Comidas afrodisíacas realmente melhoram a vida sexual?

Chocolate, morangos, ostras... será verdade que certos alimentos despertam o nosso desejo e até melhoram o nosso desempenho sexual?

3 mar 2024 - 13h50
(atualizado às 23h02)
Ostras
Ostras
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Batizados com o nome de Afrodite, a deusa grega do amor e da paixão, os afrodisíacos são alimentos que muitos acreditam aumentar a libido, a potência e o prazer sexual.

Quem nunca ouviu falar que chocolates, morangos e ostras podem ter esse efeito tão poderoso?

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Historicamente, os afrodisíacos incluíram até mesmo alimentos bem peculiares - incluindo a tóxica cantárida ou mosca-espanhola, chifres de rinoceronte moídos e extratos de plantas raras.

De fato, durante a pesquisa para o seu livro Intercourses, sobre alimentos afrodisíacos, a coautora Martha Hopkins descobriu que quase todos os alimentos foram considerados afrodisíacos em algum momento.

"Historicamente, os alimentos considerados afrodisíacos eram difíceis de encontrar, raros ou caros, como trufas, foie gras e caviar, ou tinham forma de órgão sexual, como aspargos ou alcachofras, e até mesmo testículos de animais", segundo Hopkins.

A própria alcachofra, devido ao seu formato, já foi considerado um alimento afrodisíaco
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Se hoje tendemos a pensar em afrodisíacos em termos de luxúria, romance e libido, no século 17 - quando tudo era considerado afrodisíaco, de pombos até raízes como a pastinaca e amêndoas -, eles estavam associados à reprodução e à fertilidade e eram dados aos casais como substâncias medicinais, diz Jennifer Evans, palestrante sênior de história da Universidade de Hertfordshire, na Inglaterra, e pesquisadora sobre comida e fertilidade.

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Mas um alimento pode realmente afetar o desejo e o desempenho sexual? E por que essa ideia é tão persistente?

O que é um afrodisíaco?

Os afrodisíacos são substâncias - alimentos ou medicações - que aumentam os níveis de estímulo, desejo sexual, comportamento e prazer após o seu consumo.

Diversas culturas ao longo da história buscaram alimentos que pudessem seduzir os amantes ou melhorar seu desempenho sexual.

Muitos deles são iguarias raras ou de luxo. E alguns têm notável semelhança com órgãos sexuais ou odores que despertam os sentidos.

Na Roma Antiga, por exemplo, uma erva compacta chamada sílfio era valorizada pela sua seiva odorífera e seu suco era usado como afrodisíaco - embora também possa ter sido empregado como forma de controle de natalidade.

Atualmente, o chocolate, os figos e as ostras fazem parte de uma longa lista de alimentos conhecidos por suas supostas propriedades afrodisíacas. Mas existem outros que são bizarros e muito caros, como um molusco com formato fálico conhecido como amêijoa-gigante ou pelo seu nome em inglês, "geoduck".

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Fato ou ficção?

Para aqueles que têm problemas de circulação sanguínea, é verdade que certos alimentos podem ajudar de maneira semelhante ao medicamento Viagra - relaxando os vasos e melhorando o fluxo do sangue para os genitais.

O aminoácido L-arginina, encontrado em alimentos como abóboras, nozes e carne bovina, é transformado em óxido nítrico no organismo, o que aumenta o fluxo sanguíneo. Alimentos ricos em ácidos graxos ômega-3, incluindo salmão e abacate, fazem o mesmo.

Outra substância que ajuda é a quercetina. Encontrada em maçãs, frutas vermelhas, uvas, vinho tinto, alho e chocolate amargo, possui propriedades anti-inflamatórias que podem melhorar o fluxo do sangue.

No entanto, apenas pessoas com o fluxo sanguíneo comprometido perceberão qualquer melhora na função sexual ao ingerir esses alimentos, segundo Lauri Wright, porta-voz da Academia Americana de Nutrição e Dietética. Alguém com boa circulação provavelmente não verá nenhuma alteração.

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Mas, quando a maioria de nós pensa em afrodisíacos, não pensa em desempenho sexual. Pensa em desejo.

Uma comida que há muito tempo se acredita que aumenta o desejo sexual é o chocolate. Estudos mostraram que o cacau pode aumentar o fluxo sanguíneo em partes do nosso corpo.

