Stefani decidiu pelo “celibato amoroso” depois que teve relações sexuais com um homem e ele se recusou a passar as informações de saúde dele. Daniela (nome fictício), após várias decepções amorosas e horas de sono perdidas por causa de relacionamentos fracassados, também optou pelo celibato. E elas não são as únicas. Neste 8 de Março, Dia Internacional das Mulheres, conheça a história dessas mulheres heterossexuais que estão fazendo um "detox" de homens por escolha própria.
Lá da gringa, surgiu um termo para explicar este “estilo de vida” adotado por algumas: "boy sober". Em tradução livre: sobriedade de homem. Esse fenômeno se refere a onda cada vez maior de mulheres que optam pelo não-envolvimento romântico ou até mesmo sexual com homens héteros após decepções consecutivas – sumiços repentinos, traições, abusos…
Ao invés de gastar tempo e energia com relacionamentos amorosos — coisa que, cá entre nós, está enraizada na sociedade (como bem sintetiza a pensadora brasileira Valeska Zanello: “os homens são ensinados a amar as coisas; a mulher, aos homens”) — elas preferem investir nelas mesmas.
A empresária e professora Stefani Paranhos, de 35 anos, por exemplo, começou o período celibatário há pouco, em fevereiro, mas com um objetivo em mente: estudar para um concurso público. “Homem, querendo ou não, desvia muito da nossa atenção. Decidi focar em mim, agora”, disse em entrevista ao Terra.
Decidi pelo 'boy sober' porque perco muito tempo na caça, no envolvimento e nas frustrações amorosas. Quero que minha energia esteja focada em mim.
Stefani Paranhos, 35 anos
Ela já esteve em outros relacionamentos amorosos, inclusive um namoro de 10 anos, e não foi apenas o caso do homem que se recusou a entregar os exames de saúde que a fez se decidir pelo celibato. Ela conta que, antes desse último envolvimento, chegou a estar em um relação amorosa aberta com “um cara desconstruído, ator, vegetariano, não-monogâmico”. O final da história? “Consegui ser traída. Enquanto eu estava com a mãe dele para que ele conseguisse ‘trabalhar’, ele estava com outra”, relembra.
Novas fontes de prazer e alegria
Aos 42 anos, Daniela* não se relaciona com ninguém há 6 meses, desde setembro de 2023. Esta decisão, segundo ela, veio de um processo de autoconhecimento. "Eu vinha percebendo algumas dúvidas em relação à minha autoestima e comecei a pensar: como vou desejar que alguém me ame e me aceite exatamente como eu sou (e estou) se nem eu mesma estou sendo capaz de fazê-lo? Este tempo de sobriedade é para que eu possa criar uma relação comigo, com meu corpo, com meus desejos", pontua.
Vejo este momento como amadurecimento. Uma percepção de que pra ter qualquer relação, ou estar com uma pessoa que não nos faz bem, ou só faz bem às vezes, é melhor estar sozinha e cuidar de mim. É entender que nós mulheres somos inteiras.
Daniela (nome fictício), 42 anos
Na opinião de Daniela, este desejo de investir no autoconhecimento e na independência amorosa e emocional é algo que tem sido mais recorrente entre as mulheres da sua idade.
"Já passamos por muitas histórias, crescemos pensando que casar e ter filhos eram fatores necessários para sermos felizes e bem sucedidas. Hoje, graças à independência financeira e à autoconfiança, percebemos que é possível viver muito bem sem um homem e acaba por ser uma fase que traz muita coisa boa."
Detox do amor
Para Lígia Baruch, doutora em Psicologia pela PUC-SP e pesquisadora de amor, gênero e feminismos, que chama o "boy sober" pelo nome de "desintoxicação amorosa", este sentimento é reflexo de diversas mudanças culturais e estruturais, entre elas o questionamento das relações românticas e como os papéis de gênero estão dispostos dentro delas.
"Estamos passando por um momento de reformulação dos modelos tradicionais de relacionamentos; hoje em dia já não faz mais sentido aquela coisa de 'homem provedor' e 'mulher cuidadora'. Essa transição causa medo. As mulheres hoje em dia tem muito mais consciência dos riscos de um relacionamento abusivo, por isso, às vezes, elas preferem buscar caminhos alternativos para alcançar a felicidade", diz Lígia, que é autora do livro "Tinderellas".
"As mulheres são mais estimuladas, social e culturalmente falando, a procurarem parceiros românticos. Já os homens são educados em uma cultura machista onde eles tendem a se priorizar mais e ter menos habilidades de negociar proximidades e afastamentos, necessidades, então tendem a ser mais esquivos do que as mulheres"
Então… o que esperar de um homem?
Tá, mas nós mulheres devemos desistir de amar? Lígia acredita que não, que o amor é fundamental para a existência humana. Caso esteja de celibato e tenha a intenção de voltar a se relacionar, a especialista afirma que não há listas prontas ou dicas simples de serem executadas. O caminho é mais complexo do que esse, mas há um requisito básico: de que o "cara" seja alguém decente.
É importante lembrar que, mais do que sinais, ao se relacionar com alguém, as pessoas devem reparar se o parceiro é emocionalmente ético e emocionalmente responsável.
Lígia Baruch, doutora em Psicologia pela PUC-SP
E reforça: "Enquanto espécie, a gente não consegue sobreviver sem o amor."