Um novo estudo feito na Austrália com mais de 5 mil estudantes revelou que adolescentes com sintomas de depressão, saúde mental precária, estresse moderado ou alto e sensação de bem-estar comprometida têm mais chances de consumir cigarros eletrônicos, o popular vape.
Mais de 8% dos alunos de 7º e 8º anos de escolas australianas já haviam experimentado os vapes ou pods. No Brasil, dados do IBGE apontam que mais de 20% dos adolescentes brasileiros já experimentaram cigarros eletrônicos.
Em um momento em que os jovens do mundo todo vivem desafios importantes em relação à sua saúde mental, é fundamental entender como é possível prevenir o consumo desses dispositivos que inundam o organismo de nicotina, uma substância bem conhecida pelo alto risco de provocar dependência.
De acordo com o estudo “Our Futures Vaping Trial” a idade média em que se iniciou o consumo de cigarros eletrônicos foi 14 anos. Outra pesquisa da Universidade de Sidney mostra que a taxa de uso de vapes e pods na faixa dos 12 aos 15 anos aumentou de 10% para 24%, entre 2017 e 2023, na Austrália.
Estudos em outros países também vêm apontando a relação dos cigarros eletrônicos com sintomas de depressão, ansiedade e estresse entre os mais jovens. Uma das hipóteses é que eles estariam recorrendo mais aos cigarros eletrônicos em uma tentativa inconsciente de “tratar” desconfortos emocionais ou dificuldades de comportamento, já que a nicotina tem a propriedade de modular emoções e aliviar alguns desses sintomas.
Outro aspecto que ajuda a entender o aumento do consumo é o apelo de modernidade que esse tipo de dispositivo traz para os jovens. Enquanto o cigarro tradicional está hoje associado a um comportamento ultrapassado, sem “glamour” nenhum (como teve para as gerações anteriores), os vapes e pods trazem a imagem de um produto altamente tecnológico, conceito muito caro às gerações Z e alfa. O risco percebido em relação aos dispositivos eletrônicos também é bem menor do que em relação ao cigarro.
Além disso, muitas das essências dos vapes e pods têm sabor ou aroma adocidados, agradáveis, o que também torna seu consumo ainda mais fácil. Os dispositivos cabem no bolso e, da mesma forma que o celular, podem ser acessados a qualquer momento. Não existe um ritual tão marcado como no caso dos cigarros tradicionais, em que a pessoa tem que criar uma ocasião e fazer uma pausa de alguns minutos para poder fumar.
O grande problema é que os vapes podem provocar dependência rapidamente, fazer os jovens buscarem outras fontes de nicotina (como cigarros tradicionais e narguilé, por exemplo), além de cada vez mais estarem associadas a problemas graves de saúde, como quadros pulmonares inflamatórios e eventos cardiovasculares.
Apesar da proibição da venda desses dispositivos aqui no Brasil, eles são facilmente adquiridos pela internet ou mesmo em festas e baladas. Existe um projeto de lei, de 2023, que prevê a regulamentação da comercialização dos vapes e pods que se, por um lado, passariam a ter que seguir algumas normas e obter certificações, do outro lado, poderiam ficar ainda mais acessíveis, o que tornaria a dependência à nicotina novamente um grande problema de saúde publica entre os mais novos.
Para reduzir esse impacto é importante esclarecer os jovens sobre os riscos do consumo de vapes, mostrar que não tem nada de bacana ou “descolado” se tornar dependente de nicotina, que além de ter alto poder de adição, está intimamente ligada a problemas graves de saúde. E ainda é importante mostrar que quem não está bem do ponto de vista da saúde mental precisa de ajuda especializada e tratamento, e não ficar sofrendo sozinho, ficando ainda mais vulnerável ao abuso dos vapes.
*Jairo Bouer é psiquiatra e escreve semanalmente no Terra Você.