Mas quando sua relação direta com o desejo sexual foi estudada, não surgiram evidências que sustentassem seu uso como afrodisíaco. Na verdade, um estudo de observação em 2021 concluiu o contrário.

Pesquisadores perguntaram a 700 pessoas sobre seu interesse em sexo e o consumo de chocolate. E concluíram que as mulheres que comiam chocolate com mais frequência também relatavam ter menos interesse pelo sexo.

Os pesquisadores estudaram outras possíveis razões para o baixo desejo sexual ou alto consumo de chocolate, incluindo falta de disposição, pressão sanguínea e ingestão de calorias.

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Os resultados indicam que comer chocolate pode servir de substituto para o sexo. Ele estimula a produção dos neurotransmissores serotonina e dopamina, que também influenciam nossa reação sexual.

Na verdade, nenhum indício foi encontrado para provar que qualquer alimento aumente a excitação ou o desejo. Mas há uma exceção: o álcool.

Vários estudos mostraram que o consumo de álcool está ligado à maior excitação, mas também pode prejudicar o desempenho sexual.

O vinho tinto, em especial, pode estar indiretamente ligado à função sexual devido aos seus possíveis benefícios à saúde do coração, diz Michael Krychman, obstetra, ginecologista e conselheiro sexual clínico do Centro de Saúde Sexual e Medicina de Sobrevivência do Sul da Califórnia, nos Estados Unidos.

O cacau aumenta o fluxo sanguíneo periférico, mas não o desejo sexual
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Em 2022, uma análise de mais de 50 estudos populacionais concluiu que até quatro porções de vinho tinto por semana foram associadas à redução do risco de morte cardiovascular, em comparação com cerveja e destilados.

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Mas os pesquisadores explicaram que existem muitos outros fatores intervenientes que podem explicar esta relação. Por isso, a relação entre o vinho tinto e a saúde cardiovascular permanece inconclusiva.

Estilo de vida e alimentação

A reputação do vinho como afrodisíaco também pode vir do fato de fazer parte da dieta mediterrânea, composta principalmente por alimentos de origem vegetal, como frutas, verduras, cereais integrais, legumes e nozes, além de peixes e azeite de oliva. Ela é relativamente pobre em açúcar, queijos e carnes.

Mais um estilo de vida do que simples alimentos, a dieta mediterrânea pode ter qualidades afrodisíacas.

"As pesquisas descobriram que o vinho tinto afeta a função sexual, mas não sabemos se é a dieta ou uma combinação de dieta, estilo de vida e genética", explica Krychman. "O que sabemos é que, para as pessoas que se exercitam, têm uma alimentação saudável e menos estresse, todos esses elementos trabalham juntos para uma vida sexual melhor."

Nossa alimentação como um todo pode funcionar como afrodisíaco por meio de benefícios como melhor fluxo sanguíneo, aumento de hormônios ou maior disposição, segundo Wright.

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Um estudo envolvendo 600 mulheres com diabetes tipo 2 identificou que a dieta mediterrânea estava ligada a níveis mais baixos de disfunção sexual, enquanto outro estudo concluiu que a dieta também pode estar associada a uma melhora da disfunção erétil.

"A conclusão é que uma dieta saudável com frutos do mar, carnes magras, nozes, frutas, legumes e cereais integrais, o que é basicamente a dieta mediterrânea, ajuda na função nervosa, no fluxo sanguíneo e na produção de hormônios", diz Wright.

Descobriu-se que o vinho tinto influencia as funções sexuais, mas com ressalvas
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Há uma boa razão pela qual não há evidências de que qualquer alimento específico seja afrodisíaco: uma comida que tenha um efeito tão potente seria perigosa, segundo Jessica Abbott, palestrante sênior de ecologia evolutiva da Universidade de Lund, na Suécia.

"A maioria dos alimentos que ingerimos não tem efeitos colaterais, o que é reconfortante", explica ela. "Se tivessem, não seria seguro comê-los regularmente."

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"Qualquer erva que tenha sido considerada afrodisíaca é do tipo de alimento que normalmente não comeríamos muito, como extratos de raízes e plantas que têm compostos ativos usados na defesa contra herbívoros."

O poder da mente sobre a matéria

Então, por que algumas pessoas juram que certos alimentos têm qualidades afrodisíacas? Pode ser simplesmente porque eles acreditam, segundo Krychman.

