Barriga de aluguel de 'Amor à Vida' seria ilegal; veja soluções dentro da lei

Conheça alternativas e procedimentos que permitem que casais homossexuais realizem o sonho de ter filhos

19 jun 2013 - 15h28
(atualizado às 17h34)
<p>Fora da telinha, a dona do útero e o doador do espermatozoide precisam ser parentes</p>
Fora da telinha, a dona do útero e o doador do espermatozoide precisam ser parentes
Foto: TV Globo / Divulgação

Tema levantado pela novela Amor à Vida, da TV Globo, o ressarcimento pelo uso temporário do útero para gestação de uma criança, procedimento popularmente conhecido como “barriga de aluguel”, é proibido pelo Conselho Federal de Medicina. Na trama, o casal homoafetivo Niko (Thiago Fragoso) e Eron (Marcello Antony) planeja constituir uma família e os personagens querem realizar o sonho de ter o primeiro filho. Para isso, eles buscam uma mulher que ceda o útero para efetivar a fertilização in vitro (FIV). 

Eron (Marcello Antony) planeja constituir uma família com Nikko (Thiago Fragoso) na novela 'Amor à Vida'
Foto: TV Globo / Divulgação

A escolhida deve ser a personagem Amarilys (Danielle Winits), amiga dos personagens. A história esbarra em dois obstáculos, porém, de acordo com a diretora do Centro de Fertilidade da Rede D’Or, Maria Cecília Erthal. O primeiro é a falta de parentesco entre a dona do útero e o doador do espermatozoide. Além disso, o óvulo para o procedimento precisa ser de doadora anônima.

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“Com casais homossexuais masculinos, não temos nem o óvulo, nem o útero. É feito um acordo entre os dois sobre quem doará o sêmen, buscamos uma doadora de óvulos anônima, e o útero precisa ser de familiar até o quarto grau de parentesco, segundo a CFM”, detalhou a ginecologista. 

A nova diretriz da CFM, publicada no início de 2013, afrouxou as regras em relação à reprodução humana. Antes da fertilização in vitro, para atender a demanda de “casais masculinos”, só era permitido até o segundo grau de parentesco. Entretanto, o envolvimento de terceiros no processo ainda não foi liberado.

“Teríamos que encaminhar o caso ao CFM, explicando a falta de parentes para realizar a fertilização e pedindo autorização para uma amiga participar”, explicou Maria Cecília, mostrando uma possibilidade de como resolver. O pedido costuma ter resposta positiva, mas estende o tempo total do procedimento de dois para seis meses, segundo ela.  

É possível usar o óvulo de uma das parceiras, com o espermatozoide de um doador anônimo e introduzir no útero da outra mulher
Foto: Getty Images

Para as mulheres com intenção de ter filhos juntas, as complicações são menores, e é possível que as duas desfrutem a gestação. A diretriz da CFM permitiu uma espécie de "gravidez compartilhada": “usamos o óvulo de uma das parceiras, com o espermatozoide de um doador anônimo, e introduzimos no útero da outra mulher”, explicou Maria Cecília. A grávida não consegue transmitir códigos genéticos ao bebê, mas vive toda a experiência de ser mãe. “Aumenta o envolvimento das duas”, considerou a médica. 

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Fertilização in vitro x inseminação artificial

A opção para gerar um filho oferecida pela medicina a casais do sexo masculino é a fertilização in vitro (conhecida como FIV), disse a especialista em reprodução humana. É colhido o sêmen de um dos homens para fertilizar, em laboratório, o óvulo de uma doadora desconhecida. O embrião é, então, introduzido no útero de uma parenta de até quarto grau. A FIV também é opção para “casais femininos” que tenham problemas para engravidar. “O procedimento tem 60% de chances de dar certo, custa entre R$ 15 mil e R$ 18 mil, leva cerca de 60 dias para homens e 20 dias para mulheres”, afirmou Maria Cecília. 

A inseminação artificial intrauterina é um tratamento menos complicado do que a FIV que atende apenas os casais homoafetivos do sexo feminino. “Pegamos o sêmen de um doador anônimo, separamos os bons espermatozoides e introduzimos no útero da futura mãe no período correto”, explicou a ginecologista. O custo é menor, segundo ela, gira em torno de R$ 5 mil e em poucos dias pode-se fazer a intervenção. Porém, a estimativa de sucesso cai para 20%, aproximadamente. 

