e repensar esse limite pessoal, fica mais difícil fazer parte dessa cadeia de educação digital dos filhos.
Os jovens que estão hoje na educação básica são majoritariamente o que se convencionou chamar de geração alfa (nascidos entre 2010 e 2025), também conhecidos como nativos digitais.
Para essas crianças que receberam tablets como “babás digitais” desde os primeiros meses de vida para assistir filmes e jogos e deixar algum tempo livre para os pais, “desmamar” das tecnologias não vai ser fácil. Mas para o bem da saúde mental, das habilidades sociais e do desempenho escolar deles é preciso investir nessa moderação.
Já para a educação digital da geração beta, que oficialmente começou a nascer nos primeiros dias de 2025, e que possivelmente vai atravessar o século 21, é fundamental incorporar os aprendizados dos últimos anos quanto ao uso das telas na infância e adolescência, ainda mais diante de um cenário que promete intenso desenvolvimento das tecnologias, sobretudo da inteligência artificial.
Adiar o máximo possível os primeiros contatos com as telas é uma ideia. Trabalhar com limites de tempo de uso mais claros desde a infância é outra. E pensar em uma escola sem celulares, que investe em outras formas de interação social e em atividades alternativas de lazer também faz parte desse pacote.
Mas o maior desafio é ir modelando e adequando, ao longo da vida e do processo de desenvolvimento cognitivo dos jovens, uma educação em que o digital seja parte das possibilidades e não a única saída possível. Um objetivo bastante complexo para um mundo em que a tecnologia é a cada dia mais importante. Mas quem é que prometeu que ia ser fácil? Vamos nessa!
Jairo Bouer é médico e escreve semanalmente no Terra Você.