"Há evidências limitadas dos efeitos das ostras sobre o desejo sexual, mas falta uma avaliação rigorosa [que comprove essa relação] - em parte, porque o efeito placebo é muito grande", diz ele.

O fato de que o desejo sexual é tão individual e multifacetado pode funcionar a favor dos afrodisíacos, segundo Nan Wise, psicoterapeuta e terapeuta sexual da Universidade Rutgers, nos Estados Unidos.

Se você acreditar que um certo alimento aumenta o seu desejo, provavelmente será verdade
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

"O desejo é físico, psicossocial e relacional e envolve muitas variáveis", explica Wise. "Se você acredita que um alimento aumenta o desejo, a psicologia do efeito placebo afeta nossa capacidade de ficar excitado ou não."

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Tudo depende do contexto, acrescenta Evans, da Universidade de Hertfordshire. "Você não pensa em chocolate como afrodisíaco toda vez que come algum. Você precisa do contexto certo", diz ela.

Nossas experiências individuais também podem determinar quais alimentos aumentam o desejo sexual em cada um de nós, segundo Jean-Christophe Billeter, professor de comportamento social e sexual da Universidade de Groningen, na Holanda.

"Os humanos são muito influenciáveis e o cérebro mantém memórias fortes de quando temos um sucesso sexual", explica o professor. "Dependendo da situação, se algo aconteceu no ambiente onde uma pessoa fez sexo, isso irá desencadear o desejo de ter sexo no futuro."

Outra possível explicação relacionada à mente para o efeito afrodisíaco é a nossa disposição.

Pesquisas indicam que a disposição positiva é associada à maior estimulação sexual e que dietas ricas em alimentos à base de vegetais foram relacionadas ao menor risco de ansiedade e depressão.

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Como a evolução pode explicar os afrodisíacos

De fato, talvez qualquer alimento possa ter qualidades afrodisíacas. No mínimo, se uma pessoa está morrendo de fome e não há comida por perto, faz sentido que seu desejo sexual diminua.

"Evolutivamente falando, os seres humanos têm o desejo de ter relações sexuais para se reproduzir e precisamos ter um peso saudável e uma dieta que forneça os nutrientes certos para isso", diz Billeter.

Há evidências de que a comida aparece regularmente na pornografia do século 17 pela mesma razão, segundo Evans: ela estava ali para ajudar a alimentar o casal para a próxima rodada.

Em seus experimentos com moscas-das-frutas, Billeter descobriu que os padrões de acasalamento mudam significativamente quando a comida não está próxima.

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Se as moscas estiverem em um ambiente onde há comida, elas acasalam com o primeiro macho que encontrarem até sete vezes ao dia. Se não houver comida, elas só acasalam uma vez.

Há também evidências na natureza de que comemos certos alimentos para ficar mais atraentes para o sexo oposto.

Considere certas aves em que os machos são mais coloridos porque as fêmeas acham atraente. Eles conseguem essa cor comendo alimentos com carotenoides. Isso se aplica também aos humanos.

"No passado, as mulheres consideradas mais atraentes tendiam a ser mais gordas, já que ser gorda, quando não havia muita comida por perto, poderia indicar que a mulher seria uma boa reprodutora", explica Billeter.

Também pode haver uma qualidade afrodisíaca inerente à prática de dar comida a um parceiro sexual - o que talvez explique a verdadeira razão pela qual uma caixa de chocolates ou uma refeição caseira podem induzir ao desejo.

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Uma refeição caseira, na ocasião correta, pode ser afrodisíaca.

"As aranhas capturam moscas para apresentar às fêmeas para acasalar, enquanto uma espécie de grilo produz uma estrutura gelatinosa para induzir as fêmeas ao acasalamento", diz Abbott.

A ideia de que os afrodisíacos são bons para nossa vida sexual persiste há tanto tempo porque as pessoas sempre foram atraídas por conceitos que prometem juventude, longevidade e fertilidade, argumenta Evans.

E, por esse motivo, é provável que continuemos a acreditar neles nos próximos séculos.

Esta reportagem foi publicada originalmente em 23 de março de 2019 e atualizada em fevereiro de 2024 para incluir as pesquisas mais recentes.

Leia a versão desta reportagem em inglês no site BBC Future.

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