Já imaginou o que poderia acontecer se nosso cérebro fosse “estragado” pelas informações a que somos expostos? Sim, sabemos que álcool, cigarro e outras drogas podem “queimar” neurônios e trazer prejuízos para nosso pensamento, memória, atenção, raciocínio e comportamento. Mas será que a qualidade do que consumimos em nosso celular pode ter efeito semelhante?
Para ser mais literal à tradução do inglês, "brainrot" é um termo que vem sendo utilizado para falar de uma certa “podridão cerebral”, provocada pela exposição contínua a conteúdos fúteis na internet, que nada acrescentam em termos de aprendizado ou cultura.
São os intermináveis vídeos curtos, memes, piadinhas e outras bobagens do gênero que chegam a nós principalmente pelas redes sociais e que nos fazem gastar cada vez mais tempo na frente das telas.
O resultado é um sono mais curto e de pior qualidade, menos tempo disponível para atividade física, lazer, artes e educação e cada vez mais dificuldade em desligar as tecnologias digitais.
Muita gente acaba usando esse tempo com o celular na mão para relaxar e consumir um entretenimento rápido que não demanda concentração ou trabalho mental. E com os diversos algoritmos identificando aquilo que retém nossa atenção, é só repousar os olhos na frente da tela para passar horas sem precisar fazer nada a não ser assistir passivamente o que as plataformas oferecem.
Mas é justamente aí que pode estar o problema. O nosso cérebro pode se acomodar diante desse tipo de informação e não exercer de forma adequada habilidades como pensar, refletir, imaginar, criar, entre outras tantas funções cognitivas.
Neurônios (nossas células nervosas) constituem áreas de conexão conhecidas como sinapses que vão, por sua vez, compor os diversos circuitos que fazem funcionar nosso cérebro. Sinapses são estruturas dinâmicas. Ao serem estimuladas, elas se reorganizam e ampliam nossas potencialidades. Mal utilizadas, elas podem “atrofiar”, limitando nossas ideias e raciocínio.
O termo brainrot não é novo nem tampouco reflete um diagnóstico neurológico ou psiquiátrico, mas tem ganhado força nas redes nos últimos meses em diversos vídeos que questionam se os usuários não estão entrando nessa onda e “estragando” seu cérebro.
O que parece piada ou brincadeira pode, na verdade, traduzir um fenômeno que tem se tornado mais comum: a percepção que está cada vez mais difícil largar o celular para se concentrar em outras atividades.
Não é à toa que escolas e redes de ensino no mundo todo começam a propor que elas sejam ambientes mais “desconectados”, para que os jovens possam focar no seu aprendizado e interagir mais e melhor uns com os outros.
Em casa, o trabalho dos pais também não é menos importante. Monitorar e restringir o uso das redes sociais pelos mais novos e “ensinar” os adolescentes a monitorar seu próprio consumo, percebendo quando estão ultrapassando limites razoáveis de tempo de tela, ou ainda, quando estão expostos unicamente a conteúdos fúteis e banais que pouco agregam à sua vida.
Mudar comportamentos não é tarefa fácil, mas escolas, especialistas e pais têm que trabalhar em conjunto para evitar que as tecnologias ao invés de exponenciar as capacidades e potencialidades dos jovens, acabem limitando seu desenvolvimento cognitivo, o que seria terrível para o seu futuro.
*Jairo Bouer é médico psiquiatra e escreve semanalmente no Terra Você