"Quanto se desmatou para cultivar vegetais?", diz Alex Atala

O chef comenta polêmica por ter matado uma galinha em público, provoca vegetarianos e outras reflexões em entrevista exclusiva a AFP

19 nov 2013 - 18h20
(atualizado em 20/11/2013 às 11h56)
<p>Atala matou uma galinha durante a palestra intitulada Death Happens (a morte acontece, em português), em agosto deste ano</p>
Atala matou uma galinha durante a palestra intitulada Death Happens (a morte acontece, em português), em agosto deste ano
Foto: Instagram / Reprodução

O chef brasileiro Alex Atala, famoso em todo o mundo por levar o sabor da misteriosa Amazônia à alta gastronomia, comenta a missão que lhe proporcionou renome internacional, em uma entrevista exclusiva à AFP em seu premiado restaurante D.O.M. em São Paulo.

O chef mantém, aos 45 anos, um ar rebelde: as duas dezenas de tatuagens, a barba vermelha, a paixão pela caça e a defesa da terra e da sustentabilidade compõem uma das maiores estrelas da gastronomia contemporânea.

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Atala acumula prêmios e registros na mídia mundial, como o jornal The New York Times - que dedicou comentários a seu trabalho -, roda o mundo participando de conferências, cozinha no Chile e em Cingapura, e se desconecta de vez em quando para mergulhar na selva amazônica, de onde deseja extrair novos sabores ou recuperar alguns esquecidos.

O adolescente punk, que cresceu na periferia de São Paulo, experimentou drogas e começou a colecionar desenhos na pele. Agora, em seu uniforme branco, Atala revela que nunca esperava conquistar tamanho sucesso, mas que nunca rejeitou as chances que a vida lhe deu.

"O que resta em mim do adolescente punk e rebelde? Tudo", responde, antes de uma gargalhada, no D.O.M., o sexto melhor restaurante do mundo em 2013, de acordo com o prestigiado ranking anual da revista britânica Restaurant, que escolhe os 50 melhores estabelecimentos gastronômicos.

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"Mas a vida me obrigou a amadurecer. A cozinha tem me dado método e disciplina", garante.

Com seus 20 e poucos anos, Atala partiu para um mochilão na Europa. Na Bélgica, pintou casas por dinheiro e, quando seu visto estava prestes a expirar, um curso de gastronomia apareceu como a oportunidade de prolongar sua estada.

O jovem ficou mais tempo na Bélgica e aprofundou sua técnica na França e na Itália até 1994, quando decidiu voltar ao Brasil com uma ideia em mente: Atala sabia que nunca conseguiria fazer comida italiana como um chef italiano, mas poderia ganhar destaque com receitas brasileiras e ingredientes do seu país.

"A cozinha é uma mistura de magia, alquimia e ciência", comenta Atala, que assegura que o Brasil ainda tem muito para mostrar se decidir seguir o exemplo de outros países, como o Peru, que aprendeu a promover sua culinária.

Para ele, "a melhor conexão entre a natureza e a cultura é a comida, mas o chef da cidade e muitos de nós nos desconectamos dos ingredientes em seu estado original".

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Recentemente, em uma conferência na Dinamarca, Atala matou uma galinha em público. Choveram críticas à sua atitude.

"Hoje, se um chef de cozinha mata uma galinha, isso causa impacto, mas nossos avós faziam isso, usavam as penas para fazer travesseiros e as patas para outras coisas. Tudo era aproveitado. Por outro lado, no mercado atual de alimentação, há muito desperdício. É preciso mudar essa história e dar valor à vida, seja animal ou vegetal", se argumenta.

"Algumas pessoas são vegetarianas. Perfeito, mas quanto se desmatou para cultivar vegetais ou grãos?", questiona o chef que, como se vê, gosta de "provocar reflexões".

A revista Time incluiu Atala na sua lista das 100 pessoas mais influentes de 2013 devido ao seu trabalho de inclusão da "comida brasileira no mapa da culinária".

Mandioca fresca, como farinha ou fermentada, peixes, insetos, ervas - como a 'priprioca' -, frutas desconhecidas e selvagens: estes são alguns elementos que fazem parte do trabalho de Atala. "A Amazônia é uma fronteira do sabor. Sua riquezas e possibilidades são infinitas. Todo mundo conhece a palavra Amazônia, mas ninguém tem um sabor associado a ela", diz.

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Na selva, o chef descobriu uma espécie de formiga, provou bebidas à base de mandioca e conheceu a "priprioca", que anteriormente era usada apenas em cosméticos. Tudo isso agora faz parte do menu do D.O.M., onde um jantar de degustação com oito pratos custa cerca de R$ 560.

Além do D.O.M., Atala tem o restaurante Dalva e Dito, também de comida brasileira, já trabalhou com publicidade e dirige uma fundação - a ATA - com a qual promove o trabalho de pequenos produtores.

Apesar de estar inserido no mundo da alta culinária, o chef, que tenta parar de fumar, também gosta de comer na rua, especialmente os pastéis tipicamente brasileiros.

Desde menino, Atala ia pescar e caçar com seu pai e avô. Essas viagens e a vida cotidiana com sua família constituem a memória que ele diz desejar resgatar com sua aposta em uma "culinária afetiva", que liga sabores e memórias.

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Ainda bem cedo, o astro da cozinha, que tem três filhos de dois casamentos, se levanta para praticar esportes. A rotina é puxada e o dia só termina depois da meia-noite. Se não fosse chef, é possível que Atala tivesse se tornado veterinário ou biólogo.

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