As eleições municipais se aproximam e temos sido expostos a diversos debates entre os candidatos nas principais cidades do país. Como você tem se sentindo em relação ao espetáculo quase teatral, muitas vezes com altos teores de agressividade, que temos assistido? E, já que estamos na primeira semana do Setembro Amarelo, mês em que tentamos reduzir estigmas e preconceitos em relação à saúde mental, vale perguntar: os debates têm feito bem para você?
No Setembro Amarelo falamos muito na importância de cada um de nós se cuidar melhor e pensar em estratégias de prevenção em saúde mental. Para isso é importante o autoconhecimento e a quebra dos tabus que dificultam que a gente fale sobre aquilo que estamos sentindo. O silêncio nunca é a melhor estratégia para a gente lidar com a angustia e o sofrimento. Falar pode mudar nossa perspectiva em relação às dificuldades enfrentadas e facilitar o acesso ao atendimento.
Mas nossa saúde mental é multifatorial. A genética, a história de vida, as características individuais, as questões econômicas e sociais, as relações familiares e o ambiente e momento histórico em que vivemos têm seu peso na complexa equação que rege como nos sentimos. Hoje vamos falar menos das individualidades, e mais de como o coletivo pode impactar nossa percepção de qualidade de vida e de bem-estar.
O Brasil tem ocupado nos últimos anos posições muito ruins em relação a saúde mental da sua população. Somos considerados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) um dos países mais ansiosos e depressivos do mundo. Além disso, nos rankings que medem a felicidade das nações ocupamos sempre postos modestos. E o que explica esses resultados?
Violências, insegurança econômica, ausência de proteção social, preconceitos, bullying, corrupção, impunidade, tudo isso “contamina” o ecossistema emocional em que vivemos e pode ser um forte fator de vulnerabilidade para o adoecimento psíquico.
No mundo polarizado em que vivemos, o ambiente político piora no momento das eleições, o que fica ainda mais evidente nos debates e postagens dos candidatos em suas redes sociais. O nível de violência é gritante. Cada vez se discute menos ideias e projetos de governo (o que deveria ser o objetivo final das campanhas e dos embates) e se investe mais na tentativa de desmoralização e desqualificação dos adversários, tudo isso com o objetivo claro de “jogar” para a audiência, de “lacrar”, de “viralizar” em cima de patéticas encenações.
Claro que há honrosas exceções e candidatos que se recusam a fazer esse papelão. Mas, na hora do vale tudo, para derrubar quem está crescendo nas pesquisas de opinião pública usando estratégias questionáveis, muitos podem apelar e se jogar nesse ringue deprimente.
É triste! Mas o pior é que esse clima pode ampliar a percepção negativa que parte da população tem dos políticos, do futuro das cidades e do sucesso do país, o que sedimenta terreno para que as pessoas se sintam mais infelizes por aqui, o que claramente impacta a saúde mental.
Uma estratégia simplista seria ignorar debates, notícias e redes sociais desses candidatos já que eles não agregam propostas e ampliam nossa decepção com a política. Movimento fácil de ser feito, mas que pode dar um espaço perigoso para que alguns deles conquistem votos de eleitores menos críticos e, eventualmente, vençam o pleito.
Talvez uma postura mais crítica, exigindo que eles entreguem o que devem, ou seja, planos de governo, propostas concretas, orçamentos, limites e dificuldades de implantação, ao invés de adotarem comportamentos infantilizados e narcisistas que não interessam de forma alguma ao bem-estar da comunidade, das cidades e de cada um de nós. Viva a saúde mental e abaixo as baixarias!
*Jairo Bouer é psiquiatra e escreve semanalmente no Terra Você.