Não se engane com o que vê na TV: contrato de namoro não existe

O código civil só reconhece como entidade familiar a união estável, que vivem juntos de forma pública e duradoura

28 jun 2024 - 06h00
Foto: Freepik

Com a chegada do mês dos namorados, muitos casais planejam sair para jantar e se divertir. No entanto, é preciso cuidado para não misturar amor e vingança se o relacionamento acabar. Algumas pessoas têm se protegido de possíveis processos por união estável, fazendo contratos de namoro, por escritura pública ou particular, para blindar seu patrimônio.

Mas o que é o namoro, afinal? É o relacionamento entre duas pessoas que querem se conhecer melhor, que se sentem atraídas física e emocionalmente, e que compartilham interesses e atividades em comum.

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Quando saem ou viajam, os casais dividem as despesas. Isso seria impensável no século passado, quando o homem era o único responsável pelo sustento. Hoje em dia, também é comum os casais dormirem na casa um do outro, ficando mais próximos durante a semana.

Eles começam a se comportar como um casal. Apesar de todos conhecerem o relacionamento, não há intenção clara de formar uma família, apenas de ter um compromisso e de se conhecerem e explorarem coisas em comum. Fotos, declarações de amor em redes sociais não traduzem a intenção de constituir família, trazem imagens daquele momento que o casal está vivendo e aproveitando a vida, explorando conhecimento entre eles.

Hoje em dia é muito comum os casais conviverem como namorados e serem mais íntimos. No passado isto era inimaginável, o namorado pedia permissão aos pais da namorada para que pudessem namorar abertamente, mas o significado de abertamente era muito diferente do é hoje, ou seja, poderiam se encontrar na casa da namorada, sentarem-se no sofá da casa e assistir TV, porém, na maioria das vezes estavam acompanhados da mãe ou do irmão mais novo, que ali permaneciam vigiando os namorados ou quando podiam sair juntos, também eram acompanhadas por algum “olheiro”. No máximo, era ir ao cinema e, quando mais ousado, a um baile. O objetivo era claro, havia interesse de se conhecerem melhor, noivarem e casarem-se, diferentemente da nossa modernidade.

Vida financeira consolidada

Atualmente, existem vários namoros que acontecem entre pessoas de 30 a 40 anos e que já têm uma vida financeira consolidada. Muitos são profissionais liberais, empresários, entre outras ocupações.

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Namorar, nesse contexto, pode gerar incertezas quando um dos dois acumula patrimônio durante o relacionamento e teme que possa haver uma disputa futura, caso ocorra o fim do namoro e, no momento do fim daquele relacionamento poderá haver uma manifestação daquele que possa se sentir lesado, ou mesmo, com uma rusga pelo término. Começa a acreditar que pode propor uma ação judicial e alegar a união estável como forma de vingança ou mesmo de satisfação material. Imagina que, por ter havido um relacionamento mais íntimo, é uma forma de buscar o fruto da união estável.

Do ponto de vista jurídico, este relacionamento mais íntimo onde um dorme na casa do outro, onde dividem as despesas de viagem e demais, classifica-se como sendo um namoro qualificado, que é aquele que se denomina hoje o namoro propriamente dito, ou seja, há intimidade, frequentam lugares e são vistos juntos demonstrando para a sociedade que têm um relacionamento sério. Porém, isso não define se ambos têm a intenção de formar uma família, que é a diferença subjetiva entre namoro qualificado e união estável.

A união estável depende da vontade de formar família, que deve ser demonstrada claramente pelo casal. Quem namora simplesmente não tem essa intenção. O contrato de namoro é uma forma de evitar confusões, mas não tem aquela validade jurídica que se imagina e, caso o casal mude de intenção, ou seja, pensarem em constituir família, este contrato pode ser ignorado ou mesmo anulado pela mudança de comportamento. Quem namora por muito tempo, anos, mas sem querer constituir família também não pode vir reclamar que possuía uma união estável.

Ainda há casos daqueles que permanecem oficialmente casados, mas com uma separação de corpos e de lar, talvez por comodidade ou mesmo por desleixo, não buscam o divórcio. Quando um deles “entra” em um relacionamento busca um advogado para formalizar um contrato de namoro e assim, estabelecer uma regra do relacionamento. Muitos destes contratos têm a previsão de que, caso o casal (namorados) constituam algum patrimônio durante o relacionamento, pertence a ambos. 

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Porém, se esquecem que um deles oficialmente possui a condição de casado. Tal contrato poderá vir a ser questionado em juízo e ser anulado de forma a reconhecer o estado civil regular de casado, portanto, o outro cônjuge possui sua meia parte deste patrimônio. Não se reconhece união estável quando uma das partes oficialmente seja casada e o contrato de namoro não possui aquela segurança jurídica que se imaginava.

O código civil só reconhece como entidade familiar a união estável de pessoas que vivem juntos de forma pública, contínua e duradoura para formar uma família. Namorar não tem esse objetivo, pode ser só uma forma de se conhecer melhor e se divertir, sem planos de ter filhos. A jurisprudência já passou a reconhecer a união estável entre casais do mesmo sexo, o que não está explícito na lei.

Não se iludam com os filmes americanos que assistem na TV, onde mostram que se pode contratar um relacionamento. A lei brasileira ainda não admite isso. Então, é bom ter uma boa conversa antes de namorar para esclarecer as verdadeiras intenções, sem esperar pela justiça para resolver.

(*) Paulo Akiyama é formado em economia e em direito; é palestrante e sócio do escritório Akiyama Advogados Associados.

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