Adoção sem preconceitos

Os homossexuais conseguiram legalizar a relação homoafetiva, atraem milhões de pessoas todos os anos à avenida Paulista pelo movimento em prol à causa LGBT e podem adotar crianças sem qualquer discriminação, segundo o desembargador coordenador da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça de São Paulo, Antônio Carlos Malheiros. “Eu já apoiava a causa, mas depois do julgamento equiparando as uniões homossexuais com as heterossexuais não há razões para haver recusa”, disse.

Eles conseguiram legalizar a relação homoafetiva e podem adotar crianças sem qualquer discriminação
Foto: Getty Images

No passado, juízes se apoiavam na determinação da Constituição de que um casal é formado por homem e mulher ao negar um pedido de adoção feito por homossexuais. Para driblar o julgamento baseado na opção sexual, pessoas costumavam entrar com o pedido de adoção declarando-se solteiras. “Apenas um dos parceiros passava pelo exame psicossocial, o que deixava a criança exposta a uma pessoa que não foi estudada. Não era correto”, comentou o presidente da Comissão de Direito da Criança e do Adolescente da OAB de Niterói, Felipe Fernandes. 

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A primeira etapa para adoção é participar de um grupo preparatório. Em seguida, o casal vai até a Vara da Infância, passa pelo processo de habilitação, faz inscrição no cadastro nacional de adoção, é entrevistado por psicólogo e assistente social, recebe visita domiciliar, apresenta documentações de renda e estado de saúde, aguarda a localização de uma criança no perfil requerido e o caso é levado ao juiz, que aprova ou não, explicou Fernandes. “Por falta de estrutura do Poder Judiciário e das inúmeras exigências dos casais, o processo leva cerca de dois anos”, informou Malheiros.

Houve aumento nos pedidos de adoção por casais homoafetivos, afirmou o Malheiros. Fernandes, há mais de 10 anos trabalhando com grupos preparatórios para o processo, estimou que em cada 15 casais participantes, cerca de 3 são formados por pessoas do mesmo sexo. “Pude avaliar que são excelentes pais e mães, raramente vemos esse tipo de adoção causar confusões posteriores, como abuso sexual ou situações de agressividade”, elogiou o desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Para adotar uma criança, é preciso ser maior de 18 anos e ter 16 anos a mais do que o adotado. 

É importante que a criança entenda a família como um conceito baseado na afetividade, no amor e no cuidado
Foto: Getty Images
Como a criança encara?

Dois pais ou duas mães: não é desta forma que os livros de biologia ou os próprios professores das escolas costumam ensinar a composição familiar. “É importante que a criança entenda a família como um conceito baseado na afetividade, no amor e no cuidado. Caso contrário, ela pode achar que o que tem não é uma família”, explicou a psicóloga Daniela Faertes. Ela ressaltou a importância de os pais ensinarem o respeito às diferenças ao filho e falarem do preconceito de forma ampla, não concentrada na homossexualidade.

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“O preconceito vem de fora, não está na criança”, afirmou a psicóloga e terapeuta de família da associação Quintal de Ana, Edna Orlando. Ela atendeu uma menina que pediu dois presentes pelo Dia das Mães na escola e ouviu da professora que “não existia família com duas mães”. Por isso, é essencial a escolha de uma instituição preparada para lidar com as diversidades. O bullying e a discriminação podem causar falta de confiança e autoestima, portanto, o contato direto com a escola é essencial. 

A referência à figura feminina ou masculina não é uma preocupação das psicólogas. Daniela explicou que, de acordo com o temperamento de cada parceiro, é assumida uma postura mais afetiva ou autoritária. “O casal homossexual consegue cumprir os papéis”, disse. Edna acrescentou que tio, avô, avó ou tia também podem servir como figuras representativas à criança. 

O bullying e a discriminação podem causar falta de confiança e autoestima, portanto, o contato direto com a escola é essencial
Foto: Getty Images
Quando o “hetero” se descobre “homo”

Em entrevista ao Terra, Edna se lembrou de pelo menos dois casos em que um dos membros de casal heterossexual se apaixonou por pessoa do mesmo sexo e iniciou novo relacionamento. A reação dos filhos anteriores ao relacionamento homossexual é variável de acordo com a criação e idade. No entanto,a situação pode provocar um conflito de identidade, seguno Daniela. “O novo modelo da família não pode ser imposto de uma hora para outra”, aconselhou. 

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A abordagem deve ser fundamentada em realidade, mas “com calma”. “Tudo o que a criança achava, de repente não é mais nada daquilo”, comentou Daniela. Para a compreensão, não pode faltar o apoio do ex-cônjuge abandonado, tanto em relação à separação, como à diversidade. 

Fonte: Terra
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